Duda Beat: "Me afastei de relações tóxicas, mas sempre cantarei sofrência"
"Eu nunca senti desapego por ninguém/Com você experimentei/ Não resisti." Você pode até não conhecer Duda Beat, 33, mas com certeza já ouviu o refrão de "Bixinho" na novela das 21h, no Big Brother Brasil ou nas festas antes da pandemia. A música marcou o estouro da cantora pernambucana em 2018. Há um mês, Duda lançou o segundo álbum, "Te Amo Lá Fora", também recheado de histórias de sofrimento romântico e amor não correspondido — ou "sofrência", como ela prefere chamar.
A Universa, Duda diz que se afastou das relações tóxicas que serviram de inspiração para suas primeiras músicas e que agora canta sobre amor de uma forma mais madura. "Mas vivi muitas coisas e ainda tenho muita história para contar. Por isso, acho que sempre vou cantar sofrência."
Nesta entrevista, ela lembra como saiu "do fundo do poço" das relações afetivas, celebra a relação saudável que vive ao lado do companheiro de banda Tomás Troia e critica a ainda escassa presença de mulheres em lugar de destaque na música brasileira:
Nossa indústria é muito machista, mas estamos conquistando espaço. Ainda bem, porque toda vez que a mulher pega no microfone, a sociedade sai ganhando.
UNIVERSA: Seu novo álbum "Te Amo Lá Fora" virou assunto do dia no Twitter quando foi lançado. O que tem de universal nas suas músicas para que as pessoas se identifiquem?
DUDA BEAT: Eu acho que o fator humano. Todo mundo um dia na vida já amou e não foi correspondido, já teve um rompimento, já se iludiu com alguém. São sentimentos muito humanos e presentes na vida de todo mundo. Muitas vezes recebi feedbacks que diziam: 'Nossa, parece que a Duda entrou na minha vida para escrever essa música'.
Quando eu sofria de amor, achava que aquilo tudo só acontecia comigo, sabe? Sinto que, relatando nas músicas histórias que aconteceram comigo, mostro que as pessoas não estão sofrendo sozinhas.
Seus dois álbuns falam de sofrimento e amor não correspondido. De que forma as histórias se diferem?
Meu primeiro álbum é muito mais iludido, mais romântico. Eu ainda estava fantasiando as minhas relações. Este segundo, "Te Amo Lá Fora", é mais maduro porque eu tive um distanciamento das relações que foram tóxicas, que me fizeram mal e que aparecem nas primeiras músicas. Consegui ver coisas que eu não conseguia quando estavam à flor da pele, quando aquelas relações tinham acabado de acontecer.
No primeiro álbum, só queria desabafar. Então os dois têm essa sofrência, mas o primeiro explora um amor romântico e o segundo, um lado mais sombrio do amor.
Como foi o processo de se afastar das relações tóxicas?
Ter me distanciado dessas histórias mais dolorosas me fez enxergá-las de uma forma mais madura. Consigo olhar para algumas situações e pensar 'Ok, ninguém era obrigado a me amar'. Esse tipo de discernimento não existia em 2018, quando lancei o primeiro disco, porque a ferida estava muito aberta, dolorida. Hoje é mais tranquilo acessar essas memórias, eu consigo olhar para as relações que não foram legais com mais maturidade, entendendo o outro e entendendo que as relações também trazem coisas boas.
O nome do disco, "Te Amo Lá Fora", fala justamente sobre esse amar de longe, porque eu não acredito que o sentimento acabe com o fim de uma relação, ele muda. Você transforma esse sentimento em amizade, raiva, carinho, mas ele continua existindo. No meu caso, eu continuei amando as pessoas que passaram na minha vida, dou valor ao que elas me ensinaram, ao que representaram na minha vida, só que de uma forma distante.
Há dois anos, você disse a Universa que chegar ao fundo do poço é importante. Por quê? E como saiu desse lugar?
Porque é na crise do fundo do poço que a gente evolui, se questiona. Pensa: 'Poxa, eu mereço passar por isso?'. Mas a saída do fundo do poço é maravilhosa, é triunfal. Foi o momento em que eu peguei todas as experiências ruins e transformei em algo que enriquece minha vida: a música.
Eu passei muito tempo colocando o outro como protagonista na minha vida: eu me apaixonava e vivia a vida da pessoa. Apesar de ter saído desse lugar, acho que sempre vou falar de sofrência. Passei por muita coisa e ainda tenho muita história para contar.
Hoje, você mostra estar um relacionamento feliz e saudável. Como é viver isso depois de uma série de relações tóxicas?
É uma sensação de alívio e muito recompensadora, sabe? Descobri que o amor da minha vida estava do meu lado o tempo todo [Tomás é companheiro de banda de Duda]. É uma alegria muito grande tê-lo como meu parceiro de vida. É como se eu tivesse dado a volta completa. Estou bem, feliz, faço o que eu amo e ao lado do homem que eu amo. E isso só aconteceu porque me permiti ser verdadeira e honesta comigo.
Essa experiência mudou a forma como você vê o amor?
Mudou completamente. A experiência de amar e ser amada me mostra um outro lado da moeda que eu ainda não conhecia. É uma nova camada na minha vida. Pela primeira vez, me sinto plena neste lugar do amor. Mas também sou grata por tudo o que aconteceu até aqui porque, de certa forma, todas as minhas experiências em outras relações me trouxeram até onde eu estou. É um castelo que você vai construindo pedra por pedra.
O movimento de mulheres cantando sofrência é recente, estourou há alguns anos no sertanejo e só agora chegou ao pop. Por que demorou tanto para isso acontecer?
Não sei dizer, mas nossa indústria ainda tem muito menos mulheres do que homens cantando, independentemente de ser sofrência ou não. Acho que essa demora [em ver mais mulheres cantando seus sentimentos] tem mais a ver com a quantidade de mulheres que cantam, compõem e produzem do que com o gênero musical. A nossa indústria ainda é muito machista, mas estamos conquistando cada vez mais espaço.
De que forma esse machismo na indústria musical impacta artistas mulheres? E como isso te afetou?
Impacta porque, quanto mais mulheres estão na frente do microfone falando das suas dores, dos seus êxitos, das suas experiências, mais a gente consegue se identificar e mais atrai outras mulheres para a música. Esse movimento do sertanejo, com muitas duplas de mulheres e algumas cantando sozinhas, é muito bonito, gostoso de ver.
Se a gente acha que tem machismo no pop, imagina no sertanejo. A gente sempre ouviu duplas masculinas cantando a visão deles, nunca a visão das mulheres — o impacto está aí. Então, toda vez que a mulher pega no microfone, a sociedade sai ganhando.
Logo no início da carreira, uma pessoa falou que eu só estava dando certo porque meu pai tinha pagado para isso. E meu pai nunca pagou nada. É uma coisa que está enraizada nas conversas: subestimar a mulher, achar que ela não está lá por mérito próprio, mas porque algum homem a empurrou. 'Se conseguiu, foi por conta de tal coisa', nunca porque é talentosa. Eu observo esse tipo de absurdo o tempo todo.
Você e a Juliette, ganhadora do BBB21, são fãs declaradas uma da outra e você chegou a propor um dueto com ela. Vai acontecer?
Eu vejo a Juliette como uma amiga de infância. A gente tem muito em comum, não só o sotaque [Juliette é paraibana]. Logo no início do programa, meus amigos me ligavam e diziam: 'Duda, tem uma menina muito parecida com você'. No jeito de falar, no jeito de dar conselhos, na forma de lidar com os outros. Acho a Juliette extremamente sensível, ela tem uma magnitude impressionante. Fora que é afinada e talentosa. Você percebe que ela nasceu para fazer arte, seja ela qual for. Então claro que eu gostaria de ter uma pessoa tão sensível assim por perto. Admiro muito ela.
Você começou numa cena mais alternativa e sua música foi parar no BBB e na novela "Amor de Mãe". Como vê esse movimento? E onde sonha chegar?
Vejo isso com bons olhos, de forma muito bonita. Ocupar esses espaços e chegar a mais pessoas era meu objetivo desde o início — não só pelos números, mas queria que minha música e minhas histórias alcançassem mais gente. Meu maior desejo, desde o primeiro disco, é tocar na rádio. É um sonho que ainda não realizei. Toca uma música ou outra, algum 'feat' (parceria) que eu fiz, mas é muito raro.
E a rádio tem uma memória afetiva muito grande para mim. Eu sou dos anos 1980, né? Lembro de ouvir rádio no carro com a minha mãe, ou de ficar esperando tocar a música que eu gostava para gravar uma fita. Além disso, a rádio chega a lugares que a TV e a internet não chegam — a algumas cidades do interior, a caminhões que passam o dia na estrada. A rádio é a companhia de quem vive em deslocamento — isso é muito bonito, e é aí que eu quero estar.
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