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"Me tornei policial para bancar sonho de ser atriz e hoje estou na TV"

A policial civil Cris Probba, do Rio, é também atriz e participou da novela "Salve-se Quem Puder" (Globo) - Adriana Lima/Divulgação
A policial civil Cris Probba, do Rio, é também atriz e participou da novela "Salve-se Quem Puder" (Globo) Imagem: Adriana Lima/Divulgação

Cris Probba, em depoimento a Luiza Souto

De Universa

05/06/2021 04h00

"Estou há 19 anos na Polícia Civil, mas carrego o sonho de ser atriz desde a adolescência. E neste ano estreei na novela das 19h, 'Salve-se Quem Puder' (Globo), como elenco de apoio.

Nasci em Minas Gerais, mas fui para o Rio de Janeiro aos quatro anos. Sou carioca de coração. Foi a cidade onde casei, tive filhos, me separei. Cresci numa família de juristas, mas minha mãe foi miss de sua cidade natal, Natividade (RJ), e depois concorreu ao Miss Guanabara, em Niterói (RJ). Ela queria ser modelo, uma diva como Martha Rocha (1ª Miss Brasil). Mas ninguém aceitava que ela fosse artista e teve seu sonho interrompido.

Eu quis seguir por esse caminho das artes, mas ouvia: 'Você vai viver de arte?'. Sentia que era a ovelha negra da família, mas hoje sou a maluca que deu certo. Sinto que de uns anos para cá, quando minhas peças passaram a ser profissionais e participei de longas, começaram a me enxergar diferente.

Houve uma pressão em casa por isso, então decidi estudar direito para bancar meu sonho. Para ser atriz a gente tem quase que ser herdeira, porque é muito investimento em cursos, materiais como videobook.

Me formei, advoguei para um sindicato que representava hotéis, restaurantes, bares e similares e para ter mais estabilidade, aos 22, prestei concurso para a Polícia Civil. Foi impactante ser muito nova e já ter distintivo e arma. E a gente tem a ilusão de que vai mudar o mundo.

Vivo tragédias diárias. Ninguém entra na delegacia para tomar um café. A arte me humaniza nessa profissão. Não tem como não se comover, não levar para casa algumas dores das pessoas. Uma me abastece de história e a outra, me humaniza. Hoje trabalho com inteligência, faço o inquérito policial. Isso me tirou das ruas e me deu uma certa tranquilidade para levar a carreira artística.

"Era a mais velha da turma de teatro e era difícil fazer cena de casal"

A policial Civil Cris Probba está no elenco de apoio da novela "Salve-se quem puder" (TV Globo) - Adriana Lima/Divulgação - Adriana Lima/Divulgação
A policial Civil Cris Probba está no elenco de apoio da novela "Salve-se quem puder" (TV Globo)
Imagem: Adriana Lima/Divulgação

Sei que não sou mais uma garota. Tenho 45 anos e, na minha idade, as pessoas já alçaram seus postos — Poucas mulheres na minha faixa etária estão há anos batalhando por um sonho.

Inclusive senti e sinto preconceito contra minha idade, um etarismo. Há sete anos, quando entrei numa escola de teatro, eu era a mais velha da turma e até para fazer casais em cenas de peças era difícil, porque a maioria estava na faixa dos 20 anos e não queria fazer cena de amor com mulher mais velha, porque a história não abrangia isso.

Algumas vezes isso me frustrava e muitas vezes pensei em desistir, pensava que ser atriz era uma viagem da minha cabeça, mas aí aparecia um trabalho, um teste para uma peça, um comercial de TV, uma participação num filme, e comecei a aceitar que era meu caminho e que não precisava ser famosa ou ganhar o Kikito (prêmio dado a artistas no Festival de Cinema de Gramado).

Até que em 2020 atualizei meu material de trabalho com fotos novas e renovei meu cadastro na TV. Mas fomos surpreendidos com a pandemia de covid. Só que em junho a produtora de elenco da novela me ligou dizendo que eu estava pré-aprovada para o elenco de apoio, e meu nome passou a aparecer nos créditos agora nessa segunda fase.

Também dou aula de TV e cinema e sempre falo para os alunos que mais importante do que chegar la é aproveitar a beleza do caminho. Foi isso que me apoiou, porque não queria só o sucesso, mas fazer algo que amo.

"Me leva algemado"

Nunca fiquei falando no meio artístico que sou policial, porque não queria que me olhassem diferente. Mas já avisei que era policial para vários caras, em encontro, por proteção. Claro que morando numa cidade como o Rio de Janeiro somos orientados a evitar colocar essa informação nas redes sociais, a não nos expor. Mas quando não sei de onde o cara veio, eu falo. E ele sabe que se fizer alguma coisa vai uma instituição inteira em cima. Então assim me sinto mais segura.

Mas quando falo que sou policial, a primeira coisa que o homem fala é: 'me leva algemado'. Tem um fetiche aí.

Você não tem ideia do que são duas mulheres numa viatura parada no sinal, os homens ficam enlouquecidos. Como eles são animais. Falam umas bobeiras. Falam: 'O que eu preciso fazer para ser preso?'. Se não for nada violento, deixo para lá. Sou uma mulher bonita, elegante, que gosta de se apresentar bem e já me olharam como se, por causa disso, fosse menos capaz.

Já passei por umas provas de fogo, por situações como ter que me esconder embaixo de carro no meio de tiroteio, e rirem dizendo que eu estava me escondendo. Mas é importante dizer que isso acontece em todas as profissões, porque enquanto advogada também ouvia piadas. Por ser atriz, me olhavam como se eu estivesse disponível. Mas nunca precisei entrar em confronto verbal. Fui me vendo respeitada aos poucos.

Não sofri assédio no meio artístico, talvez por ter sido muito tempo casada e por algumas pessoas saberem que eu sou policial. Também não era convidada para festas -- acho que também pelo fato de ser policial e de algumas pessoas ficarem com receio de usar entorpecentes na minha frente.

Uma vez falei que era policial civil durante um teste e passei a ser chamada de 'delegata' no curso, sendo que eu era inspetora.

Com certeza o fato de eu ser policial era limitador para assédio. Pessoas falavam: 'Nem vou brincar com você porque você tá armada'. E nem ia para a escola armada.

Essa é a minha primeira experiência em TV. Prometi que não falaria que sou policial, mas já saíram algumas matérias e já sabem, mas não houve discriminação, nem senti olhares diferentes."

* Cris Probba, 45, é policial civil no Rio e atriz