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Carol Gattaz, do vôlei: "Ouvi que atleta de 40 não deve disputar Olimpíada"

Carol Gattaz, central da seleção brasileira de vôlei - Divulgação/FIVB
Carol Gattaz, central da seleção brasileira de vôlei Imagem: Divulgação/FIVB

Alan de Faria

Colaboração para Universa

15/06/2021 04h00

Convocada para a seleção brasileira de vôlei pela primeira vez em 2003, aos 22 anos, a paulista Carol Gattaz não conseguiu até hoje, aos 39, realizar o sonho de participar de uma Olimpíada representando o país.

A jogadora foi cortada de duas Olimpíadas: a de Atenas, em 2004, e a de Pequim, em 2008, quando foi conquistada a medalha de ouro. No pódio, suas companheiras levantaram um cartaz homenageando ela e Joyce, que também havia ficado de fora dos Jogos, dizendo "Carol e Joyce, vocês são ouro". Nos Jogos seguintes, a meio de rede não foi convocada.

Agora, aos 39 anos, a atleta do Minas Tênis Clube aguarda a lista final de convocação para a Olimpíada de Tóquio, em julho. Em abril, o técnico José Roberto Guimarães disse ao jornal O Globo que Gattaz será convocada, porque é umas das "melhores centrais do Brasil".

A jogadora, que atualmente disputa a Liga das Nações na Itália com a seleção brasileira conversou com Universa por telefone antes de embarcar.

UNIVERSA - Como foi voltar à seleção brasileira depois de tanto tempo sem ser convocada?

Carol Gattaz - Uma alegria! Isso é o resultado de um trabalho que venho fazendo com o Minas Tênis Clube há algumas temporadas. Estou muito empolgada, é como se fosse a minha primeira vez na seleção brasileira. Parece tudo novo, e estou muito feliz.

Que filme passa pela sua cabeça quando se lembra de que foi cortada da seleção às vésperas de dois Jogos Olímpicos e vê que são grandes as chances de ir para Tóquio?

A minha trajetória, até aqui, parece mesmo um filme. Tenho dito que ainda falta muito trabalho para eu alcançar o meu objetivo final, que é a Olimpíada de Tóquio, mas, só de estar no grupo, já me sinto muito feliz.

Mas também me lembro de ter chegado tão perto de participar de dois Jogos e ter sido cortada. Foram as duas situações mais traumáticas da minha carreira.

Depois, em 2012 e 2016, não tive nem a chance [de ser convocada] pelo momento em que me encontrava física e tecnicamente. Logo, não estava à altura da seleção. Agora, voltar aos 39 anos mostra que este momento da minha vida é o meu melhor como atleta e também como pessoa. A experiência que tenho hoje em dia tem feito muita diferença a meu favor.

Como tem lidado com a expectativa de ir para Tóquio?

carol gattaz - Divulgação - Divulgação
Carol é meio de rede do Minas Tênis Clube, de Belo Horizonte; ela diz que está em sua melhor fase
Imagem: Divulgação

Não vou negar que existe muita ansiedade, sim, porque, ao longo de todos os anos da minha carreira e, principalmente, por conta do meu desempenho nas últimas temporadas, as Olimpíadas foram um sonho que foi se tornando mais real para mim. Há também muita expectativa não só dos fãs como também de amigos e familiares, além da minha, é claro.

Por essa razão, tenho me preparado tanto física quanto mentalmente. Faço terapia há bastante tempo e tenho um coach, que tem me ajudado também na parte de quadra. Somado a isso, tenho me dedicado aos treinos, claro, focada no que preciso fazer para me desenvolver como atleta dentro de quadra.

Você vai completar 40 anos em julho, durante a Olimpíada. Como vê a chegada dessa idade?

Chegar aos 40 anos, para mim, na verdade, é um misto de sensações e sentimentos. Ao mesmo tempo que chego aos 40 em número, não me sinto com esta idade. Costumo dizer que tenho uma vitalidade muito grande. Quando falo que tenho quase 40 anos, a maioria não acredita, porque realmente o meu espírito é muito jovem. Tenho muita energia, vontade de viver e de fazer as coisas. Sou extremamente ativa.

Se eu puder celebrar os meus 40 anos durante as Olimpíadas, adianto que, sem dúvida alguma, será o meu melhor presente de todos os tempos, ainda mais se considerarmos que, na maior parte da minha vida, eu vivi para o vôlei.

As mulheres são muito julgadas pela idade e têm sua capacidade profissional questionada. Você ouve esse tipo de comentário?

Ouço, claro, comentários dizendo que atletas de 40 anos não têm capacidade para jogar uma Olimpíada, mas o erro está justamente em generalizar, afinal de contas há muitos atletas que chegam ao altíssimo nível em uma idade considerada avançada. Fala-se muito do Tom Brady [jogador de futebol americano de 43 anos], que é um cara em quem me inspiro muito, que tem não só uma saúde como também um equilíbrio mental e uma vida muito regrados. Há ainda o Zé Roberto, ex-jogador de futebol que jogou com até mais de 40 anos [ele se aposentou aos 43]. O que eu percebo é que tem muito atleta se cuidando cada vez mais e utilizando a medicina a seu favor.

Eu, por exemplo, tenho um acompanhamento médico da minha equipe em Belo Horizonte. Com isso, todos esses benefícios me ajudam a ter 40 anos e jogar na mesma capacidade ou até melhor que atletas mais jovens ou até mesmo melhor do que a versão da Carol Gattaz mais jovem.

Costumo afirmar que, quando era mais jovem, eu não sabia a metade do que sei hoje. Atualmente, por exemplo, sei cortar caminhos, tenho consciência de que é possível executar melhor qualquer ação utilizando, inclusive, até menos força.

Você pratica ioga e meditação. Teve algum momento específico da sua carreira que você viu que era preciso mudar algumas atitudes?

Eu adoro terapias alternativas, como o pilates, a meditação e a ioga. O pilates começou na minha vida há muito tempo, com o Zé Elias, preparador físico da seleção brasileira de vôlei, que introduziu esse método de exercícios quando poucos o conheciam. Ele aplicou isso no grupo e modernizou os treinamentos. Depois, só continuei com essa e outras terapias, pois sabia que elas seriam importantes para o meu corpo, principalmente após completar 30 anos. A partir desta idade, fiz da prática dessas terapias algo mais frequente na minha rotina. Ah, se soubesse o que sei hoje quando eu tinha 20 anos...

gattaz - Instagram - Instagram
A jogadora gosta de cantar e já fez lives beneficentes
Imagem: Instagram

Muitas outras atletas e amigas têm curiosidade em saber como funcionam essas terapias, mas, adianto, não é tão fácil assim. Elas são cansativas, pois você tem de, realmente, se dedicar a elas. Vai ter de abdicar de festa, acordar cedo, dormir cedo, não poderá beber. Claro, não vai parar de aproveitar a vida, algumas festas, por exemplo. Por outro lado, terá de entender que, em alguns momentos, vai de ter deixar de lado uma série de atividades. Se uma atleta quiser prolongar a carreira, com certeza precisará alterar algumas atitudes, e, quanto antes, melhor. Nunca é tarde, sobretudo se houver tempo hábil para retomar uma carreira.

Sua primeira convocação para a seleção foi em 2003. O que a Carol que está jogando pela seleção agora, aos 39, diria para de 22 anos?

Quando fui convocada pela primeira vez para a seleção, confesso que não era apenas jovem de idade. Tinha também uma cabeça diferente, era uma menina insegura e ansiosa. Era uma atleta que queria, a todo custo, mostrar o meu trabalho, provar que podia e conseguia. Por isso, era bastante ansiosa e, de fato, não conseguia mostrar tudo o que eu era capaz de realizar dentro de quadra. Então, a Carol Gattaz de 39 anos diria para aquela de 22 anos:

'Calma, paciência. Não queira pular um dia após o outro. Vá com calma e faça o seu melhor. Não dê ouvidos a tantos comentários externos'.

Eu tinha muito esta preocupação a respeito do que falavam sobre mim. Prestava atenção nos comentários negativos, e isso me afetava muito, algo que não acontece hoje em dia. Para as meninas mais novas, se eu puder dar um conselho, diria: cuidem do corpo, procurem descansar, prestem atenção na sua alimentação, pois isso vai fazer muita diferença quando envelhecerem. Mas, infelizmente, vejo poucas atletas com 20 e poucos anos se cuidando como as atletas mais velhas, que já têm essa consciência com o corpo. Vejo poucas se cuidando do jeito que deveriam se cuidar para se tornarem uma atleta de ponta mesmo.

E o que você aprendeu com aquela atleta de 22 anos?

O amor pelo vôlei. Aprendi com aquela garota a me superar. Confesso que, muitas vezes, eu me questionei se deveria continuar jogando e aquela menina de 22 anos nunca desistiu. Então, de alguma forma, eu tenho de agradecer àquela menina por ter lutado por seus objetivos e sonhos. Se aquela menina não tivesse lutado tanto, a Carol de 39 anos não estaria aqui hoje.

Algumas atletas da sua geração deram uma pausa na carreira para ter filhos. Você pensa em ter filhos? E como lida com a pressão que parte da sociedade impõe às mulheres dizendo que vocês só sentirão completas se forem mães?

Nunca sonhei ficar grávida, mas já pensei em ter filhos, sim. Não sei, porém, se os terei. Depende muito dos meus relacionamentos futuros. Bom, pensando bem, independentemente dos meus relacionamentos futuros, posso ter filhos ou não. Coloco nas mãos de Deus, caso Ele coloque uma criança na minha vida, de alguma maneira.

Em todo caso, não acredito nessa ideia de que uma mulher só se sentirá completa se for mãe. Há muitos casais que optaram por não ter filhos e se sentem bem. Isso vai de cada pessoa. O que pensa parte da sociedade não interfere na minha cabeça.

Um de seus hobbies é cantar, você já fez até lives com cantoras. Pensa em uma carreira musical pós-vôlei?

Adoro soltar a voz e brinco que, se não fosse jogadora de vôlei, gostaria de ser cantora. Mas, obviamente, não tenho voz e nem habilidade para ser cantora profissional. Canto para brincar mesmo. Essas lives que realizei na pandemia foram para ajudar as pessoas, o objetivo principal foi justamente este [em uma das edições, foram arrecadados mais de R$ 10 mil, destinados a algumas organizações sociais]. Eu me diverti bastante, gostei de estar no palco e depois de me ver na TV. Claro que, como leonina, me critico um pouco, mas adorei participar. Vou continuar cantando como hobby e quero aprender a tocar violão.