Luciano Huck confundiu: o que é identidade de gênero e orientação sexual
Enquanto recebia em seu programa o professor de inglês Thomaz Hackman, um homem trans, na tarde deste sábado (17), o apresentador Luciano Huck equivocadamente usou o termo "orientação trans", quando o correto é identidade de gênero, e disse ainda que seu irmão, Fernando Grostein, "também é gay", sendo que nem toda pessoa trans é homossexual. Thomaz, inclusive, estava acompanhado da namorada.
Há ainda muita confusão e desinformação mesmo sobre esse universo, mas nunca é tarde para aprender. Por isso, Universa explica aqui a diferença entre identidade de gênero e orientação sexual, os diferentes gêneros, e destaca ainda o significado de cada letra da sigla LGBTQIA+.
Identidade de gênero
É o modo como cada indivíduo se identifica, e que pode ou não corresponder ao sexo atribuído no nascimento. Roupas, linguajar, voz, estilo, comportamento — características socialmente associadas ao universo feminino ou masculino. O debate é tanto que algumas pessoas já estão criando seus filhos com neutralidade de gênero, isto é, sem atribuir às crianças um gênero ou outro a priori, antes que possam ter consciência de identidade.
Orientação sexual
É como se caracteriza o desejo sexual predominante de uma pessoa — se é por pessoa de gênero diferente, igual ou de mais de um gênero. Importante: Não confunda a orientação sexual (hétero, homo, bi, etc.) com a identidade de gênero. Em linhas gerais, os heterossexuais sentem desejo por pessoas de sexo diferente, enquanto homossexuais por pessoas do mesmo sexo. Ou seja, um homem trans como Thammy Miranda, filho de Gretchen, pode, sim, ser heterossexual. Afinal, ele expressa desejo por mulheres.
Agênero
É aquele que tem identidade de gênero neutra, ou seja, não tem um gênero.
Cisgênero
É o indivíduo que se apresenta ao mundo e se identifica com o seu gênero biológico. Por exemplo, se foi considerada do sexo feminino ao nascer, usa nome feminino e se identifica como uma pessoa deste gênero, esta é uma mulher "cis".
Gênero fluido
Há pessoas que se identificam com aspectos sociais de mais de um gênero em momentos diversos de suas vidas. Ou seja, na prática, o indivíduo pode se sentir mulher em algum momento, homem em outro ou até "flutuar" por outras identidades de gênero, como agênero.
Não-binário
Termo associado a pessoas cuja identidade ou expressão de gênero não se limita às categorias "masculino" ou "feminino". Algumas pessoas não-binárias podem sentir que seu gênero está "em algum lugar entre homem e mulher", segundo a GLAAD [organização LGBT americana que monitora como os membros da comunidade são tratados pela mídia], ou até podem definir seu gênero de maneira totalmente diferente — e distante — destes dois polos. Não é, necessariamente, sinônimo de transgênero ou transexual. Uma pessoa não-binária também pode se apresentar como "genderqueer" ou afirmar que tem identidade de gênero "não-conformista".
A sigla LGBTQIA+ reúne essas identidades de gênero. Veja a seguir o que cada uma dessas sete letras e o sinal de soma + representam.
L: lésbicas
É uma orientação sexual e diz respeito a mulheres (cisgênero ou transgênero) que se sentem atraídas afetiva e sexualmente por outras mulheres (também cis ou trans).
G: gays
É uma orientação sexual e se refere a homens (cisgênero ou transgênero) que se sentem atraídos por outros homens (também cis ou trans).
B: bissexuais
Bissexualidade também é uma orientação sexual; bissexuais são pessoas que se relacionam afetiva e sexualmente tanto com homens quanto com mulheres (inclusive homens e mulheres transgênero, que também podem ser bissexuais).
T: transexuais ou travestis
Este é um conceito relacionado à identidade de gênero e não à sexualidade. Pessoas transexuais não se identificam com o gênero biológico, ou seja, quem nasce com pênis e se identifica como mulher (neste caso, uma mulher trans) ou quem nasce com vagina e se identifica como homem (um homem trans).
As travestis, por sua vez, são mulheres trans que preferem ser chamadas dessa maneira por motivos políticos, de resistência. "Ao me apresentar como travesti quero demarcar a luta histórica que as travestis travaram durante muito tempo. A palavra traz consigo resistência, luta e ação", disse a Universa a vereadora Érika Hilton (PSOL-SP), primeira travesti eleita para a Câmara Municipal de São Paulo.
Q: queer
O termo em inglês, que pode ser traduzido como "estranho", é usado para designar as pessoas que não se identificam como sendo 100% homem ou 100% mulher, mas se veem como sendo de um terceiro gênero, fluido/andrógino, com característica masculinas e femininas. A pessoa queer também não vê sua orientação sexual definida como hetero ou homossexual. "O queer envolve sujeitos que não correspondem à heteronormatividade, seja pela sua orientação sexual, identidade de gênero, atração emocional ou pela sua expressão de gênero", explica a professora Bruna Irineu, da UFMT (Universidade Federal de Mato Grosso) e presidente da ABEH (Associação Brasileira de Estudos da Homocultura).
I: intersexo
A intersexualidade descreve as pessoas que podem nascer com genitais correspondentes a um sexo, mas ter o sistema reprodutivo e os hormônios do outro. Ou podem apresentar uma anatomia sexual que não é nem masculina nem feminina — o que leva alguns intersexos a fazer a cirurgia de redesignação sexual. No passado, essas pessoas eram chamadas erroneamente de hermafroditas, termo que não é mais socialmente aceito. Segundo o Manual de Comunicação LGBTI, ainda é comum a prescrição de terapia hormonal e a realização de cirurgias destinadas a adequar a aparência e a funcionalidade da genitália, muitas vezes antes dos dois anos de idade — essa definição de gênero tão cedo essa definição de gênero tão cedo muitas vezes é rejeitada na vida adulta.
A: assexual
Os assexuais são as pessoas que não sentem atração sexual, seja pelo sexo oposto ou pelo mesmo sexo — o que não significa que não possam desenvolver sentimentos amorosos e afetivos por outras pessoas.
+: demais orientações sexuais e identidades de gênero
"Todas as vezes que fazemos tentativas de encaixar, enquadrar e resumir identidades, corremos o risco de ser injustos. A gente vai agregando ao longo da história, mas não consegue abarcar todas as subjetividades", ressalta Bruna Irineu. Por isso, a sigla ganha um símbolo de soma no final, como uma tentativa de incluir demais variações de orientação sexual e identidade de gênero que não estão representadas nas primeiras letras. Uma delas é a pansexualidade, orientação sexual que rejeita a noção de dois gêneros, o que significa que podem desenvolver atração física, amor e desejo sexual por outras pessoas independentemente de sua identidade de gênero ou sexo biológico.
*Este texto reúne informações de reportagens publicadas anteriormente em Universa, como "Entenda o que significa cada uma das letras da bandeira da luta LGBTQIA+", de junho de 2020, e "Resistência e identidade: por que elas preferem ser chamadas de travestis", de abril de 2021.
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