"Sofri racismo em grupo de homens no WhatsApp e fiz BO. Não vão me calar"
Aviso: o depoimento abaixo tem reprodução de comentários racistas enviados à criadora de conteúdo digital
"Falo sobre autoestima, ativismo e protagonismo da mulher preta no Instagram e sofri dois ataques de racismo em grupos do WhatsApp que me colocaram sem eu saber. Publicavam fotos minhas, falaram que iam me dar uma surra. O primeiro se chamava "Abaixo o negrismo [sic]', e fui adicionada nele no final de julho, dia 22. Na descrição, diziam que eram homens, brancos, 'héteros normais'. Quando vi tudo aquilo, fiquei muito nervosa e só saí do grupo.
No dia 8 de agosto, outro grupo criado e mais um ataque. O nome desse era Red Pill [Pílula Vermelha] e consegui ficar lá para tirar print de tudo. Os participantes ficaram mandando mensagens. "'Negas [sic] fedem a bicho". "No BBB 22 poderia ter uma senzala de vidro só para negros". Também escreveram "nega [sic] obesa". E ainda havia falas com conotação sexual e dizendo que eu era ativista "mimimi", por levar as pautas raciais para minha rede social, onde hoje tenho 10 mil seguidores.
Nesta semana, peguei o que salvei de imagem e levei à delegacia, para fazer boletim de ocorrência. Foi registrado como racismo e injúria racial e um inquérito foi aberto.
Depois que tive essa exposição no grupo, os administradores me removeram da conversa. Eram 129 pessoas ali, alguns números dos Estados Unidos, outros do Brasil e uns dois com o DDD do Espírito Santo, onde moro. Pelo que a polícia falou, será pedida a quebra de sigilo dos números, para tentar descobrir quem são essas pessoas.
"Fiquei irritada, chorei, mas precisei tomar uma atitude"
Neste segundo ataque, comecei a chorar e entrei em desespero. Foi quando liguei para um amigo e já entramos em contato com um advogado, porque não queria que aquilo se transformasse só em rancor. Queria tomar uma atitude. Publiquei uma nota no meu Instagram, dizendo que buscaria ajuda das autoridades.
Na delegacia, fui bem atendida. Inclusive o que imagino que não aconteça com outras mulheres, quando vão até lá quando sofrem violência física, por exemplo. E, semana que vem, meu caso deve seguir para uma unidade especializada em crimes virtuais na capital, Vitória. Moro em Colatina, que na verdade é uma cidade majoritariamente conservadora e, por aqui, além da polícia, não tive muito apoio de outras autoridades.
Fazer tudo isso foi um marco na minha vida, desses 26 anos que acabei de completar. Estou impressionada com a força que tirei de mim, mas é bom porque estou recebendo muito apoio. Não tinha noção da repercussão disso. E estou grata por tudo isso, por essa reviravolta na minha vida. Parece que há males que vêm para o bem mesmo.
As pessoas me perguntam o que eu diria para os autores dos comentários. Estou apenas lamentando por esses racistas. Não quero me referir a eles, não merecem. Quem faz esses comentários tem uma certa ignorância, que tem alguma coisa que reprime em si mesmo e, em vez de tratar, despeja tudo de ruim em pessoas que não tem nada a ver, que lutam por causas necessárias, como eu.
Meu ativismo sempre foi na didática. Sei que negros não têm que ensinar nada aos brancos, mas esse é meio jeito. Há muitas coisas que não entram na cabeça deles, como branco não sofrer racismo, mas tento explicar isso e outros temas, porque sou assim.
O que desejo que as pessoas que sofrem com racismo criem coragem para ir até a delegacia para mostrar que a gente tem força muito grande. É como diz aquela música da Iza, a 'Pesadão': "Se tentar nos parar, não é bem assim. Ficaremos mais bem fortes do que antes".
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