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'Cachinhos lindos': vítimas de racismo recebem apoio de outras crianças

Marcela Lemos

Colaboração para Universa, no Rio de Janeiro

24/08/2021 04h00

Após expor os ataques racistas contra as filhas de 2 e 9 ano, Roberta Massot, 36, recebeu uma enxurrada de amor, com mensagens de apoio e afeto de outras crianças.

Meninos e meninas, de diferentes idades, gravaram vídeos exaltando a beleza do cabelo crespo e da pele negra, e também prestando solidariedade à família da psicóloga. No começo do mês, Roberta publicou uma vídeo da filha no Instagram e uma seguidora, que se apresenta como pedagoga, enviou mensagens ofensivas.

"Suas filhas são feias, melequentas e têm raiz de cabelo ruim e tá acabado", dizia um dos textos enviados. O caso foi registrado na delegacia como injúria racial.

Os vídeos em apoio às meninas ajudaram Massot a lidar com o caso. "Para mim foi maravilhoso, foi no dia que estava muito mal, triste, sensível, e essa atitude fez nos sentirmos amadas e acolhidas. Estava me sentindo sozinha depois de tudo e essas mensagens me mostraram que tem muita gente lutando do nosso lado", disse a psicóloga a Universa.

A maioria dos vídeos partiu de famílias que integram o projeto "Ana Curiosa", criado para empoderar meninas negras. Universa teve autorização das famílias para divulgar os conteúdos.

"Nosso cabelo é lindo e ninguém poder dizer diferente"

"Eu vim dizer que o nosso cabelo é lindo, é incrível. Olha gente, esses cachinhos maravilhosos. O nosso cabelo é de princesa, de rainha, é maravilhoso. Então vamos combinar que ninguém vai poder dizer diferente disso. O nosso cabelo é maravilhoso e a gente pode ser o que quiser", disse Cecinha, de 8 anos, moradora de Salvador (BA).

Lais Helena, também com 8 anos, fez menção aos cabelos das meninas como, na verdade, coroas que carregam.

"Eu fiquei sabendo da situação que vocês passaram, vim aqui para dizer que seus cabelos são de rainha, seus cabelos são suas coroas. Nosso cabelo é nossa coroa e como somos rainhas, rainha não tira suas coroas, pois a coroa dela é o orgulho dela! Nosso cabelo é nosso orgulho, então não tenham vergonha dos seus cabelos (...) Racismo é crime".

"Eu vim dizer que vocês são lindas, que nosso cabelo é lindo, que nossa cor de pele é linda. Nós somos princesas e juntas somos mais fortes, vocês não estão sozinhas", declarou a menina Clarinha Larchete.

"Esse nosso cabelo aqui não é duro, essa raiz é linda, é crespa, nosso cabelo: olha que lindo, que coisa linda", reagiu Mariana Santos.

Repercussão chegou aos Estados Unidos

As crianças Noah, 8, Agatha, 6, e Alice, 4, que nasceram no Colorado, hoje moram Springfield, Missourie, nos Estados Unidos, também se posicionaram contra o preconceito em um vídeo de apoio enviado à Roberta. "Seu cabelo é lindo. Você é única. A cor da sua pele é legal e você não merece sofrer bullying", disse o menino Noah em inglês.

A mãe das três crianças, Claudia Kalhoefer, brasileira casada com um norte-americano, diz que o filho é bastante tímido e, mesmo assim, fez questão de enviar a mensagem para a família brasileira que ele nem conhece.

"Ele não gosta de aparecer e esse depoimento partiu dele (...) Ele entende tudo que eu falo em português, mas têm muitas palavras que ele não consegue falar e ele falou: mamãe, eu vou falar em inglês e você traduz? Você coloca legenda em português para a amiga entender?".

As irmãs Agatha e Alice também mandaram um recado: "Eu gosto dos seus cachos. Seu cabelo é muito bonito", disseram as meninas.

Relembre o caso

Foi no dia 2 de agosto que Roberta recebeu mensagens particulares comentando a aparência das filhas de 2 e 9 anos. A mãe havia compartilhado apenas um momento da filha caçula que manifestava a vontade de voltar para a escola e acabou se deparando com mensagens racistas.

O primeiro texto enviado dizia que a menina tinha a raiz do cabelo dura. Ao tentar explicar que a raiz do cabelo da criança era apenas crespa, a psicóloga teve a família ainda mais insultada. A seguidora, uma conhecida da igreja que ambas frequentavam em São Gonçalo, cidade da região metropolitana do Rio, disse que Roberta deveria levar as meninas ao "salão de beleza e tirar as melecas delas".

A Polícia Civil do Rio abriu uma investigação para apurar o caso de injúria racial. A investigação ainda não foi concluída.
A defesa de Roberta vai processar ainda a mulher, que se apresenta nas redes sociais como pedagoga, por danos morais.