'Adulta, encontrei boneca negra que levava até para o bar", diz empresária
"A minha loja começou por conta de uma dor minha. Em 2017 eu precisava presentear uma menina da minha família. Nessa época, estava passando bastante propaganda sobre Barbies negras na televisão e eu fiquei interessada. Com isso, saí do trabalho e fui comprar essa boneca para ir no aniversário.
Deu tudo errado. Procurei em centros comerciais, busquei na rua 25 de março, em shoppings, nas mais diversas lojas e não encontrei nenhuma. Aquilo começou a me incomodar muito porque eu não queria nada demais, eu só queria uma boneca negra para presentear uma garota negra.
Pensei então em procurar na internet, mas só encontrei essa boneca em um site internacional. Quando eu achei, já quis comprar umas quatro porque demorava muito para chegar.
Eu pedi as bonecas em novembro. Em março, quando chegaram, a identificação foi imediata. Eu fiquei tão apaixonada pela boneca, que não quis dar para ninguém, esqueci das crianças. Fiquei com ela pra mim, para presentear a minha criança interior, que nunca teve uma boneca assim, que nem eu. Coloquei uma roupinha nela e levava a boneca comigo por todos os cantos, para a casa dos amigos, restaurantes, até para o bar.
Com isso de carregar a boneca comigo por onde eu ia, as pessoas começaram a perguntar onde eu havia comprado e eu comecei a dizer que havia sido em um site. Me ofereci para fazer os pedidos lá para as pessoas e, em pouco tempo, já tinha 15 pedidos no mês. Ali vi que aquilo renderia negócio.
Percebi que assim como eu, muitas pessoas tinham a necessidade de ter essa boneca negra fosse para presentear a si mesmas, fosse para dar à uma criança. Entendi que isso era um negócio e resolvi batizar as bonecas de Aneesa, que significa "companheira" em africano.
No começo, eu só tinha umas dez bonecas e algumas opções de roupinhas, mas fui querendo trazer mais personalidade pra elas. Fui atrás de uma costureira, uma designer.
Eu precisei aprender a empreender, não sabia muito sobre essa área, então me capacitei, fiz algumas acelerações para empreendedores, que contribuíram muito para minha evolução. Em 2019, participamos da Feira Preta e foi um grande sucesso. A tão sonhada Loja Aneesa foi um sucesso, tinha bonecas com roupas exclusivas feitas por uma costureira que trabalhava com a gente.
Acabamos saindo na televisão e muitas pessoas vieram nos contatar dizendo: 'Eu preciso dessa boneca para minha filha!'. Naquele final de semana do evento, nós vendemos todas as bonecas que tínhamos no estoque, não ficou nenhuma para época do Natal.
Em 2020, nós chegamos fortalecidos, bem conhecidos no mercado, com uma ótima segmentação de público. Com isso, estávamos cheios de vontade, mas aí veio a pandemia e paramos de vender por conta do fechamento das lojas e o lockdown do início.
A gente não sabia o que fazer, mas então tive a ideia de fazer um protesto dançante. Chamamos crianças para dançar a música da Larissa Luz "Procura-se Bonecas Pretas", e a partir daí teve muita repercussão. Muitas crianças participaram e nós voltamos a ficar em evidência com a divulgação deste manifesto. Até a própria Larissa Luz compartilhou a filha dançando.
No meio de 2020, aconteceu um divisor de águas na minha vida depois de recebermos o convite para participar do Shark Thank, um reality de empreendedorismo no Brasil, exibido pelo Canal Sony, que oferece oportunidade de lançar ideias inovadoras para um grupo de grandes investidores — os 'sharks' ou 'tubarões', como são chamados. Em quatro temporadas, o Shark Thank Brasil recebeu mais de 6.700 inscrições de empreendedores, mas apenas 4% chegaram à final para apresentar o seu negócio para os investidores. O programa é uma adaptação do reality japonês Dragons & Den.
Fizemos o processo seletivo e deu muito certo, acabamos na final e passamos na televisão. A partir daí, a loja da Aneesa apareceu para o grande público, deixou de ser algo mais de nicho e conseguimos falar com a população mais geral sobre a importância da diversidade nos brinquedos, que crianças pretas precisam ter bonecas pretas e também que mulheres adultas precisam realizar o seu sonho de ter uma boneca negra, que é um desejo de infância não realizado.
Hoje nós somos o primeiro e-commerce especializado em bonecas negras da América Latina e eu me orgulho de dizer isso. No começo nós só tínhamos um modelo de boneca, mas fomos crescendo gradativamente e hoje são mais de 40.
A loja veio para preencher um vazio meu e de tantas outras pessoas negras. Minha vida como empreendedora teve e continua tendo muitos percursos. Quantas vezes eu não duvidei de mim? Quantas vezes quiseram que eu não acreditasse mais no meu sonho? Quantas vezes não me disseram que vender boneca não dava dinheiro? Ou que era fútil vender boneca preta? Não dei ouvidos, seguimos em luta.
O fato de, hoje, o meu negócio poder influenciar as pessoas a entenderem a importância da representatividade e do empoderamento é uma realização imensa.
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