Readaptação: mães contam os desafios da fase pós-isolamento
Mesmo com os desafios do home office e depois de um ano e meio com as crianças em casa fazendo aula online, decidir se voltam ou não ao ensino presencial não foi fácil. O principal motivo, claro, é o medo de contaminação delas e de membros da família. Por outro lado, o impacto de se estar longe do ambiente escolar - sem trocar experiências ao vivo e cultivar a convivência com os colegas - pesou muito para quem decidiu que, neste último agosto, elas voltariam.
Ainda que esse retorno possa ter algumas pausas, o ambiente escolar se mostra muito mais atraente do que o ensino pelo computador. "Nada substitui o presencial, o contato físico é uma necessidade do ser humano. A volta está sendo muito celebrada. O viver em sociedade é necessário e prazeroso. Quando há necessidade de quarentena, há muito choro ainda", diz Erica Mantovani, psicopedagoga e coordenadora do Fundamental I do Colégio Mater Dei, em São Paulo.
Além disso, a volta às aulas dá às mães um respiro de uma rotina dura de home office, apoio escolar, sem ter o cuidar de si na lista das prioridades. "A pandemia revelou uma coisa que estava lá: as mães são sobrecarregadas com os cuidados da casa e das crianças. Já era um problema terrível de saúde mental e isso se escancarou", fala a psicanalista Vera Iaconelli que tem promovido uma série de cursos para sobre psicanalise, pais e pandemia.
De volta ao convívio
A falta que a filha, Julia, de 10 anos, sentiu em conviver com os colegas, foi o que pesou na decisão da empresária paulistana Leila Peres, de 44 anos. "O primeiro dia de aula presencial, no começo de setembro, foi emocionante. Ficamos ansiosas, teve aquele ritual de arrumar a mochila, parecia o primeiro dia de escola da vida."
A vantagem também fica por conta da reorganização da vida pessoal, já que Leila, que já trabalhava em casa, precisou dividir seu escritório com a filha que assistia às aulas no mesmo ambiente. Assim, interrupções eram frequentes. Agora, está conseguindo se organizar para ter manhãs mais produtivas e fazer reuniões com calma. "A desvantagem foi a locomoção, pegar trânsito, já tinha me desacostumado a isso. Além disso, tivemos que voltar ao esquema antigo, pois minha filha ficou gripada depois de dois anos sem nada", diz.
Esse vaivém ainda deve continuar por um tempo, já que o vírus ainda circula e nem metade da população brasileira recebeu a segunda dose da vacina contra Covid. Muitas mães também estão deixando os filhos partirem para a escola somente depois que pelo menos os adultos que vivem na mesma casa estejam imunizados
Assim foi na casa da advogada Isaura Sarto, de 40 anos, de Brasília. Ela e o marido são do grupo de risco, então seus filhos Vittorio, de 10 anos, e Lorenzo, de 7, só retornaram neste semestre, mesmo a escola já estando aberta desde o começo do ano. "Eles ficaram frustrados pois, como tinha o ensino híbrido, alguns colegas já estavam em sala", diz.
Durante este período ela teve que diminuir o ritmo de trabalho para poder acompanhar as aulas online, principalmente do mais velho, que é autista. No esquema presencial, ele conta com uma assistente terapêutica para intermediação das atividades. Em casa, a função ficou para ela. Também assumiu a tarefa de ajudar o mais novo a se alfabetizar.
Agora, na volta, está bom para todo mundo, principalmente para o retorno ao trabalho com seus clientes e para poder respirar um pouco. "Eu fiz tudo online, não saí nem para o mercado. Semana passada fiz compras ao vivo e uma coisa simples me deu uma sensação diferente. Também estou conseguindo tomar café da manhã e conversar com calma com meu marido, o que era raro", conta Isaura.
Uma nova adaptação
Para a bancária Débora de Oliveira, de 39 anos, de São Paulo, a volta às aulas não foi tão boa assim, pois agora ela enfrenta um problema de adaptação das filhas Ana Clara, 11 anos, e Ana Valentina, de 8 anos.
Quando o isolamento foi decretado em março do ano passado, ela continuou trabalhando presencialmente, das 9 às 18. Precisou comprar dois notebooks para que as filhas pudessem acompanhar as aulas e passar o dia na casa de uma de suas irmãs. "Como não estava contente com a organização das aulas online, eu mudei as meninas de escola e melhorou muito. Só que, na volta do presencial, senti que elas perderam muito conteúdo e vão passá-lo de qualquer jeito. Além disso, está difícil fazer amizades, tem muito estranhamento, elas não estão felizes."
Agora, ela procura uma escola nova, que seja mais forte em termos de conteúdo. Segundo a psicopedagoga Érica Mantovani, o processo de aulas online reaproximou as famílias das instituições de ensino, mas a situação é desafiadora para ambos. "Depois desse tempo os pais viram o que funciona, o que não funciona, já adoeceram. Mas também existe um esgotamento dos recursos. O mais problemático agora é as pessoas não perceberem que, se foi preciso uma adaptação na entrada da quarentena, vai ter que ter na saída também. Será preciso lidar com essa fase internamente ", diz Vera.
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