Mulher trans, negra e nordestina: Diva Menner quebra tabus em musicais
"Na minha infância, quando sonhava em aparecer na TV, eu queria fazer igual à Roberta Close: mostrar que as travestis também podem ser glamourosas e felizes", comenta a artista pernambucana Diva Menner, 37 anos, em entrevista concedida a Universa pouco antes de sua estreia no musical "Barnum - O Rei do Show".
No elenco fixo do espetáculo, peça com Murilo Rosa e Kiara Sasso que estreou no último dia 1º de outubro, Diva interpreta o papel de Joice Heth, "a mulher mais velha do mundo".
Apesar dessa ser sua primeira participação em musicais, Diva tem familiaridade com este universo: durante 7 anos estudou em um conservatório de Recife, fez parte da Orquestra de Canto de Pernambuco e, mais recentemente, foi a primeira mulher transexual a participar do reality show "The Voice Brasil".
Agora, no papel de Joice, ela entra para a história do teatro brasileiro quebrando tabus como uma das mulheres trans a ganharem papel de destaque nos musicais — igual sonhava quando era criança.
Trans de transformação
Quando Diva recebeu uma mensagem de Gustavo Barchilon, diretor-geral de "Barnum", achou que o convite para participar do musical era falso. "Pensei que aquele cara me mandando mensagem em uma rede social para me convidar a estrear um musical era fake", relembra a cantora aos risos.
Em bate-papo, o diretor relembra o primeiro contato com Diva: "Eu queria levar diversidade ao palco. Fiquei chateado quando abri a audiência para escolher alguém para o papel e não recebi nenhum material de atrizes transexuais. Um amigo me falou da Diva e mandei mensagem para ela no Instagram - na época, ela ainda participava do programa 'The Voice'".
Segundo Gustavo, "Barnum" é um "espetáculo sobre diversidade". A peça conta a história de vida do popular showman e empresário do ramo do entretenimento, dono de um circo itinerante. Trata-se de um dos musicais mais populares da Broadway, nos Estados Unidos - a sua primeira e mais famosa montagem, com Jim Dale e Glenn Close nos palcos.
Com um personagem principal polêmico - que comprava escravos para transformá-los em atores circenses -, o diretor fez algumas adaptações na peça para que ela não fosse "cancelada".
Não posso contar a história do Barnum hoje em dia como ela foi contada nos anos 80. Eu, enquanto um homem LGBTQIA+, tentei trazer diversidade à peça, coloquei uma atriz trans no palco, dei toques 'feministas' à mulher do personagem principal - Gustavo Barchilon
Diva abraçou a ideia do diretor e, no último domingo (03), subiu aos palcos do Teatro OPUS, em São Paulo, como Joice. "Ela está fazendo história, nunca uma atriz trans foi a estrela de um musical", destacou Gustavo. Para Diva, o que vale é o desafio: "Gosto de me desafiar. Sou trans, uma transformação ambulante. Todos os dias me olho no espelho e me sinto diferente, às vezes mais bonita, às vezes mais feia, mas sempre diferente".
Diva igual Celine, Alcione e Elza Soares
Das novidades da vida de Diva, seu nome não é uma delas. "Isso surgiu porque eu fazia cover da Céline Dion, da Aretha Franklin, da Elza Soares, nas ruas de Recife. Eu só imitava divas, então o público começou a me chamar de Diva. As pessoas que me deram esse apelido, eu só me apropriei dele."
Diva conta que começou o processo de transição há 6 anos. "No começo, tomava hormônio sozinha. Há 3 anos, me inscrevi em um projeto social de Recife, o 'Amor Trans' e lá me encaminharam para um ambulatório onde pude fazer o tratamento completo. Passei por um endocrinologista e logo percebi as mudanças físicas no meu corpo, além das mudanças emocionais".
"Sou muito vaidosa", afirma a artista, que já passou por três cirurgias plásticas (silicone, lipoaspiração e bichectomia). "Fiz esses procedimentos para ficar mais feminina - e quero fazer mais. Sou vaidosa."
Encarar o papel da "mulher mais velha do mundo" foi um desafio para quem não nega a vaidade. "Nunca me imaginei velha. Sou apegada à beleza, à feminilidade, à juventude. Gosto de me sentir desejada. Foi um pouco difícil me transformar na Joice, ela é uma personagem muito caricata, tive que 'ficar feia', corcunda, exagerada. Mas aconteceu".
Ela reconhece, contudo, que em um país onde a população trans tem baixa expectativa de vida, envelhecer é um privilégio. "Nós, transexuais, morremos cedo - e isso é um absurdo. Eu quero viver bastante."
Barnum - O rei do show
Onde: Teatro OPUS - Av. das Nações Unidas, 4777 - Alto de Pinheiros, São Paulo - SP
Quando: De 1º de outubro a 28 de novembro de 2021
Horários: sexta, às 20h30, sábado às 17h e às 20h30, domingo às 16h e às 19h30. 100 minutos de duração
Valores: Ingressos a partir de R$ 25,00, pelo site ou na bilheteria do evento
Classificação: Livre
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