Janaina Paschoal sobre veto de PL da laqueadura: 'E o direito de decidir?'
Após aprovação da Alesp (Assembleia Legislativa de São Paulo), o projeto de lei que visa facilitar o acesso da mulher à laqueadura mesmo quando ela ainda não tem filhos, e sem autorização do companheiro, da deputada Janaina Paschoal (PSL-SP), foi vetado pelo governador João Doria (PSDB) na última sexta-feira (15). A Universa, Janaina disse que tentará derrubar o veto:
"Entendo que seria importante para a autonomia individual de homens e mulheres, para o planejamento familiar, para evitar abortos e crianças abandonadas."
Questionada sobre o veto, a assessoria de imprensa do governador informou a Universa, por meio de nota, que o projeto é inconstitucional e que compete e contrapõe-se, em diversos pontos, com a legislação federal de 1996, sobre o planejamento familiar.
A Constituição Federal garante que os estados legislem de maneira concorrente com a União uma série de matérias, entre elas a da saúde. Baseada nisso, Janaina, que é advogada e professora da Universidade de São Paulo (USP), discorda do argumento de Doria:
"Nossa lei daria interpretação conforme a Constituição Federal, autorizando as pessoas a decidirem sobre o seu próprio corpo. A Constituição é um texto vivo que se renova. E essa atualização do papel da mulher na sociedade precisaria ter sido feita."
O que diz a lei federal e o que propõe Janaina
Assim como consta na Lei Federal de 1996, sobre o planejamento familiar, a deputada propõe que a decisão pelo método contraceptivo da esterilização deve ocorrer desde que a pessoa seja conscientizada, esclarecida e informada sobre outros métodos menos invasivos e da irreversibilidade da esterilização.
A diferença é que o texto escrito pelo então deputado federal Eduardo Jorge (PT-SP) estipula prazo de 60 dias entre a manifestação de vontade da mulher e a cirurgia, além de "registro de expressa manifestação da vontade em documento escrito e firmado".
Janaina também propõe que a mulher não precise mais da autorização do companheiro para a cirurgia, sendo que na lei federal "a esterilização depende do consentimento expresso de ambos os cônjuges".
"O próprio Supremo Tribunal Federal já reconheceu ser ultrapassado e inconstitucional o fato de uma pessoa precisar do aval do cônjuge para fazer esterilização voluntária, tanto homem quanto mulher. Nesse contexto, a nossa lei aqui em São Paulo seria vanguardista", defende a deputada.
O projeto também autoriza à mulher solicitar a laqueadura durante a cesárea, ao contrário do texto federal, que diz que isso só pode acontecer "nos casos de comprovada necessidade, por cesarianas sucessivas anteriores".
"O argumento que se utilizou em 96 foi que a mulher grávida não tinha condições de decidir, por estar abalada pelos hormônios. Hoje todos sabemos que as mulheres trabalham até o último dia de gestação, então não tem muito sentido tirar dela esse direito de decidir fazer no meio do nascimento do filho. Assim ela deixa de se submeter à segunda cirurgia ", afirma.
Em outro trecho considerado polêmico por especialistas, a deputada sugere esterilização voluntária em pessoa usuária de drogas, se for pedido por ela. O mesmo vale para pessoas com deficiência, salvo quando esta é avaliada por equipe multidisciplinar e ouvida em juízo.
A Lei Federal considera crime se a esterilização for praticada durante os períodos de parto ou com manifestação da vontade do esterilizado expressa durante a ocorrência de alterações na capacidade de discernimento por influência de álcool, drogas, estados emocionais alterados ou incapacidade mental temporária ou permanente.
'Proposta pode nos levar à esterilização compulsória e eugenia'
A advogada cearense Patrícia Marxs, 34 anos, nunca quis ser mãe, e decidiu fazer uma cirurgia para a retirada das trompas de Falópio. Após o procedimento, se tornou ativista da causa e, através das redes sociais, ajuda outras mulheres, mesmo as que já são mães e não querem mais engravidar.
Ela concorda, porém, com o veto de Doria por entender que facilitar o acesso à laqueadura pode, na verdade, colocar a mulher, principalmente aquela em situação de vulnerabilidade social, em perigo.
"A gente não pode esquecer que a lei do planejamento familiar nasceu de um contexto em que existiam esterilizações compulsórias em mulheres em situação de vulnerabilidade, pelo simples motivo de que achavam que elas não poderiam gestar novamente. Pode ter sido com o bom intuito de facilitar, mas acho totalmente perigoso a gente passar para o outro lado, que é o da esterilização compulsória e da eugenia."
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