Senado deve votar lei que proíbe discriminar gays na hora de doar sangue
O contador paulistano Gabriel, de 28 anos, tentou por duas vezes doar o seu sangue — do tipo O positivo, ou seja, universal — para uma tia e depois para a mãe, em épocas diferentes. Apesar de alegar boa saúde nas duas ocasiões, que ocorreram em 2013 e 2017, conta que foi proibido de realizar o procedimento assim que revelou ser homossexual.
No caso da tia, que passou por um parto de risco de trigêmeos, ele era o único na família que poderia doar, mas precisou fazer uma campanha entre amigos para ajudar a parente. Após essa experiência, pensou até em omitir sua opção sexual quando a mãe também precisou de sangue ao fazer uma histerectomia, mas quis fazer valer o seu direito. Não conseguiu.
"Quando perguntaram se eu havia tido relações heterossexuais nos últimos 12 meses, eu confirmei e não falaram nada. Mas quando respondi que havia tido relações homossexuais também, o médico disse para eu achar outras pessoas que tivessem sangue compatível, porque eu estava "magro" demais para doar sangue. Disse isso sem ter feito nenhuma mensuração de peso, altura, exames, nada", Gabriel relata.
A sensação é de impotência e de que talvez eu seja o errado na situação porque é o tipo de coisa que um heterossexual não sofre
Segundo o Ministério da Saúde, um dos impedimentos para se doar sangue é a pessoa ter sido exposta a situações de risco para ISTs (Infecções Sexualmente Transmissíveis). Caso isso ocorra, ela deve aguardar 12 meses após a exposição para então ser possível doar sangue. Em nenhum momento se fala em orientação sexual.
Além disso, em 2020, o STF (Supremo Tribunal Federal) declarou inconstitucionais duas portarias, do Ministério da Saúde e da Anvisa, que exigiam que homens que tiveram relações sexuais homossexuais (e suas eventuais parcerias) fossem sujeitos à quarentena de 12 meses para doar sangue.
No seu voto, o ministro Edson Fachin decretou que "orientação sexual não contamina ninguém, condutas de risco, sim."
"Não há sangue de segunda categoria"
Para o senador Fabiano Contarato (Rede-ES), é preciso mais que uma declaração do STF e, por isso, ele é autor do projeto de lei que proíbe essa discriminação pela qual Gabriel passou. O PL será votado nesta quinta-feira (4) no Senado.
A Universa, o senador lembra que todo sangue deve se submeter ao mesmo rito de testagem rigorosa, para assegurar a prevenção a infecções.
"Dito isso, não há sangue de segunda categoria, pois não deve existir ser humano de segunda categoria. Excluir alguém, à priori, da possibilidade de doar apenas por sua orientação é mais uma forma perversa de exclusão e de violação da dignidade dos LGBTQIA+, dentre tantas outras violências simbólicas e estruturais ocultadas a pretexto de falsa ciência", ele acrescenta.
O senador espera que o Congresso "faça o seu dever de casa":
"Apesar de se tratar de uma questão já resolvida judicialmente, o tema certamente enfrentará resistências de setores reacionários que, no Congresso, patrocinam uma verdadeira cruzada anti-civilizatória. Espero que cumpramos nossa função de legisladores: antes tarde do que nunca."
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