Caminhoneira enfrenta a depressão realizando o sonho de estar na estrada
Cruzar rodovias pelo Brasil e viver uma vida mais solitária nunca foi um problema para a gaúcha Janaína Cardoso, que cresceu em uma boleia de caminhão acompanhando o pai caminhoneiro pelo país afora. Para realizar o sonho de dirigir a própria carreta, no entanto, ela precisou enfrentar obstáculos, como a depressão. Hoje, ela mostra em suas redes sociais a realidade e os perrengues de quem trabalha na estrada.
Jana decidiu se tornar profissional aos 17 anos. Mas teve de ouvir do pai que a carreira não era para ela. "Lembro que ele, que já tem mais de 38 anos de profissão, foi bem enfático quando perguntei: 'Você prefere que eu seja caminhoneira ou que tenha um marido caminhoneiro?'. Ele respondeu: 'Não quero nenhum dos dois'."
Contrariando a opinião dele, a jovem acabou encontrando o próprio caminho anos depois, inspirada pelas memórias da vida na estrada ao lado de seu maior ídolo. Ela relembra as viagens na boleia do caminhão do pai, como quando eles rodaram por dois meses até o Nordeste, e a ocasião em que estiveram no Chile.
"A viagem mais marcante mesmo foi para o Chile, porque teve um trecho em que ele me colocou ao seu lado, e me deixou dirigir sozinha. Eu estava realmente pilotando e eu nunca me esqueço disso. Foi ali que eu decidi ser caminhoneira", diz.
Ela começou no trabalho com um caminhão pequeno de quatro eixos, fazendo o interior de São Paulo, e aos poucos foi conquistando seu espaço até estar à frente de uma grande carreta percorrendo estradas do Mercosul, o seu maior sonho.
Depressão
Quem vê os vídeos de Janaína nas redes sociais não imagina os bastidores de uma rotina que ela vivenciou antes de assumir o volante. A caminhoneira precisou combater o seu maior inimigo interno, a depressão, para conseguir realizar o sonho de viver da profissão.
Eu trabalhava numa academia como gerente, e comecei a me sobrecarregar. Estava em um relacionamento difícil, comecei a sentir uma depressão muito forte e a ter pensamentos suicidas. Foi quando eu larguei tudo e decidi seguir o meu sonho de viver da estrada.
A jovem passou a ter o acompanhamento de especialistas, mas viu na profissão de caminhoneira a solução para que sua vida tivesse mais sentido. "Percebi que era isso o que eu queria, era o que eu amava e chega. Esse foi o gatilho para começar", conta.
Ser caminhoneira era um sonho que parecia impossível, porque eu ficava esperando que alguém me pegasse pelo braço e me ajudasse, mas aí eu resolvi ir sozinha.
Lidando com o assédio
A influenciadora ainda relata as dificuldades que já enfrentou na estrada, incluindo alguns assédios verbais durante suas paradas de descanso. "As pessoas acham que quando a gente pede ajuda precisa oferecer algo em troca. É complicado essa parte, tem que ter jogo de cintura".
Um pouco emocionada, a profissional das estradas comenta que esse é um assunto delicado sobre o qual ela evita comentar por ter passado por muitas situações constrangedoras durante suas viagens.
"Eles não são diretos no que querem, mas a gente desconfia. Os homens fazem piadinhas, jogam beijo, mas eu fico firme para não dar espaço. Hoje eu não consigo confiar em mais ninguém", relata.
Sem banho quente
Ela também relembra os tantos desafios que se apresentam na profissão. "São vários perrengues que a gente passa, né? Teve uma vez em que eu estava com um carregamento de brócolis e o caminhão já começou a apresentar falhas. Encostei, fechei o veículo e peguei uma carona até um posto mais próximo para ligar para a empresa, mas eles não iriam conseguir me socorrer. Aí eu peguei uma outra carona em um caminhão para ir até um mecânico, mas no caminho o pneu estourou. Foram momentos muito difíceis, e acabei chorando muito. Hoje eu choro, mas é de gratidão, por estar conseguindo superar as dificuldades e estar realizando o meu sonho."
Mesmo diante de muitos obstáculos, a viajante diz que sua intuição é a que vale na hora de identificar os perigos.
Seus vídeos nas suas redes sociais são cheios de humor e mostram os bastidores e a realidade de quem vive na estrada. Em um dos episódios ela chegou a contar sobre a falta de estrutura para os profissionais nas paradas, principalmente nos postos de combustíveis. Inclusive, ela confessa que chegou a ficar sem banho por não conseguir um chuveiro quente, ou mesmo um banheiro limpo para as mulheres. Mas que, apesar disso, fica feliz vendo um número maior de mulheres trabalhando na área, e que tem vontade de encorajar muitas outras ainda.
Realizar esse desejo fez com que Janaína tatuasse em seu próprio corpo a frase "Toda realidade um dia foi sonho, de pai para filha", assim que conseguiu a carteira de motorista da categoria, em uma homenagem ao importante aprendizado que seu pai ofereceu para que ela seguisse adiante.
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