Após 10 abortos espontâneos, brasileira comemora gravidez de gêmeos
Amanda Altoé, 40, é natural do Espírito Santo, mas hoje mora em Provo, no estado de Utah (EUA), junto com o marido, Rafael Bispo, 40. Os dois tentam ser pais há 12 anos, mas, desde 2009, ela sofreu nove abortos espontâneos — bem antes, ainda em outro relacionamento, teve que lidar com a primeira perda, com apenas 20 anos. A dificuldade sempre se deu por ter útero bicorno, uma má-formação congênita do órgão. Após o casal desistir de continuar com as tentativas, descobriu, no final de julho, que ela estava grávida de gêmeos idênticos.
"Soube da gravidez gemelar no quarto mês, pois pensei que havia perdido devido a um sangramento no segundo mês de gestação. Nos dez abortos, o sangramento era um forte indício de mais uma perda", explica a administradora em entrevista a Universa.
Antes de descobrir a gestação, ela já fazia tabelinha, método contraceptivo comportamental e não recomendado para evitar gravidez, enquanto o marido, pai de dois filhos de outro casamento, se preparava para uma vasectomia. A decisão veio após a décima perda, ainda em fevereiro deste ano — o que só aumentou a surpresa da novidade poucos meses depois.
A gestação não esperada foi recebida com ainda mais cautela. As perdas anteriores sempre ocorreram entre a nona e a 16ª semana e um sangramento no segundo mês da gravidez foi recebido como um filme já conhecido.
"Fomos ao médico pensando que já havia abortado e o feto não tinha descido. A intenção era marcar uma curetagem. Quando o médico fez ultrassom foi um choque ao ouvir o coração batendo", declara Rafael, que era gerente em uma unidade de saúde antes de ir para os Estados Unidos em agosto de 2019.
"Quando falei para o médico que estava surpresa, porque sempre recebia a notícia da parada do coração e já não tinha mais expectativa, ele anunciou que eram dois corações. Fiquei em choque sem entender e acreditar, e um medo enorme de perder dois de uma vez. Foi um susto e uma emoção inexplicável ao mesmo tempo".
Amanda teve o primeiro aborto com 20 anos, no primeiro casamento. Ela chegou a buscar especialistas para saber o que estava acontecendo. A origem do problema era desconhecido até ela descobrir que tinha útero bicorno, fato que só foi conhecido ao descobrir a mais recente gestação.
O que é útero bicorno?
"Útero bicorno é apenas uma das malformações congênitas do útero. A prevalência dessas malformações chamadas de müllerianas depende da população estudada. Em população geral, talvez 3,2% a 5,5% tenham uma dessas anomalias, aumentando para até 24% das pacientes com infertilidade e abortos de repetição", explica a Universa Conrado Milani Coutinho, médico-assistente do Hospital das Clínicas da FMRP-USP (Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da USP).
Segundo o especialista em medicina fetal, 26% das malformações em úteros são de úteros bicornos, 35% septados, 18% arqueados, 10% unicornos e 8% didelfos, sendo estes os tipos mais comuns.
As principais consequências das anomalias müllerianas são alterações menstruais, dores pélvicas e infecções. Em gestações, há uma maior taxa de abortos, parto pré-termo (antes das 37 semanas), sangramentos, necessidade de cesáreas, dentre outras.
Amanda fez consulta com uma médica que confirmou com outros profissionais a condição: "Após a descoberta, veio afirmação dela e de outros médicos que essa seria a provável causa dos abortos consecutivos, pois a fixação de um óvulo é mais complicada dependendo do formato uterino de cada mulher. E deixou claro que é raro uma mulher na minha idade engravidar de gêmeos com esse útero em formato de coração".
Coutinho explica que gestações múltiplas já são consideradas de alto risco, podendo causar complicações, em especial, partos prematuros. Quando são univitelínicas, ou seja, originadas de uma única fecundação, elas podem ser mono ou dicoriônicas (uma ou duas placentas).
"As monocoriônicas [caso de Amanda] são de maior risco, pois pode haver complicações relacionadas a comunicações vasculares anormais na placenta. Adicionado a isso, o fato de ter o útero bicorno aumenta o risco gestacional. Então, o pré-natal especializado é fundamental para essa gestante, com avaliações próximas", alerta o médico.
'Experiência dolorosa com final feliz'
"[Meu marido] sempre me acompanhou e me apoiou em tudo. Porém, ele sofria muito mais que eu nas perdas. Sempre ficava muito mal e nos últimos abortos, já não queria mais ir. Ele não tocava na minha barriga e nem falava nada porque já era certa a perda", lembra Amanda.
Agora, com 27 semanas, tudo tem corrido bem até aqui e ela ainda não sabe se o parto, previsto para a segunda quinzena de fevereiro, será normal ou cesáreo. Os bebês se chamarão Eric e Thiago.
O pai afirma que existe uma carência de informações e profissionais que possam ajudar famílias em situações como a que eles passaram nos últimos anos, mas deixa uma mensagem.
"É importante que isso [da nossa história] seja divulgado para ajudar as pessoas, porque a gente, por exemplo, sofreu. Hoje não sofremos, mas quantos ainda estão sofrendo e vão sofrer? Só quem sofreu um aborto, você fazendo planos e tudo, sabe como é doloroso", admite.
Amanda complementa. "Eu estou falando a respeito dessa experiência dolorosa com final feliz, a fim de ajudar outras mulheres que sofrem abortos e mantêm um luto invisível por não saberem o motivo. Quero que acreditem na ciência e busquem um diagnóstico precoce para realizar esse sonho de ser mãe".
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.