Nas redes, elas invertem 'antes e depois' para romper tabu de ganho de peso
"Na primeira foto, me lembro bem de estar vivendo uma vida completamente para a internet. No feed e nos Stories, estava tudo perfeito. Vida de blogueira. Mas fora dos Stories eu estava completamente destruída emocionalmente. (...) Eu me achei depois de anos. Essa segunda foto mostra bastante esse sentimento. De aprender a me libertar, a me conhecer, a me amar. E me sentir confiante comigo mesma."
A legenda que acompanha o "antes e depois" que abre esta matéria foi feita pela criadora de conteúdo Dora Figueiredo quando publicou a mesma montagem no Instagram, onde é seguida por mais de 750 mil pessoas. É na rede social, aliás, que a também atriz fala de autoestima e saúde mental. Com as fotos e os textos explicativos, mostra ao público que ter um corpo magro nem sempre é sinônimo de saúde e de felicidade.
Com foco na autoaceitação e valorização de corpos reais, criadoras de conteúdo como ela invertem a ordem do "antes e depois" que celebra o emagrecimento como valor estético — só no Instagram, são 4,9 milhões de publicações marcadas com essa hashtag mostrando redução de medidas, corpos que ficaram mais sarados, mais magros — para trazer ao debate a importância da saúde, principalmente daqueles que têm transtornos alimentares suscitados pelo culto à magreza.
'Antes e depois' invertido: por que elas mostram ganho de peso?
O formato chama atenção porque, no mar de montagens de emagrecimentos, é base principalmente para relatos de pessoas que se sentiam pressionadas para serem magras. Algumas, como no caso de Dora, tiveram um passado de transtornos alimentares. Para a nutricionista comportamental Caroline Bartholo, especialista no tema, o material "é uma saída para falar de corpos reais, com que as pessoas se identificam".
Ganho de peso e saúde mental
Para Universa, Dora contou que as montagens de "antes e depois" invertido surgiram entre suas publicações quando sua própria saúde mental passou a ser uma preocupação maior em sua vida do que a aparência. "Sempre lembrei de como era triste quando era muito magra. Por que não fazer uma montagem que fosse sobre saúde mental que mostrasse que, mesmo eu tendo engordado, estava feliz com meu corpo?".
Postar isso tem tudo a ver com minha saúde mental. Geralmente, no 'antes', estava em fases da vida muito difíceis e meu único objetivo era ser muito magra. Hoje, sei que felicidade não tem a ver com o tamanho do meu corpo. E que nas publicações que a pessoa emagrece, a gente não sabe o que fez para isso, se está saudável e feliz.
A criadora de conteúdo Miriam Bottan, com 556 mil seguidores na rede social, é uma das que usam a própria experiência para falar sobre transtornos alimentares, comportamentos compulsivos. Ela também expõe o ganho de peso no formato comparativo para questionar a pressão estética a que somos submetidas. Aqui, um exemplo no trecho da legenda que acompanha a foto abaixo:
"Será que um corpo super magro ou definido te faria realmente mais feliz? Apesar de já ter falado sobre isso algumas vezes, ainda me surpreendo com a dificuldade de encontrar uma foto sorrindo nas fases em que meu corpo estava exatamente do jeito que eu achava que tinha que ser."
Miriam, aliás, foi uma inspiração para que a criadora de conteúdo Ciça Campos também usasse o recurso da imagem do 'antes e depois' ao contar sua história de ganho de peso ligado à saúde. Vivendo por sete anos com transtornos alimentares e há três com alta médica, Ciça quer que os mais de 30 mil seguidores no Instagram saibam que o fato de ela ter engordado trouxe mudanças comportamentais positivas para sua saúde mental.
"Tive uma mudança no corpo, mas continuo magra. Então, faço a montagem, mas nem sempre de biquíni, por exemplo. Costumo escrever sobre coisas que o transtorno alimentar me causava: de eu estar magra, modelando e indo ao hospital todo mês, sofrendo com depressão", pontua. "E esse formato acaba surpreendendo, porque o clássico é sempre uma pessoa gorda, infeliz, na primeira foto e, na outra, 'linda, plena na praia, com um namorado gato'."
Quando o corpo do outro gera "gatilho": como lidar
Para Ciça, a comparação que foca no emagrecimento causava gatilhos emocionais, inclusive. "Eu mesma me comparava, tirava uma foto minha e colocava ao lado daquela pessoa. Mas a gente sabe que a desconstrução está em perceber que tristeza e felicidade não estão ligadas ao corpo necessariamente."
Dora pondera que os efeitos da pressão estética a atingem até hoje. "Vejo uma foto em que alguém parece mais magro e aparentemente mais feliz e fico pensando: 'Será que vou ficar mais feliz se emagrecer?'. Mas hoje percebo que minha autoestima não é mais ligada só ao meu corpo, é quem eu sou, ao meu trabalho."
Para a nutricionista Caroline Bartholo, a exposição de mudanças corporais nas redes sociais com essa perspectiva "invertida" têm, de fato, dois lados.
"Para quem está em tratamento de transtorno alimentar, pode gerar certa ansiedade ou até medo do ganho de peso. Esse é um sintoma dele, aliás. Mas o que elas fazem é quebrar um tabu mesmo, ao passar a ideia de autoaceitação e de que sofriam com um corpo magro demais e que, agora, recuperadas, o corpo mudou e se sentem bem".
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