Influencer marxista e ecofeminista: conheça a youtuber Sabrina Fernandes
Marxista, vegana e ecofeminista, a influenciadora digital Sabrina Fernandes é uma referência nas redes sociais por tornar mais acessíveis verbetes complexos da teoria política, como práxis, materialismo histórico e liberalismo. Com doutorado em Sociologia e especialização em Economia Política pela Carleton University, no Canadá, ela optou pelo caminho da produção de conteúdo na internet ao se ver desempregada.
Com tempo livre e vontade de disseminar conhecimento, Sabrina reparou que os canais de direita dominavam o YouTube e decidiu criar o seu em 2017. Hoje, tem 400 mil inscritos no canal Tese Onze, "focado em apresentar contrapontos ao senso comum, trazer análises sobre sociologia e política e acumular bagagem para transformar o mundo", segundo a própria descrição na plataforma.
Somando Instagram e Twitter, tem outros 600 mil seguidores. "Acredito que a gente precisa levar o debate para outros espaços. Não adianta só fazer textão no Facebook. Não adianta só artigo acadêmico", diz a pesquisadora, que tem dois livros publicados: "Sintomas Mórbidos: a Encruzilhada da Esquerda Brasileira" (ed. Autonomia Literária) e "Se Quiser Mudar o Mundo: um Guia Político para Quem se Importa" ( ed. Planeta).
"Na esquerda, me chamam de youtuber de forma pejorativa"
Para Sabrina, a importância da divulgação do conhecimento nas redes sociais ainda é ignorada pela esquerda. "Geralmente as pessoas que estão fazendo este trabalho são mulheres, negras, trans e LGBTs no geral, que já sofrem outros preconceitos. Chamam a gente de 'youtubers' de uma forma pejorativa", diz. "Comigo sempre vem uma misoginia carregada. Isso porque eu sou mulher branca, se fosse negra já viria racismo por cima."
O contato com a produção de conteúdo melhorou a didática da professora e a tornou uma pesquisadora melhor, diz. "É um trabalho que me coloca em debate todos os dias com as pessoas a quem estou me expondo a certas discussões e vai aumentando minha sensibilidade. Vejo que tenho que pesquisar determinado assunto ou aprender a explicar outro de forma diferente para alcançar mais pessoas."
Trabalhar com internet, no entanto, também veio com ondas de ataques. Em um post em que ela aborda o conceito de "racismo ambiental", há dezenas de críticas ao conteúdo e à própria autora das publicações. "A pauta ecológica no geral gera incômodo porque atrapalha visões relacionadas ao desenvolvimento, onde se pode tirar lucro da apropriação do território", diz Fernandes.
Justiça climática e gênero
Há algum tempo, Sabrina passou a levantar também a bandeira da emergência climática e, nesse debate, faz questão de assumir um lado. "Falar de justiça climática é uma maneira de realmente reconhecer que existem desigualdades nesse processo. Tem povos que não contribuíram quase nada para o que está acontecendo hoje em relação à crise, mas são os mais afetados e os mais vulneráveis" diz ela, que segue o ecofeminismo, movimento que relaciona a dominação sobre a natureza com a opressão às mulheres.
Em novembro do ano passado, Sabrina esteve nas ruas de Glasgow, na Escócia, nos protestos por Justiça Climática durante a COP26, a Conferência do Clima da ONU (Organização das Nações Unidas). O número de mulheres liderando as manifestações e conduzindo debates chamou sua atenção. Ela sentencia: a pauta ambiental também é uma questão de gênero.
"A liderança feminina fica visível. Percebemos isso no cotidiano: quem está organizando as coisas, está falando e trazendo os debates mais aguçados são mulheres. Hoje em dia, cidadãs do sul global estão falando desde a periferia de um sistema afetado pela lógica de desenvolvimento capitalista."
Ela relembra que o cuidado, historicamente, é atribuído às mulheres, o que ajudaria a explicar o vínculo entre a pauta ambiental e a de gênero.
"Quando o calo aperta, quando a gente olha para as enchentes, para secas, para as queimadas, são as mulheres as mais ligadas às questões ambientais e aos cuidados de sua comunidade", diz.
"Não que elas sejam melhores cuidadoras, que é o que tentam contar, mas como o cuidado foi relegado a nós, acabamos tendo uma sensibilidade quase que obrigatória para olhar para essa relação ecológica."
Esse recorte de gênero para diversas temáticas atrai para a socióloga críticas de "identitarismo", termo que se refere a decisões e posições políticas baseadas em interesses de determinados grupos sociais. Mas ela rebate: o uso da palavra é voltado para enfraquecer as lutas sociais.
"O termo raramente é utilizado de uma forma propositiva e é geralmente usado para diminuir a potência e o valor dos movimentos, para falar que eles estão atrapalhando -- na esquerda e na direita", explica.
"Como se não fosse possível compreender que, quando há uma reforma da Previdência, por exemplo, ela afeta negativamente a vida de mulheres negras de forma diferente da de homens brancos. Apontar isso não é dividir, não é fragmentar. É ter uma compreensão muito mais aguçada da realidade."
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