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Mulheres contam por que preferem sexo casual: 'Sem rodeios'

"Revi meus valores e percebi que poderia querer só sexo", diz Giovana* - Getty Images/iStockphoto
"Revi meus valores e percebi que poderia querer só sexo", diz Giovana* Imagem: Getty Images/iStockphoto

Tainá Goulart

Colaboração para Universa

05/02/2022 04h00

"É uma energia tão grande que gasto com os 'rodeios', 'cortejos', que comecei a refletir sobre sexo casual. Prefiro falar a real: só quero transar. E de vez em quando, se o cara for legal, ter um dia ou um fim de semana de casalzinho", relata Giovana*, 30, que prefere não se identificar.

Ela, que trabalha na área de eventos, diz que perdeu a conta de quantos aplicativos de paquera já baixou. "Antigamente, tinha esperança de encontrar um namorado e ter um relacionamento estável. Porém, na pandemia, a gente foi forçada a parar e refletir sobre o futuro. Nesse processo, revi meus valores, a maneira como eu enxergava meu poder de escolha dentro desse jogo. Entendi que poderia escolher só o sexo casual e que isso não acabaria com os meus planos de encontrar um companheiro e ser mãe, por exemplo."

Giovana* diz que, a partir da mudança de pensamento, se viu como uma nova mulher, mais conectada com seus desejos sexuais. "Agora, prefiro ser mais direta e, se rolar algo depois, é um bônus", afirma.

Ela diz, ainda, que até seus critérios para escolher com quem vai apenas transar mudaram. "Se o cara começa a sumir por um tempo ou fala alguma coisa que não me agrada tanto, já está fora. Preciso estar bem para me satisfazer sexualmente", fala ela.

"Quando percebo que o cara quer namorar, já espanto"

A veterinária Nicole Azevedo foi casada por oito anos e, depois do divórcio, namorou duas vezes. No entanto, se sentiu cansada de relacionamentos sérios. "Fiquei de saco cheio desse vai e vem e costumo brincar que me casei com a minha profissão. Porém, sinto falta do sexo e, há uns oito meses, entrei para os aplicativos de relacionamentos em busca dos 'contatinhos', caras legais para transar e trocar uma ideia", afirma ela.

Nicole diz que não quer um compromisso agora, até mesmo por causa da profissão, que conta com longos plantões noturnos. "Minha rotina é maluca, e eu abraço isso. Meu trabalho tem uma enorme importância, ainda mais com tudo que construí. Quando estou mais tranquila, aproveito para ver se tem alguém legal para transar nos aplicativos. Porém, quando percebo que o cara quer namorar, eu já espanto", enfatiza.

Segundo conclusões do artigo "Settling Down: Romance in the Era of Gen Z" (ou "Constituindo Família: o Romance na Era da Geração Z", em tradução livre), publicado no jornal universitário Yale Daily News em fevereiro de 2020, as gerações mais novas não estão procurando a estabilidade de uma relação. Segundo o estudo, a geração Z, nascida entre 1995 e 2010, tende a levar mais tempo para se casar, pois preferem aproveitar a vida antes. É como se a relação romântica sempre se apresentasse cercada de limitações, especialmente para as mulheres, que lutam incansavelmente por sua liberdade em diversos setores sociais.

Incômodo do outro lado e o longo caminho até a igualdade

Alguns homens têm notado esse perfil de mulheres que preferem relações casuais e admite: há um desconforto no ar. "Acho importante abrir o diálogo. Existe um histórico imenso de machismo e outras atitudes tenebrosas que a maioria dos homens comete. Porém, em qualquer situação, seja um sexo casual ou um relacionamento sério, penso que precisamos ser mais transparentes. Estamos falando de responsabilidade emocional para os dois lados", diz João*, 32, que prefere não se identificar.

A psicóloga Gabriela Cabral não acredita que as mulheres estejam caminhando rumo a uma trilha de igualdade com os homens no que diz respeito a uma abertura para o sexo. "No geral, aprendemos a ter medo de sexo e entendemos que a expressão da própria sexualidade pode acabar com a vida da mulher caso engravide. Não nos é fornecida informação de qualidade a respeito do prazer feminino e do funcionamento do nosso corpo nem é dada atenção suficiente aos aspectos psicossociais de uma vida sexual ativa", expõe a psicóloga.

Em suma, apenas quando as mulheres tiverem a oportunidade de colocar suas condições de maneira consciente, bem informadas, priorizando sua saúde física, mental e sexual, expressando seus limites sem se preocupar em desagradar o próximo, é que será possível falar em liberdade sexual.

"Mulheres já se permitem viver de acordo com seus desejos", diz ginecologista

Para ele, o ginecologista Mauricio Abrão, o autoconhecimento mental e corporal, além do empoderamento das mulheres e as conquistas feministas, têm forte conexão com o aumento do desejo e com as descobertas sexuais. "Não é só a questão hormonal que está em jogo, mas o momento emocional. Por isso, é importante esse olhar global para a saúde feminina", sintetiza.

"Hoje, falar abertamente sobre libido, masturbação, prazer, é muito mais comum do que há alguns anos, e isso pode ser considerado uma conquista. A mulher aprendeu e está aprendendo a se conhecer, conhecer o seu corpo, saber o que faz bem, saber o que ela quer na cama e dizer ao seu parceiro ou parceira", diz Abrão.

"Ela já se permite viver de acordo com os seus desejos, suas fantasias. Tudo isso é muito saudável para o corpo, a mente e a autoestima."

Novos arranjos para os relacionamentos

Para Gabriela Cabral, psicóloga clínica e mestre em Sociologia com ênfase em Antropologia pela UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), os depoimentos acima, sobre a busca por relações mais casuais em aplicativos, ilustram uma tendência de aumento desse tipo de comportamento. E há uma ligação direta com o maior uso de tecnologias. "Vemos muitas pessoas que encontraram novas formas de se relacionar afetiva e sexualmente, que extrapolam a noção de monogamia”, ressalta.

"O uso dos aplicativos de relacionamento tem tudo para continuar expandindo e criando propostas das mais diversas", afirma. "Atribuo isso a um modelo de negócio que está trabalhando e explorando essa multiplicidade de composições possíveis entre sexualidade e tecnologia e a curiosidade e desejo dos usuários de forma ampla."

*Os nomes foram alterados a pedido dos entrevistados