'Quase morri com chá emagrecedor; hoje, aceito minha barriga e a cicatriz'
"Eu nunca fui muito noiada com meu corpo; sempre tive uma forma física mais ou menos atlética, desde criança pratiquei esportes, basquete, vôlei, natação. Minha vida sempre foi dentro de quadra e, na faculdade, (sou formada em direito) recebi até bolsa de atleta.
Na vida adulta, não parei. Continuei jogando basquete e passei a fazer crossfit. Só que uma parte do meu corpo me incomodava: a barriga. De vez em quando, fazia dieta, mas ela não diminuía.
Em 2019, tinha dois casamentos para ir na mesma semana e queria dar uma secada rápida para 'ficar melhor nos vestidos'. Na época, uma amiga tinha passado em um nutrólogo, que prescreveu um medicamento para emagrecer. Feito sob medida para o corpo dela, tinha a indicação de ingerir as pílulas antes das principais refeições.
Sem achar que corria algum risco, peguei a mesma receita e pedi para manipular o complexo para mim. Tomei a medicação por 20 dias — e olha que, às vezes, esquecia no almoço ou no jantar. Cerca de um mês depois que parei de tomar, comecei a passar mal.
O diagnóstico
O primeiro sintoma foi o enjoo. Cheguei a fazer teste para saber se estava grávida, mas o resultado deu negativo. Fui a um gastro e ele pediu alguns exames de sangue. E vi que minhas taxas de gordura no fígado estavam fora do normal.
No começo, deu apenas que meu órgão estava inflamado, nada que fosse uma alteração muito grande. Só que eu comecei a piorar... Minha pele ficou amarelada (por causa da icterícia), meu xixi estava escuro, tinha episódios de confusão mental e tremedeira.
Durante um mês fiquei passando mal. Cheguei a desmaiar porque a amônia não estava sendo filtrada pelo meu fígado e ia direto para o cérebro. Fui internada duas vezes até que os médicos decidiram que eu precisava fazer um transplante de fígado
No dia 12 de junho de 2019, realizei a cirurgia que mudou minha vida. Os médicos achavam que eu tinha alguma doença autoimune e só confirmaram que era hepatite medicamentosa depois da biópsia feita no órgão. Provavelmente, a infecção foi causada por dois componentes do "medicamento emagrecedor" receitado por aquele nutrólogo: maca peruana e orlistate. O mais curioso é que minha amiga nunca nem passou mal.
Renasci depois da operação
Depois da cirurgia, fiquei na UTI em observação por um dia, depois fui para o quarto, onde permaneci por nove dias internada. Após o procedimento, sofri uma pequena intercorrência e ainda precisei operar novamente por causa de uma obstrução das vias biliares.
Só comecei a melhorar quatro meses depois da segunda operação. Quando descobri que tive hepatite por causa da medicação, bateu a culpa. Antes do remédio, eu nunca feito qualquer cirurgia. Ficava me questionando porque tinha tomado aquilo. Ficar na fila de espera para um transplante é angustiante.
Mas eu não medi os riscos quando comecei a tomar o remédio para emagrecer. Como a receita tinha sido prescrita por um médico, não vi problemas. As pessoas acham que por ser uma coisa natural, como o chá, não vai dar em nada. É complicado.
No hospital, antes do transplante, em vários momentos pensei que ia morrer. Mas o medo maior depois da cirurgia — achava que nunca mais voltaria a ter a vida de antes.
Até hoje tomo medicamento para cuidar do órgão transplantado e, provavelmente, terei que tomar para o resto da vida. Minha alimentação também mudou, não posso beber álcool, tomar suplemento alimentar, chá e remédio só em último caso.
"Não ligo tanto para a aparência"
Com toda essa situação, passei a ter uma nova visão do meu corpo. Por uma besteira tão grande, quase morri. Hoje, não ligo muito para a aparência física. Continuo me cuidando, mas prezo pela saúde. Preciso ter uma vida saudável para que o órgão continue funcionando.
Tive que mudar minha rotina por causa do novo fígado, porém, já voltei a praticar atividades físicas, ano passado fui campeã em um torneio de basquete e também me casei.
Tenho uma cicatriz do transplante bem na barriga. Não tenho vergonha de mostrá-la, eu amo essa marca. É um sinal de que um milagre aconteceu na minha vida e que, apesar de tudo, estou viva.
Hoje em dia já não tenho tanto incomodo por ter uma barriga maior, não deixo de usar biquínis por causa da cicatriz e olha que antigamente escondia essa parte do corpo, não usava cropped.
Falo muito para outras mulheres sobre os riscos de tomar medicamento para emagrecer. Com a morte da Edmara (que faleceu na última semana por causa de uma hepatite fulminante também causada por medicamentos para emagrecer), um filme se passou na minha cabeça. Ela não sobreviveu para contar a própria história.
Nós, mulheres, tentamos alcançar padrões de beleza e esquecemos dos limites do nosso corpo. Nas redes sociais as pessoas ostentam barrigas chapadas, lisas, "tanquinho" e, por julgar esse padrão como o ideal, você se submete a loucuras para tentar alcançar uma igual. E, muitas vezes, pode ser fatal".
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