Número de casamentos cresce mais de 20% na pandemia: 'Amor é nossa força'
A festa foi menor, os convidados, poucos, e as noivas estavam de máscara. Mas o casamento da assessora de investimento Samara Tavares, 27, com a professora universitária Paula Davies Rezende, 38, ilustra uma tendência no amor: de 2020 para 2021, cresceu o número de pessoas que se juntaram perante o juiz do cartório e disseram "sim" à vida a dois.
Segundo a Associação Nacional dos Registradores de Pessoas Naturais (Arpen-Brasil), o aumento foi de 21% de um ano para o outro; entre casais homoafetivos, 31%. "Quisemos ser parte dessa estatística do bem, em tempos de um governo tão agressivo com as minorias e os grupos minorizados", diz Paula.
O amor também transbordou a vida do casal de aposentados Cenira Pinheiro Almeida, 74, e Humberto Soares Souza, 78. Os dois têm uma história antiga, já casaram várias vezes, mas reafirmaram a parceria em uma cerimônia da umbanda, neste ano. "O amor é tudo, nossa força e, nesses tempos, a gente tem que ter algo a se apegar".
Para os engenheiros Mariana Gaspari e João Vitor Peu, de 39 e 40 anos, a convivência provocada pelo isolamento mostrou que fazer bem um ao outro era o caminho natural para a relação; em junho de 2021, também resolveram oficializar a união.
A seguir, os casais contam como a união em meio a pandemia fortaleceu ainda mais os laços e deu coragem para seguir lutando pelo amor.
Casamentos crescem na pandemia: leia histórias
O primeiro encontro entre Samara e Paula, em 2018, tinha pouco de romantismo: as duas estavam se relacionando com outras pessoas, e dividiram mesa em um bar enquanto assistiam um jogo de futebol. Solteiras, continuaram mantendo contato por redes sociais. Um "curtir" aqui, uma reação a Stories ali... Resolveram marcar uma saída para se conhecerem.
O namoro deslanchou e o noivado aconteceu em fevereiro de 2020, pouco antes da pandemia. O plano de fazer uma grande festa para celebrar o enlace ficou suspenso. Até o início de 2022. "Pensamos principalmente nos direitos. Se acontecesse algo comigo ou com ela, de saúde, queríamos ter um vínculo perante a lei para ficar tudo certo", diz Samara. Paula diz que o aumento entre casamentos LGBTQIA+, registrado, inclusive, após a confirmação de Jair Bolsonaro (PL) na presidência da República, forma uma "estatística do bem".
Segundo as noivas, a união foi simples, só com a presença dos familiares, seguida de um churrasquinho no salão de festa do prédio em que moram, em São Paulo. "No cartório, foi uma sensação indescritível. E ainda bem que não passamos por nenhuma questão de lesbofobia; ninguém nos perguntou 'onde estava o marido', por exemplo. Mas, a questão não é igual em todos os lugares. Passamos a lua de mel em uma cidadezinha na Bahia, e um casal de mulheres não sabia que poderia não só ter união estável, mas também se casar no civil".
Vale dizer que a união estável entre pessoas do mesmo sexo é reconhecida desde 2011 no Brasil; o casamento homoafetivo foi reconhecido em 2013 pelo Conselho Nacional de Justiça. Nos últimos 11 anos, mais de 21 mil casais homoafetivos registraram uma união estável no Brasil, e outros 54 mil se casaram, segundo levantamento feito com exclusividade para Universa pela Anoreg (Associação dos Notários e Registradores do Brasil).
"Cinco meses na pandemia equivalem a cinco anos de casados"
Para o casal de engenheiros que atuam na área de tecnologia Mariana e João, o cotidiano de trabalho remoto foi o ingrediente que os fez pensar em casamento, oficializado em junho do ano passado no cartório e com uma celebração pequena na praia da cidade de Bombinhas, em Santa Catarina.
Os dois se conheceram no final de 2019. Segundo a noiva, a curtição na rua e na "despedida" do Carnaval, em 2020, antes de a pandemia começar, já havia mostrado o quanto o casal estava em sintonia. Mas foi quando passaram a conviver mais, na casa dela, que João e Mari descobriram que a ideia do casamento seria natural para a vida a dois.
Morava em Campinas, João pegou uma mochilinha para passar os 15 dias iniciais da pandemia comigo... E fomos ficando juntos. Depois, resolvemos ficar alguns meses em Bombinhas, de home office. Na cidade, pensamos: por que não aproveitar e nos casarmos neste lugar maravilhoso?
"Tínhamos muita afinidade na convivência, respeito. E o isolamento nos inspirou a nos casar, porque fez sentido ter essa experiência", diz o engenheiro. "Brinco com ele que cinco meses juntos na pandemia parecem que são cinco anos de casado. Foi muito intenso, 24 horas por dia, e isso fez muito bem aos dois", acrescenta Mariana.
Em junho do ano passado, os dois chamaram apenas os pais para presenciarem o casamento civil e a celebração na beira da praia. Os amigos, que estariam presente se fosse em fora dos tempos pandêmicos, acompanharam a alegria da nova família por transmissão de vídeo. João e Mari, agora, moram em São Paulo e já celebram mais uma felicidade: eles estão esperando um bebê.
Uma promessa de saúde e mais um casamento
Já a história de Cenira e Humberto é marcada por "casamento em cima de casamento", brinca a aposentada. E o casamento deste ano tem a ver com a saúde do noivo. Humberto precisou se internar no hospital para fazer a troca de um marcapasso no ano passado mas, com medo de contrair coronavírus, ficou com medo de morrer. Cenira fez a promessa de que, "se ele saísse dessa", os dois fariam mais um casamento, desta vez, na umbanda.
"Ele achava que iria morrer, mas voltou lindo e maravilhoso", celebra Cenira. O casal, então, escolheu o sítio de uma das filhas para celebrar a união. Detalhe: pela terceira vez.
"Nos casamos em 1969, no cartório. Depois, numa excursão, visitamos uma igreja católica e tivemos a ideia de comprar alianças para o padre abençoar. Só que nos separamos por 38 anos, com divórcio e tudo. Até que em 2011 nos reencontramos, ele começou a me ajudar na minha casa de umbanda e fomos ficando...".
O casamento, há um mês, teve música e os noivos passando sob um túnel de espadas-de-são-jorge feito pelos convidados. Todos estavam com a carteira de vacinação contra covid em dia.
"Tivemos todo cuidado, ninguém aglomerou. E também não abraçamos ou estivemos junto das pessoas o quanto gostaríamos", comenta Humberto. "Mas foi bom, foi mais emocionante do que o primeiro. E quero fazer outro, maior".
Para Cenira, a cerimônia foi também momento de se reconectar com a própria crença e de confiar no amor como uma força para os dois seguirem unidos. "Minha casa continua fechada, estou fazendo só alguns atendimentos pontuais como mãe de santo. Então, é bom ter algo para se apegar e ter suporte."
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