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Brasileira morta em Bariloche: irmão soube do crime pelo Facebook

Eduarda dos Santos Almeida foi assassinada a tiros, em Bariloche - Reprodução / Facebook
Eduarda dos Santos Almeida foi assassinada a tiros, em Bariloche Imagem: Reprodução / Facebook

Leonardo Coelho

Colaboração para Universa, do Rio de Janeiro

22/02/2022 04h00

Na última quarta-feira (16), ao abrir a mensagem de um desconhecido no Facebook, Wallace Santos Oliveira, 30 anos, descobriu que sua irmã, Eduarda dos Santos Almeida, 27 anos, tinha sido assassinada em Bariloche, na Argentina.

No link enviado a ele, reportagem de um jornal local noticiava o caso da brasileira atingida por nove tiros. "Minha mão começou a entortar, e eu desmaiei. Foi um choque, eu tinha falado com ela dois dias antes", revela. "Ela dizia que estava para voltar ao Brasil, nós rimos, foi uma conversa agradável."

O caso está sendo reportado tanto na Justiça quanto na mídia local como feminicídio, graças às características e à confissão do assassino: o também brasileiro Fernando Alves, 26 anos. O país reportou um crime desse tipo a cada 26 horas no primeiro semestre de 2021. O criminoso pode ser condenado a prisão perpétua.

A relação entre Eduarda e Fernando teria se estreitado quando ele a procurou em busca de uma barriga solidária —espécie de barriga de aluguel, mas sem contrapartida financeira. Eduarda, então, deu à luz gêmeos —além de outros quatro filhos, três que vivem no Brasil e um caçula nascido na Argentina.

Ainda chocado com o brutal assassinato da irmã, Wallace conversou com Universa por telefone, ao lado da mãe de Eduarda, Maria dos Santos, e da avó paterna, Eronilda dos Santos. A família contou que ela era boa aluna na infância e na juventude em Angra dos Reis (RJ) e se transformou, segundo eles, em uma mulher comunicativa e que não tinha raiva de ninguém.

"Não existia tempo ruim para ela", comentou a mãe, apontando a energia positiva e a coragem de não depender de ninguém que Eduarda tinha.

Infelizmente, a vida dela foi interrompida por alguém a quem não tenho nem palavras para adjetivar porque não cabe a mim fazer isso.

Psicólogo do Ministério Público Estadual em Volta Redonda (RJ) há anos, Wallace falou, ainda com a voz embargada, sobre a relação próxima que tinha com a irmã. "Em 27 anos, ela nunca me chamou pelo meu nome. Era sempre irmão."

Ela era minha melhor amiga, minha companheirinha. Pode parecer démodé, mas era isso. Ela era meu arroz com feijão, a gente se completava.

Barriga solidária

Eduarda passava temporadas em Bariloche trabalhando em um hotel, mas voltava para ficar parte do ano em Angra dos Reis, onde atuava como marinheira civil e estava focada em continuar a faculdade de administração. Segundo Wallace, foi Fernando, o assassino confesso, quem primeiro fez a ponte dela com o trabalho na Argentina.

Eduarda Almeida com o irmão, Wallace - Reprodução / Facebook - Reprodução / Facebook
Eduarda Almeida com o irmão, Wallace
Imagem: Reprodução / Facebook

"Ele era de Angra dos Reis também. Éramos amigos virtuais, nossas famílias se conheciam, e ele já trabalhava no hotel junto ao marido, um argentino chamado Marcelo, que era mais velho e já morreu", diz Wallace, afirmando que a família sabia da barriga solidária. "Tínhamos orgulho dela por isso."

Nascidos em 2019, o casal de gêmeos estava sob a tutela de Fernando e Marcelo na Argentina, ainda que Eduarda aparecesse nos documentos como progenitora. A jovem teve ainda outra filha em outubro passado, mas sem relação com nenhum deles. O pai biológico não assumiu a criança, e Fernando pediu para ser colocado como pai na documentação da criança. Eduarda concordou.

Um amigo de Fernando com quem Universa conversou, Marcelo Anselmo, disse que não falava com ele havia anos e que sabia apenas que tinha tido filhos. "Não consigo entender o motivo que o levou a isso. Estou descobrindo muita coisa só agora."

O crime

Segundo a imprensa argentina, que tem repercutido bastante o caso, Eduarda foi assassinada com nove tiros em uma área turística de Bariloche. Em audiência realizada na última sexta-feira (18), Fernando confessou o crime.

"Gostaria de receber apoio psicológico e me declaro culpado pela morte de Eduarda Santos. Sou responsável. Não planejei, mas tive a opção, considerando que minha vida estava em perigo. Desculpe, mas minha vida veio em primeiro lugar", afirmou Fernando, segundo o jornal argentino "Diário do Rio Negro", contrariando a própria defesa, que havia dito que ele não testemunharia.

Segundo os promotores, houve premeditação no assassinato e, por isso, foi pedido que ele fosse considerado "autor de feminicídio e homicídio qualificado, por ter sido cometido com intento prévio e com arma de fogo". Na ação, a brasileira é definida como "uma estrangeira que morava em Bariloche, mãe de um bebê e que não tinha família nem emprego". Os promotores chegaram a comentar que o Ministério Público argentino teve dificuldade em contatar alguém que a conhecesse.

A frieza do assassino incomodou os policiais argentinos que, segundo Wallace, estão começando a estranhar a morte do marido, no ano passado —o motivo oficial foi infarto. O jornal argentino "Clarin", porém, afirmou que Marcelo teria cometido suicídio, o que também não foi comprovado.

O mesmo jornal chegou a publicar que Eduarda era prostituta e comercializava drogas. A família negou.

O Juiz de Garantias Sergio Pichetto determinou a abertura de um inquérito, com prazo de quatro meses, e decretou a prisão preventiva do acusado para evitar risco de fuga e obstrução da investigação. Essa situação pode atrapalhar o traslado do corpo para o Brasil e a transferência de tutela das crianças, que estão sob guarda da SENAF (Secretaría Nacional de Niñez, Adolescencia y Familia).

"Neste momento, o corpo da minha irmã faz parte de um processo criminal, então precisa de uma autorização do juiz para a transferência", comentou Wallace. "No caso da filha mais nova, achamos que é possível que seja mais fácil essa liberação. Mas quanto aos gêmeos, seria necessário conversar com a família remanescente do Marcelo na Argentina."

Wallace disse à reportagem que iria hoje para a Argentina para iniciar os trâmites burocráticos junto ao consulado brasileiro e um advogado argentino. A família organizou uma vaquinha via pix, já que precisa de cerca de R$ 20 mil para o traslado. "Falta mais da metade desse valor", disse a mãe de Eduarda.

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