Estudante que perdeu pais por covid tem bolsa negada pela universidade
Uma aluna de arquitetura da faculdade Mackenzie de São Paulo teve uma bolsa integral negada pela universidade e denuncia o que considera "uma falta de sensibilidade". Isso porque Lívia Nascimento, 22 anos, perdeu pai e mãe para a covid-19 e ficou sem recursos para custear os 16 últimos meses do curso. Lívia Nascimento, atualmente no 8º semestre, conta que ingressou na instituição de ensino superior em 2018, mas sofreu um baque emocional e financeiro em 2021, com a morte dos pais.
A Universa, a jovem explicou que solicitou a bolsa integral assim que perdeu os pais, uma vez que não tinha renda à época e a universidade era paga por seus responsáveis. "Meu pai era policial civil e minha mãe, comerciante. Batalharam muito para conseguir pagar meus estudos. Minha mãe faleceu em março de 2021 e, em julho, meu pai. Quando meu pai faleceu, eu tentei a bolsa", conta.
Num primeiro momento, Lívia conseguiu uma bolsa parcial: "Entrei em contato com tudo quanto é gente do Mackenzie, mas o máximo que conseguiriam foi 30%. A mensalidade é muito cara: R$ 3.821. No fim do semestre, pude entrar com a solicitação oficial da bolsa, a qual foi negada e agora eu não tinha mais nem os 30%", diz a universitária.
Sem o auxílio, Lívia fez um esforço para continuar com os estudos. Logo que os pais morreram, ela conseguiu reunir alguns recursos financeiros, como restituição do Imposto Renda e auxílio funeral, além de conseguir vender alguns itens pessoais. Essa manobra permitiu o pagamento das parcelas.
"Hoje em dia, eu trabalho, mas meu salário é menos da metade da mensalidade. Agora, realmente não tenho mais nenhum auxílio, apenas meu salário. E ainda sustento minha irmã, que está desempregada, e meu sobrinho"
Vaquinha online
A jovem se viu sem alternativas e buscou sensibilizar as pessoas com uma vaquinha online. No texto, ela explica que tentou a bolsa e um financiamento bancário, mas que não deu certo. Os cálculos apontam que a jovem precisaria de ao menos R$ 62 mil para concluir os 16 meses que faltam.
No pedido de ajuda, Lívia conta que, mesmo com as comprovações de tudo que ocorreu, todos os documentos possíveis, extratos de todas as contas, com bom histórico acadêmico, a bolsa foi negada pela instituição por "desenquadramento socioeconômico".
"Eu criei muita esperança em relação à bolsa. Que tudo iria se resolver, que eu conseguiria terminar a faculdade. Quando negaram, eu senti que jogaram um balde de água fria na minha cabeça, senti que meu sonho estava acabando, que todo o esforço que meus pais tinham feito para pagar até aquele momento tinha sido completamente em vão. Pior que agora, por já estar no fim da faculdade, também não consigo fazer transferência para outra. Teria que começar do zero, por isso surgiu a vaquinha", ressaltou.
Universa procurou a Universidade Presbiteriana Mackenzie. Em nota, a instituição disse que todos os pedidos de bolsas são analisados individualmente e "com o entendimento aprofundado sobre a situação do aluno a fim de que orientemos sobre o levantamento dos documentos comprobatórios de cada caso".
O Mackenzie explicou ainda que os critérios para concessão de bolsas filantrópicas de 100% são estabelecidos pelo MEC (Ministério da Educação), e que para se encaixar no perfil, o grupo familiar deverá comprovar renda per capita de até 1,5 salário mínimo para a bolsa de estudo integral ou renda familiar per capita de até três salários-mínimos para a elegibilidade à bolsa de estudo parcial de 50%.
Especificamente sobre o caso de Lívia Nascimento, a universidade alegou que, "pela falta de apresentação de todos os documentos solicitados para o trâmite, a estudante em questão não teve a concessão da bolsa citada", mas que segue contato com a estudante e reavaliando os documentos apresentados em busca de auxiliá-la a conseguir as documentações complementares.
Lei, bom senso ou sensibilidade?
Bruno Maia de Lacerda, advogado do consumidor, foi taxativo ao explicar que legalmente a instituição de ensino não tem obrigação de conceder bolsas cuja solicitação não cumpra os critérios exigidos. No entanto, o advogado destacou que, em um caso tão específico quanto o de Lívia, a bolsa poderia ter sido concedida por "liberalidade". E que nesses casos, a direção das unidades de ensino pode ser mais sensível ao drama que o estudante enfrenta.
"Claro que legalmente não há essa obrigatoriedade. Mas vamos falar de bom senso. Depois de tantas parcelas pagas integralmente, a um custo tão elevado, e restando apenas um valor ínfimo, quando comparado ao grupo de parcelas quitado, um pouco de sensibilidade levaria a faculdade a conceder a bolsa por liberalidade. Que é quando alguém ou alguma instituição decide ceder algo sem que haja uma obrigação legal", afirma.
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