Mariana Kotscho estreia em Universa: 'Mães são julgadas por todos os lados'
"Minha missão é dividir as dores, as angústias e as alegrias da vida materna com base no que eu vivo como mãe e também no que aprendi ao longo de todos esses anos", afirma a jornalista Mariana Kotscho, que estreia neste domingo (27) em Universa com uma coluna sobre maternidade. Ela é mãe de Laura, 18 anos, Isabel, 16 e André, 14.
Aos 48 anos, ela acumula um extenso currículo como jornalista - foram anos como repórter de televisão, com passagens pelos canais SBT, Record, GloboNews e Globo, onde atualmente faz participações quinzenais no quadro "Bem-Estar", dentro do programa "É de Casa".
Mariana sempre teve como sonho trabalhar na TV e, já durante a faculdade, entrou no meio. Mas carregava um outro sonho: ser mãe. "Sempre tive o sonho de ser mãe e de ser repórter também. Quando tive minha primeira filha, entendi que conciliar as duas coisas seria difícil. Eu sempre gostei de ser repórter de rua e esse profissional não tem rotina - não tem horário fixo para trabalhar, faz muito plantão, tem escalas de fim de semana. Tive três filhos, um atrás do outro - quando voltei da licença maternidade da minha segunda filha, já estava grávida do terceiro. Então comecei a viver esse conflito que muitas mulheres vivem: carreira X maternidade", conta.
Para a jornalista, que estava no auge da carreira e trabalhando bastante, essa falta de rotina começou a pesar. "Eu tinha três bebês em casa e nunca estava num lugar fixo, cada dia era num bairro da cidade, o que também atrapalhava. Foi ficando cada vez mais difícil e me vi obrigada a tomar uma decisão. Pedi demissão. Acho que cada um tem que seguir seu coração."
Mariana sentiu na pele como as mães são julgadas, não importam suas decisões. "Há julgamento de todos os lados: se você decide continuar no trabalho, é péssima mãe; se pede demissão, é péssima profissional", analisa. Mesmo assim, resolveu o que estava sentindo. "Vivia angustiada, queria estar mais presente na vida deles. Ao mesmo tempo, não podia jogar tudo para o alto. Afinal, com três filhos, a conta é sempre alta. E nem queria abandonar a profissão, era algo que eu gostava muito. Como conciliar tudo isso era minha maior questão", assume.
Um novo rumo
Já afastada do dia a dia como repórter, Mariana começou a elaborar um programa de TV que falasse sobre maternidade - um assunto com o qual já estava completamente envolvida e tinha interesse em aprender e estudar cada vez mais. Nesse meio tempo, trabalhou como freelancer no SBT, em uma rotina mais tranquila, e seguiu atuando no desenvolvimento desse programa ao lado de Roberta Manreza, sua amiga de infância e também jornalista.
A ideia da atração da dupla chegou à TV Brasil - que, na época, estava no início - e, pouco tempo depois, o "Papo de Mãe" estreava na TV aberta, sob o comando de Mariana e Roberta. "Não tinha e acredito que não tenha até hoje na TV brasileira um programa que fale sobre a criação dos filhos em todas as idades e, especialmente, considerando a realidade brasileira. Eu via na TV, em canais pagos, alguns programas sobre maternidade, mas eram muito diferentes - outro cenário econômico, cultural, social. E achei muito legal termos sido chamadas por uma TV pública, porque assim conseguiria dar a cara de Brasil que eu queria para o programa. Não queria conversar com a elite. Podíamos falar, sim, de babás, mas também de babás que são mães e largam seus filhos em casa para poder trabalhar".
Após sete anos na TV Brasil, o programa migrou para a TV Cultura, onde ficou por mais quatro, aproximadamente. "Quando o assunto é maternidade, existe uma carência de informação de qualidade. Não é qualquer pessoa que é mãe que pode sair dando palpite. Eu ouço cada absurdo! E vindo de pessoas que se dizem especialistas, ainda por cima. Eu trabalho com isso há 12 anos. Entrevistei muita gente e adquiri muita informação. Meu objetivo é fazer jornalismo de verdade, sempre foi. E sem ditar regras.
Ao longo do tempo, entendi que dá para abordar todo tipo de assunto, inclusive aqueles que a TV está acostumada a tratar com desdém, preconceito e sensacionalismo. Se tratarmos de maneira respeitosa, conseguimos informar a população", analisa Mariana. "Sempre acreditei no jornalismo com essa função social, isto é, de informar, fazer com que as pessoas lutem pelos seus direitos. Quero tocar nas feridas, falar de todos os assuntos, com todas as mães", completa.
Com a pandemia, as gravações do "Papo de Mãe" foram suspensas. Em paralelo, o projeto segue nas redes sociais e com um site e, agora, com a coluna de Mariana em Universa.
Olhando para trás, a jornalista se orgulha de sua trajetória. "Eu consegui ser mãe e, ao mesmo tempo, continuei com a minha carreira. Acho que inventei o 'jornalismo materno'. Não larguei minha profissão, mas mudei o rumo dela. Nesses 12 anos, meus filhos foram crescendo - hoje, têm 18, 16 e 14 anos - e foi um processo muito legal. Sempre estive presente na vida deles. Digo que eles são mal acostumados porque almocei e jantei com eles todos os dias e não faltei em nenhuma reunião da escola.
Na rotina de repórter, me incomodava pensar nas coisas que eu iria perder. Passa muito rápido. Hoje, não me arrependo de nada. Tive muitos problemas no meio do caminho, claro, não é que deu tudo sempre certo. Continuo tendo que trabalhar muito - com três filhos, a demanda é infinita. Mas a vida é feita de opções. Não quero sair ditando regras e dizendo que todo mundo tem que fazer isso, mas eu aprendi que temos que seguir o que naquele momento faz sentido para nós".
Mariana afirma que não tomou a decisão por conta dos filhos e, sim, por ela mesma. "Eu me cobrava ser uma mãe presente, não queria terceirizar nada. Eu queria ser a melhor mãe possível - sei que a mãe perfeita não dá. E nem a profissional perfeita. A gente, como mulher, se cobra muito. Temos que entender nossos limites. Depois que os filhos crescem, podemos mudar de rumo de novo. O importante é seguir nosso coração, dentro das nossas possibilidades".
Mudanças nas famílias e na maternidade
Ao longo desses anos, Mariana acompanhou de perto algumas mudanças no comportamento das famílias. Entre elas, destaca: "Lá atrás, as mulheres falavam 'nossa, meu marido é tão bom, me ajuda muito, até troca fraldas'. Tinha muito essa mania de agradecer ao marido, como se ele estivesse fazendo um favor. Isso foi mudando. A gente falava muito disso no programa, sobre parar de dizer obrigada, porque assim parece que a obrigação é sempre da mãe. Quando o pai faz alguma tarefa, não é um favor. Sempre defendi falarmos em 'divisão', e não em 'ajuda'. As palavras têm poder e essa mudança faz toda a diferença. Acho que os próprios pais foram mudando também, entendendo que eles têm deveres e direitos em relação aos filhos".
Além disso, ela ressalta a principal "novidade" dessa geração, que é o surgimento e a consolidação da tecnologia, que avançou muito nos últimos anos. "Quando minha primeira filha nasceu não tinha smartphone, mas o irmão dela, quatro anos mais novo, já conviveu com isso muito mais de perto. O grande desafio dos pais hoje é tirar os filhos das telas. É claro que elas têm pontos positivos, mas trazem muita preocupação - tanto em relação ao tempo de tela quanto ao conteúdo que eles estão acessando ali. Tem que ter supervisão, não dá para simplesmente largar na mão da criança. Tudo isso traz resultado. Já temos inúmeros estudos que comprovam que as crianças estão mais ansiosas e apresentando mais casos de depressão, e isso tudo está profundamente ligado às redes sociais".
Mas Mariana entende que o desafio não é fácil e que para ela mesma o processo é difícil. "Na pandemia isso se agravou ainda mais. O único recurso deles para estarem com os amigos foi o celular. Por isso não falo sobre telas no sentido de julgar os pais, e sim para orientar, para refletirmos que o exagero não é bom. A longo prazo traz graves consequências para a saúde mental, afeta a criatividade, o desempenho na escola".
Para ela, o mais importante é querer melhorar sempre. "Pai e mãe precisa estudar, querer aprender para educar os filhos. Vamos tentar, errar muitas vezes, mas tem que querer aprender. Dentro de casa, a conversa precisa existir a todo momento. Falar pro seu filho ouvir e também escutar quando ele falar. O desafio é estabelecer esse diálogo desde a infância, e não esperar a adolescência".
Mariana diz que, no seu trabalho, sempre priorizou a diversidade. "Não é porque estamos falando com mães que devemos assumir que são todas iguais. As diferenças dentro do nosso país são enormes. Há mães que têm babás, rede de apoio, condições financeiras para dar tudo para os filhos. E outras que muitas vezes deixam de comer para dar comida para os filhos. Sempre priorizei dar voz para pessoas diferentes. Sei, por exemplo, que minha experiência como mãe de três crianças brancas nunca será igual a de uma mãe de uma criança negra. Jornalistas precisam falar com todos os públicos - de diferentes classes sociais, raças, etnias. Tem que ter essa diversidade de vozes e pontos de vista. Quando falamos de maternidade, precisa haver esse cuidado para não generalizar".
Violência doméstica
Para além da especialização em maternidade, Mariana também estuda muito sobre violência doméstica e é dona de um grupo no Facebook voltado para orientação e acolhimento que reúne mais de 6 mil vítimas. "É uma rede de apoio", define.
A aproximação com o tema se deu no início da sua carreira, quando morou no Ceará e conviveu de perto com Maria da Penha. "Foi um período em que evoluí muito, tanto profissional quanto pessoalmente. Hoje, sou voluntária do Instituto Maria da Penha e quero ajudar a curar essas feridas", conta. "A maioria das mulheres que sofre violência doméstica é mãe. E quando uma mãe sofre violência doméstica, os filhos sofrem junto. Quando uma mãe é assassinada, um filho fica órfão. Essas questões estão todas muito ligadas".
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