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Vereador do RS compara cérebro de prefeita a caroço de azeitona: 'Crime'

O vereador Enrique Civeira (PDT) minimizou ataque machista - Reprodução
O vereador Enrique Civeira (PDT) minimizou ataque machista Imagem: Reprodução

Franceli Stefani

Colaboração para Universa, de Porto Alegre

09/03/2022 13h57

Na segunda-feira (7), véspera do Dia Internacional da Mulher, a sessão da Câmara de Vereadores de Sant´Ana do Livramento, município de 80 mil habitantes a 550km de Porto Alegre, foi marcada por um ato de violência política de gênero. Na ocasião, o vereador Enrique Civeira (PDT) disse que o cérebro da prefeita da cidade, Ana Tarouco (DEM), se assemelhava ao "caroço de uma azeitona".

Civeira criticava um pedido de financiamento feito ao banco Banrisul pela prefeitura. A proposta, segundo ele, seria improcedente. "Só a secretaria e a prefeita de Sant'Ana do Livramento para ter um pensamento destes. Eu comparo o cérebro dessas senhoras a um caroço de azeitona. Não pode ser muito maior do que isso", ressaltou na tribuna, se referindo também à secretária de Educação da cidade, Elisangela de Almeida Duarte.

Em conversa com Universa, Tarouco lamentou o ocorrido e tratou a fala como um ataque. Em viagem a São Paulo para buscar recursos para o município, diz que vai estudar a situação para saber o que fazer quando retornar. "Se parar e me debruçar sobre as ofensas agora, estarei desvirtuando o objetivo. Quanto voltar sento e avalio as posturas que tomarei".

Para a prefeita, o fato de o parlamentar se dirigir à chefe do Executivo dessa forma já é um crime. "Foi raso e criminoso, diminuiu minha pessoa e o meu trabalho. A fala dele já deveria ser suficiente para causar um levante", afirma.

Prefeita Ana Tarouco, de Sant´Ana do Livramento (RS) - Reprodução - Reprodução
Prefeita Ana Tarouco, de Sant´Ana do Livramento (RS)
Imagem: Reprodução

Tarouco é a primeira mulher a assumir a prefeitura da cidade. Segundo ela, desde que assumiu se vê alvo de ofensas e perseguição machista. "Não há mais espaço para esse tipo de comportamento na sociedade", diz. "Pode haver divergências políticas, mas deve existir o respeito às instituições. Sou a chefe do Executivo, mereço respeito."

Câmara se omite: "Cada vereador é responsável pelo que diz"

Questionado pela reportagem sobre quais medidas a Câmara de Vereadores da cidade tomaria, o presidente da casa, Aquiles Pires (PT), disse que "cada vereador é responsável pelo que diz e seus atos". Falou, ainda, que somente será tomada alguma atitude caso haja "representação do ofendido", ou seja, se a prefeita protocolar uma queixa formal. Ressaltou, por fim, que a casa é "contra qualquer tipo de ofensa, sem distinção."

Tarouco criticou o posicionamento da câmara. "Não há necessidade de me sentir ofendida, o que foi dito já foi ofensivo. Eu sou a vítima", diz. "É uma manifestação protegida e abarcada pela imunidade parlamentar, que é quase uma impunidade parlamentar."

No Brasil, a violência política de gênero é considerada crime desde agosto de 2021. Pela lei, "assediar, constranger, humilhar, perseguir ou ameaçar candidata a cargo eletivo ou detentora de mandato eletivo" são atos que podem ser punidos com um a quatro anos de prisão, mais multa.

Procurado, vereador faz piada: "Caroço de azeitona é saudável"

Procurado por Universa, o vereador Enrique Civeira disse que não é "contra as mulheres" e defende e valoriza a participação feminina na política. De acordo com ele, a manifestação na sessão da segunda-feira (7) não foi "bem interpretada". "Fizeram isso para denegrir (sic) a minha imagem. As pessoas não conhecem os benefícios do caroço da azeitona, eu conheço porque a nossa cidade cultiva oliveiras", diz, em tom de chacota.

"Não fiz um ataque, diferente do que ela já faz comigo, me chamando de irresponsável, por exemplo", pondera. Ele criticou a chefe do Executivo por não ter colocado a oliveira como um dos símbolos da cidade, em uma discussão anterior a esse episódio. "Se ela acha tão ruim é porque ela não valoriza os produtos que são da terra. Caroço da azeitona é pequeno, mas é muito saudável."

"Por mais maravilhoso que seja o caroço da azeitona, o que ele disse foi ofensivo, para me atingir", rebate a prefeita. "O contexto foi de diminuição. Me sinto frustrada e vulnerável. Se eu que sou forte, empoderada, dona de mim e ainda passo por isso, imagine mulheres que ainda não tiveram a oportunidade de construir uma fortaleza."

"Minha vida pessoal é vilipendiada", diz prefeita

Desde que assumiu o Executivo, Tarouco começou a receber apelidos —diz, por exemplo, ser chamada de "corpitcho"—, foi criticada pelos brincos que usa, pela forma com que se veste e por seu comportamento. As ofensas são replicadas por moradores de Livramento e por vereadores de ambos os gêneros. "A nossa vida pessoal, como mulher, é absolutamente desrespeitada e vilipendiada. Eu vivo isso 24 horas. Não vejo falarem o mesmo dos homens. Por quê?".

A prefeita ressalta que a sociedade não pode deixar de se indignar quando uma situação como a que ela foi exposta vêm à tona. "Temos que nos unir. Há homens que se acham acima de mulheres, as diminuem em casa, na vida pública. Somos vítimas diariamente."