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Após perder vagas por duvidar de si, ela abriu empresa e capacita mulheres

Jhenyffer Coutinho, criadora da Se Candidate: "Quando você conhece a sua história, ganha musculatura e se torna uma pessoa mais forte" - Lorrayne Chaves/ Divulgação
Jhenyffer Coutinho, criadora da Se Candidate: 'Quando você conhece a sua história, ganha musculatura e se torna uma pessoa mais forte' Imagem: Lorrayne Chaves/ Divulgação

Caroline Marino

Colaboração para Universa

21/03/2022 04h00

Uma palestra em 2018 mudou a jornada profissional da mineira Jhenyffer Coutinho, 29. A apresentação citava uma pesquisa sobre a cobrança excessiva das mulheres sobre o próprio desempenho: a maioria delas, por exemplo, não se candidata a vagas de emprego se não tiver todos os pré-requisitos, enquanto os homens fazem isso com 60% das competências pedidas. "Eu era aquela mulher", diz.

Jhenyffer conta que, toda vez que se candidatava a uma oportunidade nova de trabalho, fazia uma planilha no Excel com a lista das habilidades que precisava e, se não tivesse uma delas, não se candidatava. "O problema é que essa lista só aumentava e eu não conseguia dar o próximo passo na carreira", afirma. Ela sofria com a síndrome da impostora, uma experiência psicológica que nos faz duvidar da nossa competência, causando dúvida e sentimento de inadequação.

Decidida a mudar o rumo de sua carreira, ela pediu demissão de um cargo de alta gerência para entrar em uma startup ou empresa menor. Mas, claro, faltava um item na lista para cumprir os requisitos e dar esse passo: falar inglês fluentemente. Assim, ela resolveu fazer intercâmbio nos Estados Unidos. Foi durante esse processo que decidiu criar a Se Candidate, Mulher!, que busca incluir mulheres no mercado de trabalho brasileiro e já capacitou mais de 15 mil profissionais e recolocou cerca de 500.

Em 2021, a empresa faturou R$ 500 mil e a perspectiva é crescer quatro vezes este ano. Mas ela precisou enfrentar algumas dificuldades no início de sua trajetória como empreendedora e conseguir silenciar a voz da impostora.

'Sempre faltava algo para eu dar o próximo passo'

Em 2020, em plena pandemia e já nos EUA, Jhenyffer se deparou com a notícia de que 7 milhões de mulheres estavam desempregadas no país, número agravado pela pandemia de covid. "Quando ouvi esse dado, deu um estalo na minha cabeça. Eu lembrei de tudo que eu vi no workshop e percebi que, mais uma vez, estava correndo atrás de um requisito que achava que não tinha para avançar na carreira, e o quanto isso podia atingir outras mulheres", afirma. Começou, ali, a estruturação de sua empresa.

A Se Candidate é para falar para a Jhenyffer e para todas as mulheres que, sim, elas podem se candidatar a vagas mesmo com 70% dos pré-requisitos. E se ainda acharem que estão em desvantagem, eu ensino o caminho das pedras.

A empresa começou aos poucos, no conhecido MVP (Produto Mínimo Viável) do mundo das startups, no qual o investimento inicial é mais baixo —apenas referente aos recursos necessários para testar o projeto e adaptá-lo, se for necessário. Jhenyffer criou uma newsletter quinzenal com dicas de preparação de currículo e perfil no LinkedIn, além de uma curadoria de vagas.

Mas, à medida que colocava o projeto na rua, percebia o potencial do negócio. Em dois meses, ela já tinha sete mil assinaturas e o pedido das mulheres por mais conteúdo. A empresa foi, então, para o LinkedIn e Instagram, além de comunicação via WhatsApp, que passou de um para 19 grupos administrados por ela em pouco tempo. Com a validação de que havia um problema a ser resolvido e as soluções propostas estavam tendo retorno, Jhenyffer decidiu voltar ao Brasil, em janeiro de 2021, para fazer a Se Candidate deslanchar

Coca-Cola e Ambev entre os clientes

O foco da empreendedora sempre foi o B2C, mas com o crescimento do negócio ela começou a perceber que havia oportunidade de ir além, pois as empresas começaram a procurá-la para atrair mais mulheres em seus processos seletivos. Hoje, a Se Candidate, Mulher! tem clientes como Creditas, PicPay, Coca-Cola, Ambev e Whirlpool. A empresa atua por meio de uma plataforma chamada SCM Academy, que conta com jornadas de conhecimento sobre temas como autoconhecimento, comunicação e oratória, currículo, entrevista e análise SWOT, ministrados por cerca de 10 mentoras.

A empresa oferece, também, aulas direcionadas a mulheres negras, mães, PCDs e LGBTQIA+. Para as companhias, o negócio oferece dois serviços. O primeiro é um programa de recrutamento e seleção que ajuda a reduzir o tempo de contratação e, ainda, ajuda a atrair as candidatas para os processos seletivos. O segundo é voltado para o desenvolvimento de lideranças.

Agora, Jhenyffer está em busca de um investimento. "Estamos passando por uma rodada para, assim, sustentar o crescimento da empresa. A ideia é escalar o B2B, chegar a mais empresas e investir em tecnologia", afirma.

Jornada de autoconhecimento

O processo para chegar até aqui exigiu de Jhenyffer coragem e determinação para encarar seus medos e driblar de uma vez a voz da Impostora. "Eu acreditava na ideia, mas não acreditava na Jhenyffer empreendedora", diz. Segundo ela, havia muito medo de empreender por conta da instabilidade financeira e de saber que outras pessoas dependeriam de seu trabalho. O que a ajudou foi poder contar com uma rede de apoio sólida.

"Sempre tive pessoas que me ajudaram, que acreditaram em mim. Quando eu achava que não daria conta, ouvia de amigos que, sim, eu era capaz e iria conseguir. Meu marido, por exemplo, sempre me dizia que seguraria a onda enquanto a empresa estava no início", diz. "Se eu não tivesse essa rede que acreditava no que eu estava fazendo, não sei se estaria contando essa história", completa.

Outro ponto importante foi a jornada de autoconhecimento pela qual a empreendedora passou. Ela costuma dizer que sua coragem e autoconfiança foram se construindo junto com a empresa. "A jornada de autoconhecimento foi a primeira que construí na Se Candidate, pois percebi que esse era o início do processo para acreditar em mim mesma", afirma. A virada de chave, segundo ela, foi reconhecer a sua história, entender tudo o que passou na vida e como se transformou na mulher que é hoje.

Jhenyffer ressalta que buscou muitas de suas competências na adolescência. "Lembro que desde muito nova minha mãe estipulou metas para mim, como de estudo. E quando penso nisso, digo: 'Opa, eu já aprendi a lidar com meta há muito tempo", diz. Um dos exercícios da Se Candidate é uma linha do tempo na qual a mulher destaca alguns pontos e o que aprendeu com aquilo. Por exemplo: uma capitã do time de vôlei na quinta série que aprendeu liderança. Ou, então, alguém que durante a adolescência mudou dez vezes de cidade por causa da família, e aprendi sobre a adaptabilidade. "Quando você conhece a sua história, ganha musculatura e se torna uma pessoa mais forte", completa.