Topo

Trancista de Ludmilla abre salão afro em SP: 'Autoestima e oportunidade'

Esther Gomes, trancista e empreendedora abriu salão Badu, em São Paulo - Pryscilla K./UOL
Esther Gomes, trancista e empreendedora abriu salão Badu, em São Paulo Imagem: Pryscilla K./UOL

Nathália Geraldo

De Universa, em São Paulo

03/04/2022 04h00

Na adolescência, Esther Gomes acompanhava uma amiga de escola nos salões afro para que ela fizesse tranças. Observava a destreza das profissionais que mexiam os dedos para que os cabelos naturais fossem misturados aos fios do jumbo. Sem grana, a amiga comprou material e pediu para Esther tentar fazer kanekalon —um material sintético— nela. "Ficou bem louco, e as pessoas na escola me buscar para fazer mais. Fui me aperfeiçoando".

No meio da pandemia, aos 24 anos, Esther, que é do Rio de Janeiro, abriu um salão especializado em tranças, o "Ateliê Badu" em São Paulo. Trocou de cidade para tocar o empreendimento ao lado da namorada, Gabriela Gomes Santana, 32.

Sócias, elas movimentam o mercado da beleza negra, com um salão "instagramável" nas cores verde e rosa, onde são atendidas até quatro clientes por dia. O trabalho é exaustivo, diz: no dia anterior à entrevista com Universa, Esther havia ficado em pé para atender das 8 da manhã às duas da madrugada —as mulheres a procuraram para trocar de cabelo antes de irem a um festival de música. "Tem que fazer por amor. E tem que estar com preparo físico", conta.

Salão de tranças: "Quero acolher as clientes"

esther - Pryscilla K./UOL - Pryscilla K./UOL
Esther tem 24 anos e conta com o apoio da namorada, Gabriela, para tocar o negócio: elas são sócias no empreendimento
Imagem: Pryscilla K./UOL

Esther atende como trancista há oito anos. Antes, atuou como recreadora de festas de criança e fez docinhos ao lado da madrinha para vender. Aos 17, foi morar sozinha e decidiu dar novamente espaço ao dom com as tranças —ela conta que nunca fez curso, mas que sua técnica é inspirada no trabalho das trancistas angolanas que atendem o público em Madureira, zona norte do Rio de Janeiro. "Anunciava meu trabalho em páginas do Facebook, até que abri em sociedade com uma amiga o ateliê que fica em Osvaldo Cruz".

O sucesso na cidade natal a levou para atender até pessoas famosas: ela é responsável, por exemplo, pelas tranças da cantora Ludmilla. Com tamanha procura, passou a dar cursos para profissionais pelo Brasil; nas suas contas, são mais de 300 mulheres formadas para trabalhar com cabelo afro. A equipe do salão é composta por ex-alunas. E, para a empreendedora, há oferta correspondente à demanda, já que é comum que mulheres negras experimentem diferentes tranças e penteados.

"Faz parte da nossa cultura, inclusive tem mulher preta que usa o cabelo como acessório, que muda para combinar com a roupa".

Mercado da estética negra: uma oportunidade de mudar de vida

atelie - Pryscilla K./UOL - Pryscilla K./UOL
Detalhe do Ateliê Badu, aberto em março por Esther e a namorada, Gabriela
Imagem: Pryscilla K./UOL
esther - Pryscilla K./UOL - Pryscilla K./UOL
Aos 24 anos, ela montou uma filial do Ateliê Badu em São Paulo: unidade fica no Centro
Imagem: Pryscilla K./UOL

Esther fala que a transformação dos cabelos no salão tem como retorno a valorização da autoestima e a aceitação das clientes, por vezes vítimas de uma lógica que as mantinha com os cabelos alisados. Mas é da experiência de oferecer cursos a outras profissionais que recebe respostas que provam como o mercado da estética é uma oportunidade de virada financeira para as alunas. "Elas me contam que é uma chance de renda. Uma vez, uma participante do curso em Salvador me contou que viajou para lá de ônibus, por três dias, só para fazer as aulas. Estava colocando todas as expectativas no curso, de ir lá, encontrar um trabalho. Choro com isso".

Esther oferece uma cabeça de manequim com cabelo crespo e apostila para cada aluna. Geralmente são quatro dias de aulas com técnicas de nagô, box braid, dread, trança sem nó, knots. As alunas pagam R$ 2.500 pelo curso. Já as tranças podem custar de R$ 100 a R$ 700, a depender do estilo escolhido.

Para a trancista, além de ensinar a parte técnica, vale mais mostrar para as mulheres como é empreender no mercado da beleza. "Sempre falo que é um ramo em que demoramos para ter retorno financeiro. Não é de um dia para o outro. Com o tempo, conseguimos organizar uma agenda, mas é preciso gostar muito, porque é bem cansativo".

Esther não revela quanto investiu no salão recém-aberto, mas avalia que foi o maior passo que deu como empreendedora. "Foi o investimento mais alto que já fiz, com minha namorada. Mas entendo que não se pode ter medo de empreender, porque ter o negócio próprio é como uma roda-gigante: um dia estamos em cima, e no outro estamos embaixo".