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Vítima de racismo no metrô de SP diz que protesto a ajudou a denunciar caso

Henrique Sales Barros

Colaboração para Universa, em São Paulo

03/05/2022 11h11Atualizada em 03/05/2022 13h46

Uma mulher negra registrou ocorrência contra uma outra, branca, relatando ter sofrido injúria racial por causa de seu cabelo crespo em uma estação metroviária no bairro da Vila Mariana, na zona sul de São Paulo. O caso virou protesto de outros usuários do metrô, que gritaram contra a agressora na estação Ana Rosa (linhas 1-Azul e 2-Verde).

À Universa, a vítima, a auxiliar administrativa Wélica Senra Ribeiro, contou que, no final da tarde de ontem, estava voltando de metrô para a casa do irmão — ela é de Macaé (RJ) — junto com os pais, após terem passado o dia no centro da capital paulista.

Cheia de bolsas e sacolas, Wélica entrou no vagão e se sentou em um banco. Atrás dela, de costas, estava Agnes Vajda, assistente do Consulado-Geral da Hungria de São Paulo, uma senhora de cabelo liso e loiro, que logo se dirigiu a ela.

"Do nada, ela virou para mim e falou — de uma forma bem natural, simples, sem pudor nenhum — para eu tomar cuidado, porque o meu cabelo — que estava amarrado, inclusive — estava muito próximo do rosto dela, e poderia causar alguma doença nela", relatou.

Universa teve acesso ao boletim de ocorrência registrado para apuração do caso pela polícia.

Toma cuidado com o seu cabelo, porque está próximo ao meu rosto e pode me causar doença. Frase dita por Agnes Vajda, segundo relato da vítima à Polícia Civil

Quer que eu raspe o meu cabelo para você ficar à vontade? Resposta dada por Wélica à acusada, também segundo relato prestado às autoridades

Em seguida, Wélica pediu para Vajda repetir o que havia dito — e ela assim o fez, novamente. "Tivemos uma breve discussão, enquanto eu tentava manter meu tom de voz ameno. Eu fiquei envergonhada, não esperava passar por aquela situação", afirmou.

Passageiros que haviam testemunhado a fala de Vajda começaram a questioná-la. Ao perceber a situação, o irmão de Wélica se levantou, indo até ela, para saber o que estava acontecendo. Em seguida, sacou o celular e passou a filmar a situação.

De acordo com a gravação, em meio à discussão, a mulher acusada de ter injuriado a vítima tentou contestar a versão dada por Wélica, afirmando que apenas disse que ela deveria cuidar do próprio cabelo, pois poderia pegar "qualquer tipo de doença".

Os passageiros, porém, seguiram dizendo que a assistente consular estava errada, afirmando repetidas vezes que a testemunharam praticando injúria contra Wélica, por causa do cabelo.

"Ela tentou sair (da estação), e ele (o irmão) foi atrás para ela não escapar. Logo, ele começou a levantar um protesto, e aquilo foi enchendo de gente", contou Wélica. "Na primeira oportunidade, ela ia sumir."

Vídeos divulgados nas redes sociais mostram pessoas na estação Ana Rosa gritando a palavra "racista" repetidas vezes e "racistas: não passarão" em direção a Vajda.

"Sozinha, eu não teria força para gritar por socorro", disse. "Ao ver aquelas pessoas gritando a meu favor, eu fiquei muito feliz e satisfeita. É isso que tem me deixado com chão, equilibrada e que me traz conforto", afirmou.

Agentes do Metrô-SP foram acionados, e o irmão de Wélica, ela própria e Vajda, além de testemunhas, foram encaminhados para uma delegacia da Polícia Civil localizada na região. "Saímos de lá já era quase meia-noite", contou.

Posições

Procurado por Universa, o Metrô-SP disse que agentes da companhia foram acionados após "duas passageiras se desentenderem", com uma delas tendo sido "acusada de injúria racial". Em nota, o órgão afirmou que atuou na "proteção das partes" e acionou a polícia.

Já a Polícia Civil, também por meio de nota, disse que a gravação feita no interior do vagão "será usada nas investigações" e confirmou que o caso foi registrado em uma delegacia no bairro do Campo Belo, também na zona sul de São Paulo, como injúria racial.

"Todas as partes foram ouvidas e a vítima representou criminalmente contra a autora. A autoridade policial determinou a instauração do inquérito para esclarecer todas as circunstâncias do fato", acrescentou a polícia, por meio da Secretaria de Segurança Pública de SP.

Universa também entrou em contato com o Consulado-Geral da Hungria em São Paulo, que confirmou que Vajda, de fato, trabalha no local. A representação diplomática, porém, disse que não se pronunciaria sobre o caso até que houvesse a conclusão do inquérito policial.

Buscando contato com a própria acusada, a reportagem tentou, hoje pela manhã, se comunicar com Vajda por meio do LinkedIn. No início da tarde, porém, a perfil dela na rede social constava como inexistente. O espaço segue aberto para manifestações.