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Denúncia de violência doméstica por app? O que é o 'Maria da Penha Virtual'

globalmoments/Getty Images/iStockphoto
Imagem: globalmoments/Getty Images/iStockphoto

Rute Pina

De Universa, em São Paulo

18/06/2022 12h11

No estado do Rio de Janeiro, um projeto permite que vítimas de violência doméstica acionem o sistema de justiça rapidamente e sem burocracias, para fazer denúncias de agressões e solicitar medida protetiva de urgência. O Maria da Penha Virtual, criado em versão piloto em 2020 e estendido a todos os juizados especiais de violência doméstica e familiar do estado em março deste ano, é uma página que se comporta como um aplicativo, que pode ser acessado de qualquer dispositivo eletrônico por meio de um link.

A tecnologia foi desenvolvida por estudantes e pesquisadores da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), fruto de uma parceria da instituição com o Tribunal de Justiça do estado.

Pelo aplicativo, a vítima no Maria da Penha Virtual preenche um formulário com seus dados pessoais, dados do agressor e sobre a agressão sofrida, podendo anexar foto e áudio como meio de prova e, de acordo com o caso, escolhe a medida protetiva que consta na Lei Maria da Penha. No final do processo, uma petição de pedido de medida protetiva de urgência é gerada e distribuída automaticamente para o juizado competente.

A defensora pública Flávia Nascimento, coordenadora de Defesa dos Direitos da Mulher na defensoria pública do Rio de Janeiro, explica que a Lei Maria da Penha prevê a "capacidade postulatória" às mulheres em situação de violência doméstica e familiar: isso significa dizer que elas podem acessar e solicitar medidas protetivas de urgência sozinhas e diretamente, sem depender de um advogado ou agentes policiais. As medidas protetivas de urgência são concedidas assim que se tiver notícia da situação de violência e de perigo à vítima.

"A lei previa essa capacidade postulatória, mas, até então, não havia como as mulheres fariam isso. Muitas faziam através da Defensoria Pública, através de suas advogadas, mas não havia uma ferramenta capaz que possibilitasse e facilitasse esse da mulher à justiça por conta própria. E o aplicativo Maria da Penha virtual veio para facilitar essa situação para suprir essa possibilidade que a Lei Maria da Penha previa", explica.

Nascimento explica que a medida tem, assim como qualquer outro meio de solicitar a medida protetiva, um prazo de 48 horas para análise do juiz e deferimento do documento — a Justiça intima ambas as partes, tanto a vítima quanto o suposto autor do fato, para definir a validade da medida.

"A mulher preenche aquele formulário, explica qual é a situação de violência e isso vai ser submetido à apreciação do juízo, que pode deferir ou indeferir a medida protetiva de urgência. Então, não adianta a mulher estar dentro do banheiro em situação de perigo e parar no meio daquele pânico daquela situação de pânico que ela vivenciando, preencher todo um formulário, toda atender todos esses requisitos para demandar em juízo. Nesse momento que a mulher está dentro de um banheiro trancada, fugindo da situação de perigo ela tem que ligar pro 190 e chamar a polícia. Aí sim a polícia vai na casa dela", diz a defensora.

A advogada Gabriela Souza, especialista em direitos da Mulher, explica também que o relato da vítima de violência doméstica tem validade probatória. O que significa que o peso da palavra da vítima, nestes casos, tem valor diferenciado pelo entendimento que é um crime cometido dentro de casa e, muitas vezes, não há nenhuma outra prova.

"Isso faz com que a palavra da mulher ao solicitar ajuda diante de uma delegacia, diante de um pedido de medida protetiva tenha essa validade diferenciada. É como se valesse por duas provas, é como se fosse uma prova mais importante, porque o relato dela é suficiente para que seja deferida medida protetiva, inclusive porque muitas vezes quase sempre essa violência acontece dentro de casa no ambiente íntimo, doméstico ou familiar e a mulher não tem condições de filmar."

No início, o aplicativo Maria da Penha Virtual funcionou em sete juizados na cidade do Rio de Janeiro. Desde o dia 8 de março deste ano, a ferramenta atende a todos os juizados de violência doméstica e familiar contra a mulher do estado. No ano passado, o projeto conquistou o primeiro lugar no Prêmio CNJ Juíza Viviane Vieira do Amaral na categoria Tribunais.

Como denunciar violência contra a mulher

Mulheres que passaram ou estejam passando por situação de violência, seja física, psicológica ou sexual, podem ligar para o número 180, a Central de Atendimento à Mulher. Funciona em todo o país e no exterior, 24 horas por dia. A ligação é gratuita. O serviço recebe denúncias e faz encaminhamento para serviços de proteção e auxílio psicológico. O contato também pode ser feito pelo WhatsApp no número (61) 99656-5008.

Mulheres vítimas de estupro podem buscar os hospitais de referência em atendimento para violência sexual, para tomar medicação de prevenção de ISTs (infecções sexualmente transmissíveis), ter atendimento psicológico e fazer interrupção da gestação legalmente.

Se houver intuito de denunciar, a orientação é buscar uma delegacia especializada em atendimento a mulheres. Caso não haja essa possibilidade, os registros podem ser feitos em delegacias comuns.