'Achei que morreria nos bastidores', diz dona de consultoria gastronômica
Nenhum preconceito ou olhar atravessado foi capaz de parar a paulistana Vera Araújo, 57 anos, idealizadora da VA Gestão de Negócios, uma consultoria voltada a empresas de gastronomia. Ela é uma mulher negra, criada na periferia, divorciada e mãe. "Essas características sempre me isolam na sociedade. Cresci dentro da famosa 'democracia racial', na qual há limites para a violência, hostilidade, e até um certo prazer em praticar o racismo. Sempre soube disso e percebia a surpresa das pessoas quando eu chegava e viam que era uma mulher preta", diz.
Para chegar à frente da empresa que já atendeu Affari e Grupo UltraBros, que detém bares de sucesso como o Vaca Veia, em São Paulo, e dar palestras em companhias como o Itaú, Vera costuma dizer que aproveitou todas as oportunidades que surgiram para crescer. Ela se formou em comunicação social e começou a trabalhar como secretária de um dono de restaurante, o Vinheria Percussi. Depois foi para um buffet e recebeu um convite inusitado: ir para os Estados Unidos fazer uma imersão. "Eu não falava inglês, mas sabia que a viagem seria importante para a minha carreira, então fui."
A experiência a fez perceber que ela poderia ser e fazer mais. "Sempre achei que ia 'morrer' nos bastidores, trabalhando para outras pessoas. Era como se eu não pudesse ser mais. Pensava: será que ser mulher, negra e da periferia não vai me atrapalhar? Demorei muito para dar alguns passos com medo, até, de mim mesma, de como eu iria me ferir nessa sociedade e de como seria aceita", diz.
Ela se lembra de um dia no qual uma assistente financeira do restaurante falou: "Vera, você é uma águia que pensa que é galinha. Vai voar, pois você pode ser o que quiser".
Especialização é ingrediente para o crescimento
Depois da viagem aos Estados Unidos, Vera voltou ao restaurante, que já estava em outro patamar, e assumiu mais responsabilidades. Para crescer por lá, fez cursos de gestão, treinamentos na área e uma pós-graduação em Gestão de Negócios de Serviços de Alimentos e Bebidas.
Com toda essa bagagem virou gerente, sendo responsável por RH, finanças e administrativo. "É aquela história do chamado Fordismo: especialização e repetição", diz. A experiência a tornou mais forte e segura e, depois de fazer uma constelação sistêmica e entender algumas de suas crenças limitantes, ela já estava preparada para voar, mesmo que alguns não a aceitassem.
Ao terminar a pós-graduação, ela foi convidada a dar aulas no Senac e, assim, surgiram convites de outras instituições, como Anhembi Morumbi, Unip e São Camilo. Além disso, ela começou a ser chamada para prestar consultorias para algumas empresas. Por um tempo, Vera conciliou as três atividades. "Essa fase exigiu muito comprometimento, mas chegou um momento em que precisei fazer uma escolha, pois os trabalhos paralelos já estavam prejudicando meu desempenho", afirma. Assim, Vera deixou o restaurante para montar sua consultoria, que já atendeu mais de 200 clientes.
Ela ressalta que a coragem para abrir o próprio negócio foi uma construção, um processo de autoconhecimento. "Aquela coisa de se olhar no espelho, ir tirando as sombras e trazendo a luz. Eu busquei em mim mesma uma pessoa apta a trabalhar com as consequências". Para isso, foi preciso reforçar a segurança e deixar o medo de lado. "Pode até acontecer de um cliente não ficar satisfeito, mas eu sei que me entreguei de corpo e alma ao trabalho e fiz tudo o que podia. E o feedback negativo nos ajuda a melhorar", diz.
Planejar, organizar, gerir e controlar: a essência da administração
Segundo Vera, uma parte importante do sucesso da consultoria é contar com um planejamento de curto, médio e longo prazos. "Eu tenho tudo planejado, sei quanto preciso ganhar, se devo algo e o que pode ser negociado, as melhorias que devo fazer e aonde quero chegar", diz.
Outro ponto essencial é ouvir genuinamente o cliente, sua demanda e o que você pode entregar a ele. Por exemplo, não adianta fechar um evento com uma multinacional se você não tem braços suficientes para atendê-la.
"É preciso pensar: até onde vai minha competência e minha estrutura hoje? E assim ir dando os passos", diz. Mas ela ressalta que para tudo isso funcionar, o empreendedor precisa ter humanidade nas relações. "O dinheiro é consequência. Se for a meta final você deixa de ser humano", diz.
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.