Autora de hit erótico da Netflix: 'Tem filme da Disney mais problemático'
A escritora polonesa Blanka Lipinska ficou famosa no mundo inteiro por ser a responsável por escrever a trilogia de livros eróticos "365 dias", que chegou ao Brasil com o selo da Buzz Editora no final de 2020. A adaptação da Netflix ganhou destaque pelas cenas de sexo intenso entre Massimo (Michele Morrone) e Laura (Anna-Maria Sieklucka) e pelo enredo: uma mulher sequestrada por um homem obcecado por ela tem um ano para se apaixonar por ele antes de ser libertada.
Apesar da história romantizar um crime e ter cenas de sexo bem violentas, Blanka já vendeu 100 mil cópias dos dois primeiros livros da trilogia, entre digitais e físicas, só no Brasil. No país para a Bienal do Livro de São Paulo, a autora conversou com Universa na manhã desta segunda-feira, na sede da editora na avenida Paulista. Para Blanka, o ponto-chave da sua história é o consentimento entre os personagens, que criou o livro em momento de crise como o da personagem principal no começo do livro: "Quando comecei a criar o livro, passei o controle da minha vida para o Massimo e isso me deu paz. Eu criei esse livro para mim, porque foi terapêutico", conta.
Natural da Polônia, um país extremamente religioso e conservador, ela ainda conta que é perseguida. "As pessoas pensam que eu sou uma bruxa e querem me queimar. Mas não me importo", afirma. Leia a seguir:
UNIVERSA No seu livro, a personagem principal é sequestrada por um homem obcecado por ela, por quem Laura acaba se apaixonando. Qual mensagem você quis passar com a história?
Blanka Lipi?ska Em primeiro lugar, eu escrevi "365" quando estava em um momento da minha vida como o da Laura no começo do livro. Ela largou o emprego e não tinha ideia do que ia fazer com a vida dela, que é o que aconteceu comigo. Pedi demissão e não conseguia ver nenhuma possibilidade. Tudo era um burado negro na minha vida.
Sempre fui uma mulher independente que tinha que resolver tudo e tomar todas as decisões. Eu estava cansada e comecei a pensar em como seria bom se alguém me sequestrasse e decidisse tudo para mim.
Eu nunca pude deixar o controle de lado, essa não era uma opção. Por isso, Laura é sequestrada. Quando comecei a criar o livro, passei o controle da minha vida para o Massimo e isso me deu paz. Eu sei que é difícil entender, mas foi isso.
Em tempos atuais, você não acha perigoso romantizar um crime?
Eu criei esse livro para mim, porque foi terapêutico. Decidi publicá-lo depois de quatro anos. Tudo o que está nas páginas é honesto e real. Quando você pensa sobre sua vida, está pouco se f*** sobre o que as pessoas vão achar, porque é algo da sua cabeça que ninguém vai ouvir. O começo foi assim. Por outro lado, esse livro é para pessoas adultas.
Adultos pensam, usam o cérebro, ou pelo menos deveriam. É uma história pra entretenimento. Em terceiro lugar, é muito mais problemático ter um desenho da Disney, "A Bela e a Fera", que também aborda a Síndrome de Estocolmo.
Porque as crianças veem e acreditam em tudo. Elas acham que podem voar, por exemplo. Adultos não são assim.Mas ninguém está preocupado com isso.
Se olharmos os desenhos da Disney, as mulheres não têm nenhuma habilidade. Sabem apenas ser bonitas e cantar. Só isso. Vivem esperando um príncipe em um cavalo branco. E, alô, estamos no século 21. Só a Pocahontas e a Mulan são um pouco independentes. E quando você pensa que isso é um desenho, percebe quantos maus exemplos a Disney dá em sua produção. Acho que isso é um problema bem maior do que "365", ok?
Você fica brava com as críticas? Te incomoda quando falam mal da sua história?
Não me importo e nem penso nisso. Às vezes, fico braba quando alguém não me entende. Falo em uma coisa em uma entrevista e aí vejo os comentários. Tento falar claramente, os jornalistas me entendem e depois as pessoas leem as manchetes e entendem o que querem. Isso me irrita.
Por exemplo, muitas pessoas veem o sexo de "365" como violento. E, claro, que esse tipo de sexo tem violência. Mas existem duas pessoas que consentiram com aquele ato. Nem todo mundo gosta de transar no escuro, na posição papai e mamãe. Nós somos diferentes e isso é legal. E temos que lembrar que em um relacionamento há duas pessoas. Se ambas concordarem, está tudo bem.
Você acredita em segundas chances e que as pessoas mudam? Que Massimo pode mudar por Laura e ela por ele?
Não. Quando eu era jovem acreditava nisso. Mas quando me perguntam hoje em dia, começo a pensar em mim mesma: sou legal, falo demais, sou barulhenta, adoro sexo selvagem, comida e bebidas boas e óculos e sapatos caros. Posso mudar essas coisas? Posso fazer um sexo baunilha, ser tímida, não falar? Posso fingir por um dia ou por um mês, mas só. Nós somos assim porque somos assim. Você pode mudar um pouco em algum momento de sua vida. Mas completamente é impossível.
Acredita então que as cenas de sexo podem ser inspiradoras para algumas mulheres?
Totalmente. Elas estão inspirando ao redor do mundo, o que é bem legal.
Quando você é mulher ninguém te fala 'olha se você gosta de sexo anal, oral ou qualquer outro tipo, vai fundo. Está tudo bem'. As mulheres têm medo de dizer para o parceiro o que querem na cama por medo de serem julgadas.
Sei quanto é bom ter um parceiro bom no sexo e se sentir confortável com ele. Por isso criei "365". Fiquei em um relacionamento onde não transamos por um ano e meio. Foi aí que percebi como o sexo é importante para a relação. Comecei a ter problemas de saúde, com açúcar e com meus hormônios. Meu médico me falou que é porque meu corpo precisava de sexo. A mãe natureza nos criou assim.
É muito importante falarmos de sexo como falamos de qualquer outro assunto. Nossa vida seria muito mais fácil. Depois de ouvirem minha voz, mulheres perceberam que podem falar sobre isso e tiveram coragem, e elas só têm que fazer isso com uma pessoa: o namorado.
Alguns caras ficaram super felizes e se sentiram sortudos por terem parceiras que querem colocar em prática coisas que eles veem no pornô. A relação começa do zero e de um jeito melhor depois dessa conversa.
Li que algumas cenas do livro são inspiradas em sua vida, como o sequestro de Laura porque você também já foi sequestrada por uma pessoa com a qual tinha relacionamento. Você pode falar um pouco sobre isso?
Não, não posso falar sobre o meu sequestro. O livro tem que ser o suficiente para você. O resto é minha vida privada. Falo muito sobre muitas coisas, mas algumas quero deixar só em minhas memórias e na de quem estava comigo.
Depois de oito anos, quando leio algumas cenas de Laura, penso em como eu era burra. Eu realmente fiz alguma daquelas coisas. Nós mulheres somos burras às vezes, mas é bom que conseguimos ver.
Como é isso das mulheres na Polônia?
Meu país é muito religioso e conservador, não consigo achar nem a palavra certa em polonês para defini-lo. Lá as pessoas pensam que eu sou uma bruxa e querem me queimar. Mas não me importo.
Como foi deixar de ser anônima e se tornar uma pessoa famosa no mundo todo?
Não penso sobre isso. Eu tenho 37 anos e só me tornei uma pessoa pública no meu país e no mundo nos últimos quatro. Grande parte da minha vida eu não era ninguém. Então prefiro ficar nessa parte da minha cabeça onde eu sigo anônima. Nem penso que as pessoas podem me reconhecer.
Os filmes são um sucesso na Netflix, você fez parte da produção?
Sim, no primeiro todas as decisões finais eram minhas. E eu também dirigi as cenas de sexo. Me deram uma grande liberdade e acho que isso é parte do motivo do sucesso.
Para a equipe que estava trabalhando, o filme era mais um projeto. Mas para mim, era o meu bebê. Eu estava focada em tudo.
Sempre escolhia as roupas da Laura e estava presente na hora da maquiagem. No segundo e no terceiro, deixei as decisões mais para a produção, eles sabiam o que estavam fazendo e eu podia relaxar. Mas as cenas de sexo seguem sendo decisões minhas.
O UOL pode receber uma parcela das vendas pelos links recomendados neste conteúdo. Preços e ofertas da loja não influenciam os critérios de escolha editorial.
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.