Topo

Guia quer ajudar a combater violência política contra mulheres nas eleições

Alvo constante de ofensas, a deputada federal Tabata Amaral (PSB-SP) fala sobre os ataques que sofre no "Guia Prático para Mulheres na Política - O que não te contaram sobre ser mulher na política" - Luis Macedo/Ag. Câmara.
Alvo constante de ofensas, a deputada federal Tabata Amaral (PSB-SP) fala sobre os ataques que sofre no "Guia Prático para Mulheres na Política - O que não te contaram sobre ser mulher na política" Imagem: Luis Macedo/Ag. Câmara.

Luiza Souto

De Universa, do Rio de Janeiro

25/07/2022 18h12

A Rede de Ação Política pela Sustentabilidade (RAPS) lança, nesta segunda-feira (25), um guia interativo sobre violência de gênero na política, com foco nas eleições de 2022. O "Guia Prático para Mulheres na Política - O que não te contaram sobre ser mulher na política" traz depoimentos de 16 lideranças que passaram ou passam por situações de assédio, constrangimento, agressões e outros tipos de violência, e como elas enfrentaram essas violências.

Segundo a ONU Mulheres, 82% das mulheres em espaços políticos no Brasil sofreram violência psicológica; 45% sofreram ameaças; 25% sofreram violência física no espaço parlamentar; 20%, assédio sexual; e 40% afirmaram que a violência atrapalhou a sua agenda legislativa.

E de acordo com o Instituto Alziras, uma pesquisa feita com 45% das 649 prefeitas eleitas em 2016 constatou que 53% delas já sofreram assédio ou violência política pelo simples fato de serem mulheres, e 30% já sofreram assédio e violências simbólicas no espaço político.

"Estamos falando do assédio moral e sexual em ambientes políticos, das interrupções que são feitas enquanto mulheres estão falando, dos ataques, xingamentos, ameaças de morte, ameaças de violência sexual. Em alguns casos, a violência política é também física: mulheres são tocadas, agredidas e mortas devido a sua atuação política. No conjunto, são ações que vêm para silenciar as mulheres que lutam e que se posicionam", declara a deputada federal Tabata Amaral (PSB) ao guia.

A RAPS surgiu há 10 anos para orientar quem quisesse disputar eleições e também lideranças políticas eleitas, e ainda informar sobre como tornar o ambiente mais sustentável. Hoje ela conta com 753 membros, dos quais 228 estão no exercício de cargos eletivos.

A diretora-executiva da organização, Mônica Sodré, diz a Universa que testemunhou diferentes situações de violência política de gênero, e sentiu a necessidade de apontar soluções práticas para o seu combate, além de encorajar mulheres a não desistir de ocupar lugares ou disputar posições por causa desses episódios.

A partir das suas observações, dos relatos ouvidos e da consulta a seis especialistas no tema, foi feito um mapeamento dos tipos de violência política —psicológica e moral, simbólica, institucional, sexual, física e patrimonial— e possíveis caminhos a serem tomados para combater o problema.

"O guia nasceu de maneira colaborativa e é interativo. Trata-se de um PDF em que você clica em diferentes partes do documento. A gente ainda estimula que pessoas mandem não só os seus relatos mas também os caminhos que encontraram para superar episódios de violência", aponta Mônica.

O "Guia Prático para Mulheres na Política - O que não te contaram sobre ser mulher na política" ensina a reconhecer as agressões e a enfrenta-las - Divulgação/RAPS - Divulgação/RAPS
O "Guia Prático para Mulheres na Política - O que não te contaram sobre ser mulher na política" ensina a reconhecer as agressões e a enfrenta-las
Imagem: Divulgação/RAPS

Mulheres são maior alvo de ofensas

Homens e mulheres estão sujeitos à violência política. Dados do Observatório da Violência Política Eleitoral da Unirio (Universidade do Rio de Janeiro) mostram que em 2019 o país registrou pelo menos um episódio de violência política a cada três dias. E esses casos cresceram quase 50% no primeiro trimestre deste ano se comparados com os dados do último trimestre de 2021.

Mas Mônica pondera que há aí uma diferença clara entre os ataques quando separamos os gêneros. E lembra de dados recentes da Terra de Direitos da Justiça Global, que em 2021 lançou pesquisa apontando que a maioria esmagadora de representantes eleitos, candidatos ou pré-candidatos assassinados ou que sofreram atentados é do sexo masculino: 116 ocorrências (93%), ante 9 registros entre as mulheres (7%). Os dados são do período compreendido entre 1º de janeiro de 2016 e 1º de setembro de 2020.

Quando falamos de ofensas, as mulheres são o maior alvo, segundo essa mesma pesquisa. De acordo com os dados, em 76% das situações as mulheres foram vítimas de ofensas, em 24% dos casos as vítimas eram homens. Segundo o mapa, nos casos em que grupos historicamente discriminados foram ofendidos por agentes políticos, as ofensas dirigiram-se à população negra, mulheres, religiões de matriz africana, população LGBTQIA+ entre outras.

Baseada nesses números, Mônica conclui:

"As mulheres estão menos expostas a assassinatos e atentados, mas elas são submetidas a um cotidiano de ameaças e ofensas. Os homens têm o seu corpo físico ameaçado enquanto a mulher na política é desqualificada, e isso acaba fazendo com que ela não seja tão vítima de ações como atentados, mas seja muito mais comum ter a sua dignidade como alvo principal do ataque."

Na última semana, o Tribunal Superior Eleitoral instituiu um Grupo de Trabalho destinado a elaborar e a sugerir diretrizes voltadas ao tema. Antes disso, em agosto do ano passado, o presidente Jair Bolsonaro (PL) sancionou a lei que considera crime assediar, constranger, humilhar, perseguir ou ameaçar candidata a cargo eletivo ou detentora de mandato eletivo, com pena de reclusão de 1 a 4 anos e multa.

Para Mônica, as atitudes recentes chegam com atraso em relação a países vizinhos como o Panamá, que tem legislação contra violência política desde 2013, e o Paraguai, que atua no campo desde 2018.

De 11 países latino-americanos, o Brasil é o nono pior na garantia aos direitos políticos da mulher. Pesquisa realizada pela ATENEA, PNUD e IDEA Internacional indica que o Brasil se encontra na nona posição de 11 países da região quanto aos direitos políticos das mulheres.

"Precisamos todos sermos capazes de sair em defesa de outras mulheres contra essas violências, e também criar um mecanismo de identificação e de reportagem dessas violências políticas de gênero", conclui Mônica.