Comer, plantar, emoldurar: o que é possível fazer com a placenta após parto
A notícia de que uma mulher teve a placenta roubada na semana passada causou estranhamento quando a própria vítima, a catarinense Paula Roseng, 25, contou, no Twitter, o que tinha acontecido. Paula congelou a placenta em um pote de sorvete após o nascimento da filha, em 2018, e a ideia era de que, quando a menina crescesse e entendesse o significado que aquilo representava, pudessem plantar juntas. O ladrão teria levado o órgão pensando ser carne congelada.
Por que uma pessoa guardaria a placenta? De acordo com a ginecologista natural Carolina Melendez, como o órgão e a criança possuem a mesma carga genética, muitos profissionais orientam ou sugerem para que o sangue do cordão umbilical e a placenta sejam guardados, uma vez que há um grande potencial das células, com o intuito de ingerí-las. "Ter acesso a comida, soro, maneiras para que a mulher reponha o sangue que perdeu no parto é recente. Se pensar no homem das cavernas, comer placenta é rico, nutritivo. Os animais comem as suas."
Há, também, uma forte simbologia para a mãe. "Se torna para ela uma questão de cultura e interpretação". É o que explica a placenteira, Pâmella Souza. Ela conta que em diversas culturas a placenta é reconhecida como um "anjo, amigo, uma entidade espiritual", cuja missão é conduzir um novo ser para a vida, ou seja, auxiliar o bebê na sua travessia do mundo espiritual para o físico.
Atualmente, muita que pode ser feita com a placenta. "Fazemos quadros com carimbos ou com pinturas em aquarela e as biojóias que levam placenta ou leite materno", conta.
Há quem deseje transformar a placenta em elemento de medicina alternativa, transformando em cápsulas, óleo, pomada ou fitoterápico, ou plantar em um jardim ou um vaso. "Tudo envolve uma busca por conhecer e honrar o evento do nascimento como algo sagrado, de autoconhecimento, e também sobre preservar e transmitir a memória por gerações", diz Pâmella.
A ligação entre mãe e bebê, possibilitada pela placenta, faz com que a massa carnuda que envolve o feto seja considerada uma "guardiã" da criança que cresce ali. "Todos os conteúdos genéticos que têm na formação do bebê estão no órgão", explica a placenteira. Em algumas culturas, logo após eliminado no parto, ele é enterrado no quintal da casa ou sob uma árvore, como se fosse um irmão, para que essa nova vida pudesse existir. "Então, para o feminino, significa essa conexão. Existem linhas de filosofias que dizem que todos nós somos gêmeos, que o irmão acaba se transformando na placenta. Eu a vejo e sinto assim, dessa forma."
Pâmella conta que começou seu trabalho na área da maternidade como doula e educadora perinatal e, já nos primeiros nascimentos, pode ver e tocar as placentas. "Apesar de já ter ouvido que era a 'árvore da vida', nada se compara a ver pessoalmente aquele órgão que se parece mesmo com uma árvore".
Pesquisando sobre o assunto e prestando serviço de manipulação medicinal e arte com placentas desde 2015, usa a metáfora de que o ventre é um solo fértil, a placenta é uma árvore que finca suas raízes nesse solo, para poder te entregar o fruto perfeito e saudável que é seu bebê. "Via nas pacientes o encantamento ao ouvir essas palavras, e passou a ser muito comum os pedidos para verem as suas placentas após o parto", conta ela, que também estuda pedagogia e é artista visual.
Manipulação da placenta vem de conhecimento ancestral
A placenta tem a sua função biológica fundamental para o início da vida, é responsável por oxigenar, nutrir e proteger o bebê. "Quando se investiga cada uma dessas funções a gente descobre toda a sua complexidade. Mas para além do que nos diz a ciência, temos o que o conhecimento antigo e ancestral nos transmitiu por gerações", conta Pâmella.
Ela diz que a ingestão é chamada de placentofagia. "Existem documentos antigos mundo afora falando do consumo da placenta para resolução de problemas relacionados ao parto. Isso motivou muitas pesquisas científicas. Quando se fala em medicinais de placenta não falamos especificamente de comê-la ou das cápsulas feitas com ela desidratada, mas também dos óleos, pomadas, tinturas, extratos para os mais diversos fins".
Para ela, ao compreender que a placenta é um órgão transitório repleto de substâncias de fator regenerativo, fica fácil aceitar que ela seja cobiçada para a finalidade medicinal.
A médica ginecologista Carolina Melendez relata que, atualmente, não existe recomendação médica para o consumo mas, se essa for a vontade da mãe, não há contraindicação. "Se a opção for essa, há respeito à escolha da paciente". Carolina aponta que percebe um momento de "reconexão com a potência feminina". "É uma reconexão com a potência de dar à luz e o potencial feminino, de fertilidade na sua forma mais visceral".
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