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Poucas governadoras, muitas vices: como partidos destinam verba a homens

SOPA Images/SOPA Images/LightRocket via Gett
Imagem: SOPA Images/SOPA Images/LightRocket via Gett

De Universa, em São Paulo

16/08/2022 14h49

O prazo para o registro das candidaturas terminou nesta segunda-feira (15) e, por enquanto, mulheres estão presentes em 52% das chapas 223 chapas que vão oficialmente disputar governos — todos os candidatos estão sob análise até setembro para serem oficializadas. Mas são apenas 37 mulheres que vão disputar as eleições para os governos estaduais. Ou seja, são apenas 16,5% das candidaturas. Já o número de candidatas a vices chega a 85, o que representa 39% do total.

Doutoranda em Ciência Política na USP (Universidade de São Paulo), Hannah Maruci, diretora da Tenda das Candidatas, afirma que os dados não surpreendem. " Colocar mulheres como vice é uma forma de direcionar dinheiro para um homem, mas cumprir o estipulado de 30% [das candidaturas femininas]", analisa a cientista política", afirma a Universa.

Amapá, Rondônia, Santa Catarina, Espírito Santo, Alagoas, Bahia, Ceará e Maranhão não têm nenhuma mulher como candidata ao posto de governadora em nenhuma das chapas registradas para as eleições de 2022.

"Não tem nada de novo nestes números. Na verdade, são esperados. São duas coisas que já estavam sinalizadas quando a gente falava de política afirmativas: o mínimo vai virar teto e eles vão achar um jeito de burlar o redirecionamento das verbas", completa Hannah.

O estado de Minas Gerais é o único que tem metade das chapas para o governo do estado encabeçadas por mulheres: das dez registradas, existem cinco candidatas para governadoras. Em seguida, a maior proporção de candidaturas femininas para o Executivo nos estados é no Piauí, que tem quatro mulheres na lista dos nove candidatos à chefia do estado. Paraná e Rio Grande do Norte têm três nomes de mulheres à frente de nove chapas que concorrem ao pleito. No restante dos estados, a proporção de mulheres na liderança das candidaturas não chega a 30%.

Partidos conseguirem verba sem mulheres na liderança

"De forma alguma estou dizendo que não é importante mulheres estarem na composição das chapas como vices. Mas, com certeza está associado a essa necessidade de cumprir essa determinação", afirma Hannah, que com a Tenda das Candidatas auxilia mulheres que tenham interesse de ingressar na política. "A má regulação desta regra, que se tornou lei, para a distribuição entre essas mulheres como [candidaturas] majoritárias faz com que o foco esteja nas mulheres como vices e não tem o efeito de aumentar as mulheres eleitas", afirma.

Em 2018, o STF definiu que 30% do fundo eleitoral deveriam ser utilizados para financiar candidaturas femininas. O mesmo percentual é definido como a cota obrigatória das candidaturas de cada partido — mas isso para cargos que são eleitos por meio das eleições proporcionais, ou seja, cargos para deputados estaduais federais. No Executivo, não há nenhum incentivo institucional para estas candidaturas.

"Pelo contrário, criamos um incentivo em que o voto recebido pelas mulheres para o Legislativo aumenta o recurso partidário que será recebido nas próximas eleições. Então, se você tem uma mulher que tem certa visibilidade, que pode trazer voto para o partido, a tendência é que você a coloque para exercer cargos legislativos, porque isso vai trazer para o partido e resultar em maior recurso eleitoral nas próximas eleições", diz a cientista política Graziella Testa, professora da FGV (Fundação Getúlio Vargas) e doutora em Ciência Política pela USP.

Graziella fala de outra alteração na lei para incentivar mulheres na política: neste ano, a contagem de candidaturas femininas para fins de distribuição das verbas referentes ao Fundo Eleitoral vai valer o dobro. A medida incentivou as siglas lançarem mais mulheres na disputa, já que, quanto mais votos elas conseguirem, maior será a verba direcionada ao partido.

"Para eleição majoritária [que são eleitos por maioria, ou seja, prefeitos, senadores, governadores e presidência], precisamos pensar o que pode ser feito porque, para isso acontecer naturalmente, teria que esperar o momento em que essas mulheres que tão entrando nas disputas para o Legislativo tiverem a visibilidade suficiente da forma como se organiza a nossa estrutura de carreira política."

A professora concorda que as mulheres são colocadas na posição de vice-governadoras, na maioria dos casos, para resolver uma pendência burocrática. "Essas chapas que têm mulheres como vices são uma forma do partido resolver esse gasto que é obrigatório ser colocado nas mulheres, os 30% [do fundo partidário], e ainda assim os homens manterem a cabeça de chapa. Isso é bem ruim", diz.

Para ela, uma das questões que não é contemplada na legislação é a regulação deste fundo. "A gestão desse recurso precisaria estar na mão das mulheres — ou seja, que existisse um setor específico de mulheres dentro do partido e que esse recurso fosse para elas", afirma.

"Talvez a gente possa repensar isso depois desse momento e de ver essas taxas porque, de fato, o que a gente enxerga, e não é nenhuma surpresa, são os partidos tentando fazer o melhor uso da norma para conseguir alocar aqueles em que eles têm mais interesse, que em via de regra são homens, que estão já há muito tempo no partido."

Candidaturas femininas cresceram apenas 1,6%

No geral, as candidaturas femininas cresceram 1,62% na comparação com 2018. Neste ano, 33,27% dos candidatos são do sexo feminino. Em 2018, elas eram 31,65%. No total, serão 9.353 mulheres na disputa. Há quatro anos, foram 9.204 — um acréscimo de apenas 149 mulheres.

"Este crescimento atribuo efetivamente e apenas à vontade das próprias mulheres. Vimos na Tenda, lidando com as mulheres que queriam entrar para a política, partidos dificultando e derrubando candidaturas de mulheres que queriam se candidatar", afirma Hannah.

O eleitorado feminino, no entanto, terá papel decisivo. Das mais de 156 milhões de pessoas que poderão votar no pleito deste ano, mais de 82 milhões são do gênero feminino e 74 milhões do masculino. O número de eleitoras representa 53% do eleitorado, enquanto o de homens equivale a 47%.

Politicamente, as vices terão como papel, diz Hanna, de conquistar essa parcela dos votos. "Elas vão fazer papel de mobilizar esse eleitorado para quem os homens não se comunicam — então, na visão dos partidos, elas têm papel útil."