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Mais de 300 entrevistas: Natalia Pasternak divulga ciência para todos

Natalia Pasternak, finalista da categoria Influenciadoras do Prêmio Inspiradoras 2022 - Júlia Rodrigues/UOL
Natalia Pasternak, finalista da categoria Influenciadoras do Prêmio Inspiradoras 2022 Imagem: Júlia Rodrigues/UOL

Colaboração para Universa

19/08/2022 04h00

Desde os primeiros dias da pandemia de covid-19, pudemos testemunhar: junto com o número de casos da doença, crescia também a desinformação. A disseminação de notícias falsas sobre medicamentos e as tentativas de desqualificar o surgimento de vacinas colaborou para o drama que vivemos. Na contramão deste processo, lutando justamente para divulgar dados e orientações baseados em ciência, se destacou uma voz feminina.

Presença constante em programas de TV e rádio, além de outras plataformas de notícias, a microbiologista Natalia Pasternak se mostrou incansável na tarefa de esclarecer o público em geral. Ao vivo em rede nacional, não teve o menor pudor (ainda bem!) em criticar uma reportagem de um telejornal que dava dicas de "etiqueta" para, com humor e leveza, repreender pessoas que estivessem sem máscara em ambientes públicos.

"Tem gente morrendo! Não tem humor, não tem leveza. eu não tenho que pedir a permissão do outro para dizer que ele tem que usar a máscara, para ele fazer a coisa certa, para ele tomar vergonha na cara porque ele vai matar alguém", disse aos apresentadores, concluindo a bronca com um pedido de desculpas por ter se exaltado. Nem precisava. Quando o objetivo é salvar vidas e controlar a pandemia, a mensagem tem que ser clara, contundente, acessível ao maior número de pessoas possível. É o que tem divulgado a microbiologista que é uma das finalistas do Prêmio Inspiradoras, na categoria Influenciadoras.

O elogio mais bonito que recebi foi de um rapaz que me disse: 'professora, a USP (Universidade de São Paulo) não chega aqui na favela, mas a senhora chega'. Acredito que tenho conseguido falar para todos os públicos com uma linguagem clara a acessível.
Natalia Pasternak, microbiologista

Só entre abril de 2021 e março de 2022, ela publicou quase 80 artigos em veículos nacionais e internacionais e concedeu mais de 300 entrevistas para jornais, revistas e sites, além de ter participado de cerca de 100 programas de TV, rádio, lives e podcasts. Atualmente, Natalia é colunista do jornal O Globo, da revista The Skeptic, no Reino Unido, e do site Medscape, atua como comentarista na Rádio CBN e no Jornal da Cultura e é professora visitante da Columbia University, nos Estados Unidos.

"Natalia Pasternak se tornou nos últimos tempos uma das principais comunicadoras na área da ciência do país. Com um discurso claro, simples e objetivo, ela consegue espalhar informações de estudos importantes, muitos deles seriam inatingíveis para muitos. Isso a fez também ser capaz de derrubar fake news que põem em risco a vida da população", afirma Adriana Dias Lopes, editora de saúde do jornal O Globo, que acredita que a capacidade que a microbiologista tem de falar de forma didática sobre ciência impactou no perfil da pandemia no Brasil. "Teria sido bem pior sem ela", resume.

Cientista e comunicadora

Paulistana, Natalia, 46 anos, formou-se em biologia na USP. Na mesma instituição, chegou ao pós-doutorado em microbiologia e tornou-se pesquisadora do Laboratório de Desenvolvimento de Vacinas do Instituto de Ciências Biomédicas.

O gosto pela ciência a acompanha desde cedo. Na adolescência, devorava livros de ficção e de divulgação científica graças à influência do pai. Isaac Asimov, Arthur Clarke e Carl Sagan eram autores de cabeceira da jovem Natalia. "Quando entrei para a faculdade de biologia, o projeto Genoma estava no auge e com muita evidência na mídia. Eu me encantei com as aulas de genética e de microbiologia", recorda.

A paixão da microbiologista pela pesquisa sempre passou também pelo desejo de comunicar os avanços da ciência. A pesquisadora também escreve livros de divulgação científica e ganhou, junto com o marido, o jornalista Carlos Orsi, o Prêmio Jabuti de 2021, na categoria "não ficção - ciências", com "Ciência no cotidiano: Viva a razão, abaixo a ignorância!" (Editora Contexto, 2020).

Em 2020, Natalia tornou-se ainda a primeira pessoa brasileira a integrar o Comitê para Investigação Cética (CSI, na sigla em inglês). A instituição americana criada em 1976, para combater o negacionismo da ciência, tem Sagan entre seus fundadores. "É um privilégio estar na instituição que ele fundou, tentando fazer um trabalho parecido com o que ele fazia", diz.

Desse gosto pela divulgação científica, nasceu o Instituto Questão de Ciência (IQC). Fundado por ela e outros três pesquisadores em 2018, o instituto busca promover o pensamento crítico e racional sobre a ciência, e é o primeiro no país a defender o uso de evidência científica nas políticas públicas.

"Na comunicação direta com a população, queremos embasar a tomada de decisão. Por exemplo, por que alguém vai vacinar o filho? Já, com os gestores públicos, podemos orientar sobre diversos temas, como regulamentação de créditos de carbono ou sobre a rotular ou não alimentos transgênicos", cita. Com o IQC, a cientista já participou de várias audiências públicas e oferece assessoria gratuita a parlamentares e gestores que precisam de orientação científica para pensar uma norma ou uma regulamentação.

Com a pandemia, ciência no centro do debate

Os projetos do IQC tiveram de caminhar mais lentamente entre 2020 e 2021 porque Natalia e os outros cientistas do grupo passaram a ser requisitados para falar sobre a pandemia.

"Foi um grande desafio, um período intenso de trabalho em que a gente teve de responder à demanda da mídia para desmentir notícias falsas a todo momento. Era enorme a quantidade de desinformação circulando", lembra a microbiologista, que afirma ter aprendido a importância de repetir as mesmas informações em diferentes veículos e linguagens.

Mais do que desmentir boatos, o importante é fazer a informação correta circular por uma variedade de veículos, estratégias e linguagens. Os cientistas precisam ocupar esses espaços.
Natalia Pasternak

E ela soube conquistar o seu. Em 2020, Natalia foi a vencedora do Ockham Award, prêmio internacional de promoção do ceticismo, organizado pela publicação a partir da própria comunidade científica. Na ocasião (um evento online) recebeu o seguinte elogio de Michael Marshall, editor da revista inglesa The Skeptic:

Durante a crise de covid-19, Pasternak tornou-se uma presença constante na televisão brasileira e na mídia em geral. Milhões de pessoas a ouviram desmentindo conselhos de saúde enganosos e teorias da conspiração pseudocientíficas, e instando o público a confiar na ciência.

Uma questão de gênero

A pandemia trouxe à tona algo que ela nunca tinha notado: o fato de ser mulher lhe causou sensação de desigualdade. Ao se colocar no centro do debate sobre a covid-19, percebeu como as tentativas de desqualificar a fala de uma cientista mulher são mais agressivas do que quando se trata de um pesquisador.

"O ataque direcionado à mulher é mais pessoal. O homem é acusado de ser pago pela indústria farmacêutica ou de ter uma agência oculta. Já a mulher é chamada de louca, histérica, indelicada, deselegante", afirma Natalia, que ainda enumera críticas às roupas ou à maquiagem.

Nunca vi um colega homem ser acusado de estar com a barba mal feita, o termo amassado ou de usar a mesma camisa em todas as entrevistas.
Natalia Pasternak

Os comentários desse tipo que sofreu durante as aparições para comentar sobre a pandemia fizeram Natalia lançar um novo olhar sobre o período na universidade. "A impressão que tenho é de que, até certo ponto, homens e mulheres estão em pé de igualdade na ciência, mas, quando a gente olha para os cargos de chefia, percebe a diferença. Há muito mais homens como diretores de unidade, reitores, pró-reitores", afirma.

Como já era de se imaginar para alguém que tem o dom da boa expressão como ela, Natalia também tem colaborado para diversificar a ciência. A repercussão de seu trabalho como comunicadora lhe rendeu convites para falar para meninas e jovens mulheres na ciência.

"É muito importante ter modelos para as mulheres, os negros, os indígenas e a comunidade LGBT. É um privilégio poder ser um modelo para essas garotas, não só de uma mulher na ciência, mas de uma mulher que não tem medo de se colocar em público. Eu não me importo de ser xingada de louca, histérica, deselegante. Podem dizer o que quiserem, eu vou continuar falando", afirma.

Sobre o Prêmio Inspiradoras

O Prêmio Inspiradoras é uma iniciativa de Universa e do Instituto Avon, que tem como missão descobrir, reconhecer e dar maior visibilidade a mulheres que se destacam na luta para transformar a vida das brasileiras. São 21 finalistas, divididas em sete categorias: Conscientização e acolhimento, Acesso à justiça, Inovação, Informação para a vida, Igualdade e autonomia, Influenciadoras, Representantes Avon. Para escolher suas favoritas, basta clicar na votação a seguir. Está difícil se decidir? Não tem problema: você pode votar quantas vezes quiser. Também vale fazer campanha, enviando este e os outros conteúdos da premiação para quem você quiser. Para saber mais detalhes sobre a votação, basta consultar o Regulamento.

O Prêmio Inspiradoras é uma iniciativa de Universa e Instituto Avon, que tem como missão descobrir, reconhecer e dar maior visibilidade a mulheres que se destacam na luta para transformar a vida das brasileiras. O foco está nas seguintes causas: enfrentamento às violências contra mulheres e meninas e ao câncer de mama, incentivo ao avanço científico e à promoção da equidade de gênero, do empoderamento econômico e da cidadania feminina.