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Casamento abalado? Comunicação Não-Violenta pode ajudar. Saiba como

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Imagem: iStock

Glau Gasparetto e Thaís Lopes Aidar

Colaboração para Universa, de São Paulo

31/08/2022 04h00

Conhecida pela sigla CNV, a Comunicação Não-Violenta propõe uma abordagem mais empática e cooperativa na hora de se comunicar dentro de relações, sejam profissionais ou pessoais. Bastante incentivado na educação dos filhos, o método também pode ser eficaz para reestruturar um casamento abalado.

"Quando escutamos esse termo, é muito comum imaginarmos que comunicação violenta tem a ver com xingar, falar alto. Acontece que, às vezes, a violência está na sutileza, em uma fala ou movimento que fazemos para a pessoa se sentir envergonhada, com medo ou culpada", pontua Nolah Lima, uma das fundadoras do Instituto CNV Brasil.

Segundo ela, essas reações comuns são como um piloto automático, de tão enraizadas. É aí que entra a técnica, apresentando conceitos e ferramentas para se relacionar de um modo mais assertivo e compreensivo. Desta forma, a pessoa fala o que precisa e encontra mais chance de ser ouvida e construir, coletivamente, um caminho de colaboração.

CNV na prática

O objetivo maior da Comunicação Não-Violenta é mudar o jeito de agir diante de um conflito. Quase uma regra, o que se vê por aí são conversas com intenção de mostrar quem está certo ou quem ganha a discussão. Tal comportamento costuma pautado em dois pontos: julgamento alheio e, também, autojulgamento.

São essas bases que mudam quando o método é aplicado, ou seja, duas novas habilidades são construídas: escutar a si mesmo com empatia e escutar o outro igualmente de forma empática. Assim, a pessoa deixa sua posição de julgadora.

A conversa entre casais

Pensamentos como " tinha que saber o que eu quero" ou, então, "se me amasse de verdade, faria tal coisa..." são comuns em boa parte das relações amorosas. Conforme argumenta Nolah, isso está ligado às crenças de imposições, julgamentos e medo da vulnerabilidade.

"Estar com alguém pode parecer a única forma de atender necessidades de afeto, conexão, apoio e parceira. E, quando o outro não parece capaz de cuidar disso, vamos direto para o piloto automático, atacando, se defendendo ou fugindo", expõe a profissional, que mudou o próprio casamento através da CNV.

Da experiência pessoal, ela conta que o processo não foi fácil nem rápido, mas necessário ao perceber que sua forma de se comunicar estava afastando-a de pessoas queridas - além de notar uma violência consigo mesma.

Ao levar o conceito da CNV para a relação, Norah identificou que a experiência foi como aprender uma nova linguagem de amor. "Foi essencial no meu casamento, principalmente depois de termos uma filha. É incrível como nos tornamos mais humanos e acolhemos a vulnerabilidade um do outro, de maneira cuidadosa e, ainda assim, sabendo colocar limites", afirma.

Não há problema em começar sozinha

De acordo com Jade Arantes, também fundadora do Instituto CNV Brasil, é mito acreditar que as duas pessoas da relação precisam estar comprometidas com a proposta, para que ela seja adotada. Embora o processo seja mais fácil e até prazeroso quando acontece em dupla, a prática pode começar individualmente.

"Conversar descrevendo o que aconteceu sem apontar o dedo e procurar culpados, falar sobre os sentimentos com centramento e autorresponsabilidade e fazer com que suas palavras sejam janelas para que o outro compreenda o que te motiva a cada momento são alguns dos convites da CNV. É contagiante!", mostra Jade.

O mais provável, na realidade, é que a pessoa até comece a jornada sozinha. Entretanto, a partir das mudanças e dos novos comportamentos, o par será motivado a ingressar na CNV, trazendo ainda mais benefícios à relação. Dentre tantas vantagens, a fundadora destaca não ser mais preciso guardar os incômodos, ou seja, deixar de expressar os sentimentos por medo de impactar a relação.

"Aprendemos a nos comunicar verdadeiramente, sem acusações ou culpabilizações, e a escutar por trás de qualquer mensagem o que é realmente - e não uma ofensa ou crítica. Isso desperta coragem em abrir as conversas difíceis e transformar conflitos em oportunidades de conexão, alcançando mais confiança, reciprocidade, intimidade, alegria e a experiência de que realmente pertencemos naquela relação", afirma.

Não acontece do dia para a noite

Se parece ser incontestável o auxílio da CNV quando aplicada corretamente, é bom saber que os frutos não serão colhidos no dia seguinte. Trata-se de um processo gradual, logo, é preciso paciência para ver a evolução e foco para não desistir no meio do caminho.

"Quando estamos no início da jornada, é comum que os parceiros não consigam reagir conectados com os princípios em momentos desafiadores. E qual é a tendência automática? Entrarem em processos de cobrança. Por isso, as conversas de reparação são tão importantes nos momentos seguintes", explica Jade, que garante maior naturalidade do processo ao longo do tempo, deixando de exigir tanto "esforço".

Alternativa contra separação

A CNV pode, sim, ser recurso para quem está tentando evitar uma iminente separação. "Se ainda há uma intenção de continuar a relação, o diálogo pode contribuir para transformar os conflitos vivenciados em oportunidade de compreensão mútua, estabelecimento de mudanças possíveis e recombinados, necessários para que a relação tome um outro rumo", defende Cristiane Chaves, também fundadora do Instituto CNV Brasil.

No entanto, o uso do diálogo empático se mostra eficiente também para o encerramento saudável de uma relação, com respeito, reconhecimento e cuidado. A CNV pode colaborar, sobretudo, nas decisões e conversas difíceis de um término, que costumam envolver os cuidados com os filhos, ajustes financeiros, acertos na moradia, entre outras questões.

"As decisões tomadas em conjunto, a partir do diálogo, têm mais chances de serem honradas e cumpridas após o fim da relação", comenta Cristiane.

Para começar hoje mesmo

Nada de deixar para depois! Quanto antes começar a praticar a Comunicação Não-Violenta, mais rapidamente os seus resultados e mudanças comportamentais serão sentidos. A seguir, Cristiane lista dicas práticas para começar já:

  • Esteja atento ao que está sentindo e precisando numa relação;
  • Antes de partir para uma conversa, separe o que realmente aconteceu do que é apenas interpretação e histórias que você conta a si mesmo sobre os acontecimentos;
  • Inicie conversas para expressar a sua honestidade, contando um pouco mais sobre a própria experiência, ou seja, o que está sentindo, precisando e espera ver acontecendo nesta relação;
  • Faça pedidos claros e específicos, que expressem exatamente a ação que espera do outro. Lembre-se: pedidos não são exigências e o outro tem a possibilidade de dizer "não" à solicitação;
  • Abra-se para verdadeiramente escutar o par, com uma curiosidade genuína. Escute-o para compreender e não para retrucar, justificar, corrigir, educar ou convencer;
  • Ao divergirem, lembre-se que é possível escutar o outro de forma empática, ainda que não concorde com ele. Empatia não é concordar;
  • Aprecie e agradeça pequenas e grandes ações do outro, contando como aquele gesto contribuiu para a sua vida.