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'Doença da Lua me trouxe urgência de viver', diz Daiana Garbin

A pequena Lua, que completa 2 anos em outubro, com os pais, Daiana Garbin e Tiago Leifert - Divulgação
A pequena Lua, que completa 2 anos em outubro, com os pais, Daiana Garbin e Tiago Leifert Imagem: Divulgação

Débora Miranda

De Universa, em São Paulo

17/09/2022 04h00

"Lua? Mas eu não conheço ninguém que se chama Lua!" O ano era 2020. A jornalista Diana Garbin e o apresentador Tiago Leifert conversavam sobre o nome da filhinha que estava por vir. "Exatamente por isso! A nossa filha vai ser a única Lua que a gente conhece", argumentou o pai. E assim ficou decidido.

Lua nasceu em 28 de outubro e 11 meses depois foi diagnosticada com retinoblastoma, um câncer ocular raro, que atinge normalmente crianças até os 5 anos. "Nunca vou esquecer o momento em que o médico nos deu o diagnóstico. Mas eu só lembro as primeiras frases dele. Depois, é como se fosse um borrão. Acho que entrei em algum estado de negação. Foi um choque", conta Daiana. "A gente morreu um pouquinho naquela hora."

Ainda que estivessem enfrentando um momento delicado, os dois decidiram que seria importante falar publicamente sobre a doença da filha. E, em janeiro deste ano, publicaram um vídeo em suas redes sociais explicando sobre a doença e as formas de detecção, importantes para o diagnóstico precoce —que não tiveram e que pode evitar cegueira e morte da criança.

"Eu e meu marido conversávamos: 'Nestes meses em que a gente não está falando sobre isso, quantas crianças será que têm um tumor crescendo dentro do olho e os pais não estão sabendo? E quem sabe a gente falando eles vão consultar um oftalmo e ter um diagnóstico'." Decidiram, então, levar o assunto à tona e trabalhar para divulgar informações a respeito.

Hoje, lançam oficialmente a campanha "De Olho nos Olhinhos", que terá uma ação no parque Ibirapuera entre as 10h e as 16h, com a presença de médicos, para informar sobre sintomas da doença e falar da importância de levar crianças pequenas ao oftalmologista. "É a nossa missão a partir de agora", diz Daiana.

Em entrevista a Universa, a jornalista falou sobre o tratamento de Lua, os momentos mais difíceis que viveu ao receber o diagnóstico e a luta para divulgar informações sobre o retinoblastoma. Leia trechos abaixo.

Toda mulher tem um pouco de medo de ser mãe

A jornalista Daiana Garbin - Divulgação - Divulgação
A jornalista Daiana Garbin diz que a maternidade é o mais importante em sua vida
Imagem: Divulgação

"A Lua nasceu e acendeu uma luz em mim. Ela me trouxe alegria, a sensação de ser a coisa mais importante na vida de alguém. A maternidade é muito especial e é uma grande surpresa. Acho que toda mulher tem um pouco de medo de ser mãe, e eu tinha também. Por isso talvez eu tenha postergado e acabei sendo mãe com quase 40 anos. Mas já durante a gestação, eu passei a ter uma força, uma coragem, um amor que eu não conhecia antes."

Urgência de viver

"Uma mãe nunca está preparada para receber a notícia de que um filho, um bebezinho tão pequeno, está com câncer ou com qualquer doença muito grave. A gente se preocupa com coisas como: será que vai conseguir mamar, será que vai ter febre, será que vai dormir à noite? Mas o impacto de ouvir 'Seu bebezinho está com câncer' é devastador.

Ao mesmo tempo, a doença da Lua me trouxe uma urgência de viver, uma coragem, uma força, porque eu preciso aproveitar com ela todos os dias, todos os minutos. A maternidade traz muito cansaço, muita exaustão e, quando a gente percebe que o nosso filho está com uma doença grave, passa a querer estar grudada com ele todos os minutos.

Eu tenho o privilégio, claro, de ter um trabalho que me permite estar muito em casa e ficar muito com ela. Engravidei na pandemia e passei toda a gestação e pós-parto na pandemia. Fiquei grudada nela o tempo todo. E depois do diagnóstico mais ainda, por todos os cuidados com o tratamento, a quimioterapia. Falo que eu não passei mais do que quatro ou cinco horas até hoje longe da Lua. A gente tem uma relação muito próxima. Acho que eu dependo muito mais dela do que ela de mim."

Um grande borrão

"Nunca vou esquecer do momento em que recebemos o diagnóstico, mas eu só lembro das primeiras frases do médico. Depois, é como se fosse um borrão. O restante da consulta, quando o médico explicou como ia ser o tratamento e o que a gente tinha que fazer, eu não ouvi. Lembro que cheguei em casa e o meu marido dizia: 'Daiana, agora a gente tem que fazer isso, o médico falou aquilo'. Acho que entrei em algum estado de negação. Depois, nos outros dias, é que eu fui elaborando aquilo? A gente costuma dizer que a gente morreu um pouquinho naquela hora do diagnóstico, porque ficamos completamente sem chão. Acho que nada define melhor do que a sensação de estar em queda livre."

Tiago Leifert, Daiana Garbin e a filha, Lua - Divulgação - Divulgação
Tiago Leifert, Daiana Garbin e a filha, Lua
Imagem: Divulgação

48 horas em pouco tempo

"A gente teve o diagnóstico num dia, já fez um exame de fundo de olho no dia seguinte, ressonância no dia seguinte, porque precisava descartar metástase. Essas primeiras 48 horas foram muito difíceis, e eu não me lembro exatamente de cada passo. Para mim foi como se a gente tivesse vivido tudo aquilo em poucas horas. É até difícil de explicar a sensação.

Eu pensava: 'Mas ela é uma menina saudável, brinca o dia inteiro, sorri o dia inteiro, pula o dia inteiro, ela enxerga tudo, não é possível. Vamos procurar uma outra opinião, você vai ver que amanhã a ressonância vai mostrar que eles se enganaram e que ela não tem nada'. Mas a gente teve a alegria de começar o tratamento o mais rápido possível.

Recebemos o diagnóstico no dia 29 de setembro do ano passado. Era uma quarta-feira. Fizemos todos os exames até sábado. Na terça-feira, a gente já teve a primeira sessão de quimioterapia. A Lua fez quimioterapia intra-arterial, que é uma quimioterapia por cateter, que joga o medicamento direto nas artérias do olhinho."

Não podia mais esconder das pessoas

"A gente só tornou [o diagnóstico] público no final de janeiro, porque no começo era muito difícil. A gente não estava preparado para expor isso e também estava na correria do tratamento, buscando forças, tentando entender o que estava acontecendo. Aí, em janeiro, a gente começou a perceber que não podia mais esconder das pessoas, porque tornar público o diagnóstico da Lua era colocar um microfone para que todas as famílias e todos os pais pudessem ter o diagnóstico precoce de suas crianças. Entendemos que precisávamos falar, e essa é nossa missão agora."

O momento mais difícil

"Enfrentamos momentos muito difíceis. Eu acho que o pior para mim foi o diagnóstico, mesmo, o início do tratamento. Várias vezes, eu chorei muito. Acho que nos primeiros seis meses eu chorei todos os dias. E imagino que todas as mães que estejam passando pelo que a gente está passando também se sintam assim. Você questiona, você se pergunta, você daria tudo para estar no lugar do seu filho.

Ver um filho sofrer é a maior dor que uma mãe pode viver. E veja que interessante: a gente sofre mais do que a criança, quando ela é pequena. Porque ela não sabe muito bem o que está acontecendo.

A Lua voltava da sessão de quimioterapia e, na manhã, seguinte ela estava correndo pela sala, querendo brincar. As crianças têm uma força, uma capacidade de superação que nos move, que nos torna fortes. A alegria das crianças ajuda na cura. E a gente sempre tentou se manter forte para conseguir ir junto com a Lua.

É claro que algumas vezes em que eu estava triste ela percebeu, aí ela me abraçava. As crianças sentem o que a gente sente. Então, com certeza, chorei muito e tive momentos muito difíceis. Quero dizer para todas as mães que estão passando por isso que o meu coração está com vocês. Imaginar não ter os nossos filhos é a maior dor que uma mãe pode viver."

Mensagens de outras mães

"Desde que a gente soltou o primeiro vídeo contando do diagnóstico da Lua, recebe inúmeras mensagens. Algumas de mães que descobriram retinoblastoma, mas também de mães que descobriram outras doenças nos olhos dos filhos. Por isso a nossa campanha se chama 'De Olho nos Olhinhos'. Soubemos de famílias que tinham crianças com diagnóstico de autismo porque iam mal na escola, não interagiam, não faziam lição e, na verdade, a criança tinha sete graus de miopia e não enxergava nada. Só que a criança não sabe que ela não enxerga nada, porque ela nasceu assim.

A gente tem um sonho, que é mudar o jeito que o Brasil trata a saúde dos olhos. A grande maioria das crianças não vai ao oftalmologista antes de ter algum problema na escola, com seis, sete anos. Ninguém leva os filhos pequenos, é raríssimo. A gente nem sabe que precisa. E existem inúmeras doenças que precisam ser diagnosticadas cedo para que a criança não fique cega nem tenha outros problemas."

Lua cada vez melhor

"Neste momento, a doença da Lua é considerada estável. Ela já passou por quimioterapia, braquiterapia, só que o retinoblastoma é uma doença muito traiçoeira. Os médicos sempre deixam muito claro para a gente que, pelos próximos anos, o tumor pode voltar a se desenvolver, porque os olhinhos das crianças, as células da retina, se desenvolvem muito rapidamente nessa fase da vida —até os cinco anos. Por isso a gente não fala em cura.

A gente encontrou os tumores da Lua bastante avançados já, o que os médicos chamam de grau E. Eles regrediram muito, mas é preciso um acompanhamento de perto para não deixar esses tumores voltarem a crescer. Se cresce um pouquinho, o médico já faz quimio de novo, já faz laser, já faz crioterapia, enfim, tem uma série de tratamentos que podem ser feitos. Esse tumor é danado! Então, fazemos exames a cada três semanas. Mas com muita alegria posso dizer que ela está cada vez melhor."

De Olho nos Olhinhos

"Nesta jornada de um ano do tratamento da Lua, a coisa mais importante que a gente aprendeu é sobre o diagnóstico precoce. O retinoblastoma é um tumor que se origina dentro do olho, só que ele vai crescendo e pode ir para o cérebro, para o sangue, para a medula, pode dar metástase e por isso é uma doença tão perigosa e que pode ser fatal. É isso que nós precisamos evitar.

Quando diagnosticado dentro do olho, a chance de cura é de 90%. Então, o nosso sonho com esse evento que acontece hoje no Ibirapuera é que a gente nunca mais no Brasil descubra um retinoblastoma fora do olho.

Teremos uma cartilha com todas as orientações aos pais e médicos voluntários atendendo, explicando sinais e sintomas, ensinando a tirar uma foto com flash do olho das crianças —porque o olhinho saudável precisa ter um reflexo vermelho. Quando esse reflexo é laranja, de alguma outra cor ou branco, que parece um olho de gato, pode ser um sinal de retinoblastoma ou de outras doenças."