Ameaça do PCC e ciúme de marido: as queixas de candidatas nas eleições
Uma candidata a deputada estadual do interior de São Paulo recebeu ameaças atribuídas ao PCC, facção criminosa do Estado. Outra, que concorre a uma vaga na Assembleia Legislativa de Minas Gerais, teve um problema familiar: o marido não aceitava seu envolvimento na política.
Situações como essas vividas por mulheres nas eleições de 2022 levaram o Instituto Vamos Juntas, entidade nacional criada no final de 2019 para fortalecer campanhas femininas, a oferecer atendimento psicológico às candidatas. Desde abril, a organização começou a oferecer acompanhamento para elas até o fim das eleições, em outubro. O objetivo é minimizar as violências que as mulheres passam durante a campanha política, uma vez que muitas delas são novatas e tem pouca experiência.
"Queríamos tornar essas campanhas mais competitivas", explica Larissa Alfino, presidente e cofundadora do Vamos Juntas. "A gente começou a pensar no apoio jurídico e contábil. Mas estourou a pandemia, e a palavra 'desistir' foi ficando cada vez mais presente naquela rede. Foi quando vimos que era preciso um suporte emocional", conta a presidente do coletivo, que hoje apoia 150 mulheres de 18 partidos por todo o país.
O atendimento psicológico gratuito foi uma demanda das próprias candidatas. "A distribuição do fundo eleitoral é muito desigual, elas não têm acesso a recursos, então acabam não priorizando a questão de saúde mental."
Os atendimentos são semanais ou quinzenais e realizados por psicólogas voluntárias —hoje são 62 duas profissionais envolvidas no projeto em esquema de plantão. Desde o início do projeto, 105 candidatas receberam o atendimento.
Síndrome de impostora e crítica de familiares são principais queixas
"Não vou aguentar", "meu marido não aceita que eu entre na política", "na minha cidade, não dá para fazer campanha nas redes sociais, é de porta em porta e eu me expus muito", "perdi emprego por conta da campanha". Esses são outros relatos que candidatas contaram às profissionais do Vamos Juntas.
A psicóloga Mariana Luz, que faz a supervisão clínica do atendimento, percebe que questões emocionais e violência política de gênero são as principais causas de desistência.
Já as principais questões que levam as candidatas a buscarem apoio psicológico são dificuldades de lidar com a família durante a campanha e a "síndrome da impostora" —tendência a se sabotar por uma percepção de si mesmo como incompetente.
"Elas não recebem apoio dos pais e maridos, ouvem dos amigos coisas como 'por que você está se envolvendo com política' ou questionamentos como 'você é mulher, será que mulheres aguentam trabalhar com política?'. São muitas dúvidas sobre si mesmas, e isso está diretamente ligado com o machismo", diz Mariana.
"Isso traz impactos e prejuízos à saúde emocional. Entendemos que não é só eleger mais mulheres, a gente precisa oferecer uma estrutura que não pode ser só jurídica", diz.
Para a psicóloga, o cuidado com a saúde emocional traz mais possibilidade de campanhas femininas terem êxito.
"Nosso trabalho existe para diminuir o impacto que existe na autoestima das mulheres para que a gente tenha menos desistências. As candidatas relatam que ter o apoio e saber que pode contar com alguém toda semana ajuda a trilhar essa trajetória até as urnas" Mariana Luz, psicóloga do Instituto Vamos Juntas
"Mulheres em campanha têm forte sensação de solidão"
Assim que as eleições de 2018 terminaram, o Vote Nelas, coletivo suprapartidário e independente que nasceu em abril daquele ano, realizou a pesquisa qualitativa "Jornada da Candidata" para entender os principais problemas das campanhas na eleição e em 2016,. Queriam entender como solucioná-los nos próximos pleitos, explica Karolina Bergamo, jornalista e cofundadora do Vote Nelas.
"Listamos na pesquisa vários impactos para a saúde mental das candidatas, como falta de apoio dos partidos —muitas mulheres saem desse processo endividadas— desgaste físico, comentários machistas, entre outros."
As respostas sobre a experiência destas mulheres, diz ela, ajudaram a instituição orientar candidaturas neste ano e passar orientações para que as mulheres conseguissem se manter saudáveis.
"Passamos orientações às equipes de campanha e partidos para que eles estejam preparados para ser rede de apoio. Desde coisas como garantir que a candidata tenha tomado um bom café da manhã para sair para a rua a ter um espaço de escuta ativa. As mulheres sentem uma sensação de solidão muito grande neste processo", diz Karolina.
"É mais difícil ser mulher e candidata porque elas sofrem mais com fake news e assédio. Então trazemos essa importância para que a equipe, partidos e familiares estejam atentos ao cuidado emocional dessa candidata", afirma.
A principal ação do Vote Nelas foi criar embaixadas do projeto nos municípios, para dar oficinas de preparação para a campanha envolvendo as esquipes das candidatas. O projeto já qualificou 22 mil pessoas.
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