Ela não vai para Copa por medo de transfobia: 'Não arriscaria a minha vida'
Você pensaria duas vezes diante de uma proposta para acompanhar de perto a Copa do Mundo no Catar e um possível hexacampeonato da seleção brasileira? Se for uma pessoa LGBTQIA+, talvez sim, como fez a influenciadora digital Bryanna Nasck. Ela desistiu de acompanhar o evento da Fifa no país muçulmano por medo de sofrer transfobia, por causa das leis restritivas do país.
Em junho, Bryanna recebeu uma proposta de uma marca brasileira para produzir conteúdo publicitário durante a Copa. Ela contou a Universa que não quis nem ouvir a proposta financeira.
"Recusei na hora. Não teria como ir a um país em que LGBTfobia, misoginia e machismo são leis de Estado", afirmou. "Por mais que seja maravilhosa a oportunidade de assistir aos jogos, como uma pessoa trans e não-binária, não cogitaria colocar minha vida em risco."
Catar proíbe homossexualidade e ativismo LGBT
Bryanna faz referência a legislações que criminalizam a homossexualidade no país. Desde que foi anunciado como anfitrião, em 2010, o Catar foi criticado pelas restrições e pela falta de proteção a LGBTs, mulheres e imigrantes.
O código penal do país afirma que pode ser aplicada a Lei Sharia, como é chamado o sistema jurídico do islamismo, para impor pena de morte a homossexuais.
O país também proíbe a sodomia, que significa sexo anal, e pune quem "seduzir" um homem a praticar tal ato, referindo-se a uma relação homossexual. A prisão é de até três anos. Condena, ainda, o casamento entre pessoas do mesmo sexo e a realização de campanhas e manifestações por direitos LGBTQIA+.
"Não tenho a garantia nem mesmo em um estado democrático, já que o Brasil é o país que mais mata pessoas trans no mundo. Imagina onde a transfobia é legalizada. Minha saúde mental já está fragilizada para eu ter que fingir algo que não sou", afirma Bryanna.
Fifa tenta manter boa imagem do torneio
A um mês do mundial, a Fifa faz um esforço para tentar equilibrar tradições culturais e religiosas locais com a chegada de mais de um milhão de torcedores e faz um esforço para garantir a imagem do torneio.
No início do mês, por exemplo, circulou nas redes sociais uma arte que incluía uma série de recomendações contra alguns "comportamentos" para que "se respeite a cultura e a religião do Catar". Na lista, constavam ser LGBT, e também a sugestão de não ingerir bebida alcoólica, evitar afagos em público e agir de alguma maneira que seja considerada "despudorada".
O Comitê Organizador da Copa do Mundo do Catar 2022 declarou que a mensagem não é oficial e garantiu que as portas estão abertas para os torcedores e turistas durante o primeiro torneio mundial em um país árabe. Também afirmou que a entidade orientou as autoridades do país a permitirem manifestações contra discriminação— que são esperadas durante todo o evento.
Ainda assim, Bryanna considera a viagem perigosa. "Não dá para saber se os estádios serão territórios neutros. Além disso, e nos outros locais, onde o próprio Estado endossa um discurso LGBTfóbico? Não posso me sujeitar a algo assim só porque a Fifa quer provar que é seguro. Acho que a Copa pode até ser tranquila para algumas pessoas, mas só para brancas e cis", diz.
A influenciadora diz que não tem qualquer arrependimento em ter negado a proposta. "Depois de dez anos, estou tendo oportunidades comerciais que não envolvem só ser uma pessoa trans, mas meu posicionamento é importante para as marcas. Tive muita dificuldade para ganhar dinheiro na internet e conquistar espaço. Hoje, não me sujeito a estar em uma campanha que não faça sentido para mim, posso recusar. Não há dinheiro no mundo que pague vender o que se acredita que é certo."
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