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Mulheres grávidas podem malhar? Especialistas respondem

andreonegin/Getty Images/iStockphoto
Imagem: andreonegin/Getty Images/iStockphoto

Glau Gasparetto e Thaís Lopes Aidar

Colaboração para Universa, em São Paulo

24/10/2022 04h00

Adotar a premissa de que gravidez não é doença costuma ajudar a mulher a continuar com as suas atividades habituais ao longo dos nove meses. Isso vale, inclusive, para a prática de exercícios físicos, algo bastante incentivado, mas com certas restrições.

Praticar atividades físicas na gravidez, mesmo com todas as alterações fisiológicas e anatômicas que o período traz, resulta em uma série de benefícios. Entre eles, estão: a prevenção do ganho de peso, da diabetes e hipertensão gestacionais; a melhora na consciência corporal e postural; e o fortalecimento do assoalho pélvico.

"A gestante pode fazer todos os exercícios, mas deve-se avaliar o custo-benefício de cada atividade. Sendo assim, evitam-se exercícios com risco de queda, com contato físico, com alto impacto, em altas temperaturas e, também, mergulho esportivo", exemplifica a ginecologista e obstetra Rejane Santana.

Embora exista uma recomendação geral para se movimentar ao longo da gravidez, é importante lembrar que cada caso deve ser avaliado individualmente.

Por essa razão, Rejane reforça pontos importantes e preventivos nessa questão: a orientação e supervisão de um profissional de educação física, avaliação prévia, adequação e trabalho multidisciplinar, unindo obstetra, fisioterapeuta, professor e nutricionista.

O corpo da mulher na gestação

Na condição de entender a individualidade de toda mulher, surge também a importância de compreender as mudanças que o corpo enfrenta enquanto está gestando, o que vai influenciar na definição da rotina de exercícios.

"Quanto mais a barriga cresce, mais equilíbrio o corpo precisa ter. A região mais sobrecarregada, sem dúvidas, envolve a lombar e a pelve, seguida dos membros inferiores. A musculatura do assoalho pélvico irá sustentar o peso do bebê, e a musculatura lombar, abdominal e a região glútea irão ajustar esse centro de gravidade, trabalhando intensamente", explica a fisioterapeuta Raquel Silvério, diretora clínica do Instituto Trata, em Guarulhos.

Com base nisso, a especialista em fisioterapia músculo-esquelética ressalta que existem dois caminhos. Entre as mães habituadas aos exercícios devem continuar com os treinos, mas com liberação, orientação e acompanhamento profissional. Já para as mulheres que querem iniciar atividades, ela sugere as mais leves, como caminhadas, pilates e hidroginástica.

Em relação às contraindicações, a lista é menor. "Quando a gestante está habituada à prática esportiva, não existem restrições, exceto se algo colocar em risco o bebê ou ela mesma, conforme avaliação médica. Fora isso, se ela costuma correr, andar de bike ou nadar, por exemplo, pode continuar a praticar, apenas diminuindo o ritmo", indica Raquel.

Além da assertividade nos exercícios, a fisioterapeuta salienta ser necessário suspender a atividade a qualquer sinal de cansaço. Isso porque ocorrem mudanças também nos sistemas cardíaco, pulmonar e renal da gestante.

Para cada trimestre, uma orientação

Diferente do que muitos pensam, a maior restrição em relação às atividades físicas acontece logo no primeiro trimestre. De acordo com a personal trainer Samorai, especialista em movimentos e treinamento 3Dimensional, a recomendação é não iniciar novas rotinas nesse momento, pois é uma fase de maior adaptação.

"A exceção é se for algo tranquilo, como um relaxamento na piscina, meditação ou caminhada leve. Nisso, não há problema algum, desde que a mulher respeite os sinais que o corpo lhe dá", reforça.

O segundo trimestre é uma fase de maior liberdade. É nesse momento que costuma ocorrer uma liberação médica mais abrangente para os exercícios. Como a barriga ainda não está muito grande, é possível até potencializar as capacidades da gestante, sobretudo a força, que será muito necessária meses seguintes.

Na reta final, ou seja, no terceiro trimestre, o crescimento e o peso da barriga começam a interferir nas práticas. "A mulher pode continuar o que já faz, conforme aguentar, porque nessa fase já começa a aparecer o cansaço, a cair a mobilidade e os movimentos passam a ficar mais comprometidos", aponta Samorai.

Benefícios X prejuízos

Mas, afinal, o que acontece se a grávida não se exercitar? O personal trainer considera dois cenários possíveis: ao dizer "não" para os exercícios, a tendência é uma gestação e parto mais árduos, já que o corpo não se preparou, nem se adaptou. Com isso, dores, diabetes gestacional e problemas circulatórios podem dar as caras.

Já quem se exercita tende a ganhar pontos extras nessa corrida, desde que as práticas tenham sido adequadas. Ou seja, de nada adianta passar os nove meses praticando aquilo que não deve. Nesse caso, o exercício trará problemas e não benefícios.

Foi quase isso que viveu a personal trainer Talita Bitencourt, 37 anos, de São Paulo, mãe da Isabela, de 3 anos. "Como trabalho com isso, parar de me exercitar em algum momento da vida estava fora de cogitação. Quando engravidei, conversei com a minha médica sobre isso e ela me liberou por eu já estar habituada a essa rotina, desde que monitorasse a frequência cardíaca", conta.

No segundo mês, Talita focou em exercícios mais adaptados. Preocupada com a ocorrência de diástase, ela passou a praticar atividades físicas específicas diariamente, o que fortaleceu sua musculatura.

"Com uns sete meses, minha barriga ainda nem parecia de grávida, já que não ia para a frente devido aos exercícios. Quando o bebê passou a crescer muito, começou a ser um incômodo agonizante. Como a musculatura não permitiu o crescimento da barriga, os outros órgãos foram 'empurrados', sendo mais comprimidos do que deveriam. Isso me deu muito mal-estar, azia. Não conseguia me alimentar, tinha falta de ar", relata.

Ao final do sétimo mês, Talita mal conseguia ia para a academia. "Decidi parar com os exercícios de diástase e a barriga foi para a frente. É como se o feitiço tivesse virado contra o feiticeiro, porque, mesmo com tanto cuidado e atividade física, aconteceu comigo. Levo a lição de que cada corpo responde de uma maneira e isso não está sob nosso controle ", reconhece.

A diástase, que a personal trainer Talita tentou evitar, é um afastamento dos tecidos da região abdominal causado pelo enfraquecimento da região e resulta em flacidez, principalmente na lombar, segundo Carolina Curci, especialista em ginecologia, obstetrícia e reprodução humana, e diretora técnica da Clínica Curci.

"Vamos imaginar: durante a gestação, o útero aumenta de tamanho, ocupando toda a cavidade pélvica. Depois, vai para toda a cavidade abdominal e aí afasta, cada vez mais, essa musculatura. Há relatos de até 12 cm de afastamento. Os exercícios físicos de autoimpacto não são recomendados, pois o músculo já está fragilizado. Mas natação, pilates e RPG são ótimos, porque fortalecem postura e musculatura abdominal", esclarece a médica.

Cuidados essenciais

Carolina aponta algumas situações que freiam a prática de exercícios, como ameaças de abortos, sangramentos e placenta prévia, por exemplo. De acordo com ela, "tudo aquilo que for patológico e não estiver compensado impede a sobrecarga do organismo pela atividade física".

"Então, se a paciente tem um aporte diferente, já praticava exercícios físicos antes da gestação e engravidou, pausamos a intensidade no primeiro trimestre, só mantendo caminhada. Passou esse perigo de aborto até as 12 semanas, pode estar liberada para fazer exercício. Aconteceu qualquer episódio, volta a ser proibido", ilustra a ginecologista.

Por fim, a especialista reforça também a importância em se preparar para esse momento. Isso porque quanto maior for a preparação, melhor será a gestação. Ela recomenda consultar um cardiologista, endocrinologista e ginecologista antes mesmo de gestar, apostando na medicina preventiva para se precaver.