'Confiante no que sou': elas apostam na sensualidade fora dos estereótipos
Hadassa Baptista entra no palco do Faustão na Band e já atrai olhares para si. Ela é uma das bailarinas do programa e, diferentemente de todas as outras garotas com quem dança diariamente na TV, é careca. E é justamente isso, segundo ela, que a tornou, há cinco anos, uma mulher sensual.
A modelo Letticia Munniz também descobriu sua sensualidade há pouco tempo. Até então, buscava a magreza como forma de ser atraente. Hoje, confiante, posta fotos de biquíni e lingerie mostrando as dobras de seu corpo quando bem entende. Mas se diverte ao lembrar que quando está fazendo gravações ou fotos publicitárias sempre recebe das colegas o feedback de que seu olhar é sensual demais. "E eu nem estou olhando com essa intenção, às vezes estou apenas curiosa com alguma coisa", ela diz rindo.
Ambas passam longe do estereótipo antigo do que se entendia por sensualidade. Até os anos 90, o símbolo máximo do que era ser sexy era Pamela Anderson correndo pela praia na série americana Baywatch. Peituda, loira de cabelos longos, branca e com corpo escultural, a atriz era praticamente uma Barbie que criou vida. E a atriz andou muito na praia até que Hadassas e Letticias pudessem andar ao seu lado: sem a pressão da sensualidade dentro de padrões inalcançáveis, as mulheres seguras parecem ainda mais sexy.
Cabelo é sensualidade?
Hadassa Baptista é modelo e bailarina e tem 24 anos. Quando era criança, no colégio, sofria racismo e ouvia ofensas relacionadas com seu cabelo. "Eu achava que deveria alisar para entrar em um padrão e fiz isso durante toda a infância, mas nunca me reconheci naquele cabelo liso. Mais tarde, quando entrei no balé, ficou difícil cuidar, fazer coque. Por isso comecei a cortar", ela conta.
À época, sua inspiração era a cantora Rihanna - copiava dela os cortes e penteados até que se viu apenas com uma franja. "Aí pensei: 'chega, está na hora', e raspei a franja também aos 19 anos".
A bailarina conta que foi assim que descobriu sua própria personalidade e força. "A sensualidade vem nesse momento. Não adianta querer copiar ou encaixar em um padrão de alguém, porque sempre vai ser uma cópia, não vai ser você", reflete.
Sua busca, segundo ela, foi tirar o cabelo e se encontrar. A sensualidade e o poder estavam em ser uma mulher fora do padrão que não precisa do cabelo para ser bonita. "Basta ser você mesma e ir se encontrando", ela diz.
"Acho que ser sensual é ser confiante no que você tem e no que você é. E a busca também é um caminho, também faz parte dessa construção. Foi a partir daí que eu me achei." Hadassa Baptista, dançarina
Sexy é ser confiante
Letticia Munniz viveu por muitos anos a pressão por um padrão estético inalcançável: para ser sexy, teria que ser magra como as mulheres que via na internet e na televisão. Hoje com 33 anos, conta que começou recentemente a quebrar esses estereótipos e tirar padrões que estavam em sua cabeça há muito tempo. "A vida toda acreditando em uma coisa [o padrão de beleza do corpo magro] e há cinco anos parei de lutar contra mim mesma. A gente aprendeu que só de tal forma seríamos completas e felizes. Desconstruir isso é muito difícil", ela diz.
Mas por mais segura que esteja, Letticia ainda vê que o público duvida: "Eles dizem que ninguém quer ser assim, ninguém quer ter meu corpo. Parece que estamos sempre em busca da aprovação masculina. Às vezes estamos fazendo algo em nosso visual que achamos que é para a gente, mas pode ser para agradar um homem. É difícil se sentir bem, confiante e confortável no próprio corpo, quando você não está dentro de um padrão e ainda busca agradar o outro", diz.
"Não ficar me cobrando é o que me trouxe todos esses sentimentos bons que tenho hoje. Então, quando falamos em sensualidade, eu penso em liberdade. A minha liberdade de não me cobrar para estar dentro dos padrões me permite me sentir sensual, seja para mim ou seja para o outro" Letticia Munniz, modelo e influenciadora
Ser sensual não tem nada a ver com sexo ou relacionamentos
Rachel Moreno, psicóloga especializada em sexualidade humana (USP) e autora do livro "A beleza impossível - Mulher, mídia e consumo" (Editora Ágora), fez um estado para a Fundação Perseu Abramo e Sesc sobre sexualidade com homens e mulheres.
De muitas entrevistas, um relato chamou a atenção: uma mulher viúva do segundo casamento reencontra com o primeiro marido. Ela passa a sair com ele para dançar: nada além disso, pois estava apenas interessada na sensualidade da dança. A conclusão do trabalho era que, para as mulheres, ser sensual era muito mais importante do que efetivamente fazer sexo.
Rachel liga essa associação de estética a sensualidade a uma máxima antiga: "Se eu não cuido de mim, é porque não me amo. E se eu não me amo, quem vai me querer?". Cuidar de si realmente pode ser um fator de aumento de confiança em si mesma - a questão é que quando o movimento começa pela estética ou pela aprovação do outro pode apontar para um caminho errado.
"Sensualidade não é só dentro de um relacionamento. É para a gente também: é olhar no espelho e sentir-se sensual. E eu só consigo me sentir assim porque eu não me pressiono, não me cobro mais para entrar dentro do que dizem que devo. Sinto-me livre. Sou sensual porque eu sou eu: uma mulher forte e determinada. E eu amo quem eu sou", diz Letticia, que garante seguir seu instinto ao cuidar do corpo: faz o que é para si; quando percebe que é para agradar outra pessoa, não faz mais.
Redes sociais trazem pluralidade
Depois de muitas décadas exaltando o padrão de beleza tradicional da Barbie americana, cabelos longos esvoaçantes, magreza e peitos grandes, temos um respiro atualmente nas redes sociais. "Na pandemia, as mulheres ficaram em casa e todo mundo engordou um pouco. Nem por isso as pessoas deixaram de se fotografar e de buscar aprovação nas redes. Acabamos assim criando um contraponto ao padrão de beleza tradicional", ela diz.
Mulheres reais como Letticia e Hadassa ajudam a aumentar a autoconfiança da mulher: ao aparecerem na mídia como são - e se mostrarem sensuais assim - fazem com que mais gente perceba a potência escondida fora de um estereótipo. Essa mudança recente já tem trazido frutos às gerações mais novas, que têm acesso à informação e convivem com mães e tias que já não perpetuam em sua criação aqueles velhos estereótipos.
Hadassa é otimista em relação a busca por si mesma: "Não tem problema nenhum você não saber quem é e se encontrar. O problema é passar a vida copiando um padrão que não existe. Não existe padrão de beleza", reforça.
Avançamos em relação ao trote de Pamela Anderson nas areias da Califórnia? Bastante. Mas estar confortável com a beleza fora do padrão ainda não é uma realidade para todas: "A mulher se espelha em corpos inalcançáveis diariamente em espaços de mídias. A chance de mudança, ao meu ver, está no fato de os homens hoje representarem 30% do consumo de produtos estéticos. Quem sabe homens e mulheres, juntos, possam se rebelar contra essa pressão estética em alguns anos?", imagina Rachel.
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