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Empresária é incluída em lista de boicote bolsonarista: 'Estou com medo'

Dona de uma loja de produtos médicos descobriu que tinha entrado em lista de lojistas boicotados por terem votado no PT em Araras (SP) - iStock
Dona de uma loja de produtos médicos descobriu que tinha entrado em lista de lojistas boicotados por terem votado no PT em Araras (SP) Imagem: iStock

De Universa, em São Paulo

04/11/2022 15h05

"Acordei com várias mensagens de amigos no WhatsApp". Foi assim que a empresária Rosana Berto, 54 anos, dona de uma loja de produtos médicos, descobriu que tinha entrado em uma lista de lojistas que estão sendo boicotados por apoiadores de Jair Bolsonaro (PL) em Araras, no interior de São Paulo. Ela agora teme por sua integridade física.

"Na lista tinha meu nome e o nome da minha loja. Eu sempre fui de esquerda e, como moro em uma cidade pequena, todos sabem. Mas me assustei com o ódio e a intolerância. Isso nunca existiu. Se perdeu, perdeu, e cada um segue a sua vida", diz a comerciante, em entrevista a Universa.

Rosana sempre trabalhou com comércio —na próxima semana, sua loja completa um ano— e afirma que a lista de boicote proposta por eleitores do presidente tomou proporções gigantescas em uma cidade como a dela. "Não temo pelo dinheiro, mas tenho medo de ser agredida, de ter minha loja depredada", diz ela à reportagem. A foto que acompanha este texto é meramente ilustrativa, para preservar a entrevistada.

Rosana viu em um dos prints das conversas que mandaram para ela que quem colocou o seu nome e o de sua loja na lista foi a sua cabeleireira, profissional que sempre cortou seu cabelo. "Nas mensagens, também tinha um rapaz dizendo que tinham mesmo que boicotar os petistas, falando palavrão, dizendo que são demônios. Eles não me conhecem, nunca entraram na minha loja, não sabem como eu sou. Como podem falar coisas assim?", questiona.

Ela relata que esse tipo de comportamento da população faz com que ela sinta que seu sonho "está escapando entre os dedos".

"Chorei muito essa noite. Essa loja era o meu sonho. Montei o negócio para que eu pudesse atender da minha forma, dar o desconto para os mais pobres da maneira que eles merecem, doar o que eu achar que posso doar. Vêm as pessoas e destroem isso", desabafa.

Ela diz, ainda, que está com medo de fazer o evento de aniversário da loja. "Tenho medo de que não venha ninguém, e isso é muito triste. As pessoas são preconceituosas e falam palavras horríveis, jogando nossos sonhos fora", diz, emocionada.

Apesar disso, ela não pretende mudar sua rotina de trabalho.

"Eu fico sozinha na loja. Chego de manhã e vou embora à noite. Às vezes, quando entra alguém desconhecido, já fico com medo. Sou muito afetiva, gosto de dar um tratamento diferenciado, mas estou travada", conta.

Colegas também foram afetados

Para combater o clima de ódio, aqueles que entraram na lista estão fazendo um trabalho reverso. Eles criaram uma outra, desta vez com os lojistas que votaram no PT e estão precisando de apoio.

"Hoje de manhã recebi um áudio de um senhor que trabalha vendendo ovos e legumes em sua garagem. As pessoas descobriram que ele votou no PT e não foram mais comprar nada com ele. É ele quem planta os legumes e os ovos são de suas próprias galinhas", diz Rosana, citando um dos comerciantes da cidade boicotados por bolsonaristas.

Rosana diz que está atendendo pessoas que chegam falando que sabem que ela está na lista e que foram comprar em sua loja por solidariedade. "Não sei o quanto isso vai me ajudar ou me atrapalhar. Mas insisto que meu medo não é perder dinheiro, e sim, a violência."

Ela e outros lojistas já procuraram um advogado e afirmaram que vão tomar as medidas legais cabíveis.

"Estamos entrando com uma ação. O advogado perguntou se eu pretendo processar essas pessoas, e quero, sim. Quero mostrar que internet não é um mundo sem lei", diz Rosana, acrescentando que "não se pode nem sair de vermelho na cidade por medo de agressão".

Segundo ela, até quem votou em Lula por não gostar de Bolsonaro entrou na lista. "São pelo menos 50% das pessoas. Eles procuraram fotos nas redes sociais ou algo que a pessoa falou na fila do banco ou do mercado que teve uma conotação que acharam que era petista, e viralizou", finaliza.