Gincana tensa e frustração: quem conseguiu comprar no 1º dia da Shein em SP
Não havia liquidação ou qualquer agrado para atrair as 7.000 pessoas que foram conhecer a loja da Shein em São Paulo, que abriu no sábado (12). Pelo contrário, o que aguardava a clientela no dia de abertura eram filas de mais de oito horas e muita confusão. A recompensa? Cerca de 20 minutos de compra, numa dinâmica que se assemelhava à de uma gincana tensa.
Os funcionários da Shein se dividiram entre a assistência às compras e o controle do fluxo de gente para garantir o esvaziamento da loja e só então liberar a entrada do próximo grupo de 20 clientes. "Pessoal, faltam cinco minutos para encerrar o tempo de vocês", ecoava do microfone a voz de um dos funcionários, o que botava uma pressão extra sobre aqueles que ainda tinham araras a explorar.
A expectativa foi a culpada pelo que deu errado na abertura. De um lado, o subdimensionamento da empresa —a organização não esperava as milhares de pessoas que compareceram à inauguração na capital paulista. Do outro, a expectativa dos consumidores da marca por uma experiência de compra semelhante à do site, com uma infinidade de coleções e peças de estilos diversos, tudo a preços baixos, bem abaixo da média no mercado.
A verdade é que não cabe uma Shein no espaço de 265 metros quadrados que abriga a loja temporária em São Paulo. Pelo menos não a Shein que os consumidores esperavam. A aposta da plataforma chinesa para a sua temporada paulistana foi trazer peças de um estilo mais cosmopolita e urbano, identidade que a marca entendeu que coincidiria com o público da capital. Nos manequins, vestidos e saias de paetês. Nas araras, estampas, jeans e texturas. Só que muitos visitantes estavam atrás de modelos para o verão e acabaram se frustrando.
A influenciadora digital Paloma Jesus, 27 anos, abandonou a empreitada no meio. Chegou ao shopping pouco depois das 10h, após uma hora de trânsito e uma corrida de R$ 100 em aplicativo, mas logo ficou sabendo que a loja não tinha o que ela queria. "Vim para conhecer e comprar um chinelo nuvem, porque a marca tem várias opções no site, mas já sei que não trouxeram para cá", contou. No site, o modelo custa em torno de R$ 45. "E tem maquiagem na loja? Acessórios", questionavam os retardatários do começo da tarde, já desanimados com a extensão da fila. Mesmo com a negativa, muitos ainda ficavam para descobrir o que mais poderiam garimpar na loja.
Apesar do mau humor generalizado, agravado pelo calor da aglomeração, dos maldizeres de quem saiu insatisfeito da loja, além do cansaço das horas de espera, pouca gente abandonou a fila para entrar na loja da Shein. O que justifica tanto desgaste apenas para comprar roupas?
O fator preço
Sem nunca ter comprado na Shein, Karina Macedo, 32 anos, saiu do trabalho direto para a fila, que já dava a volta no quarteirão do shopping. Acompanhada da amiga, que já conhece a marca e a convenceu a ir na inauguração, fez muito esforço para tentar comprar algo. Não por não ter gostado do que viu, mas por não ter encontrado o que buscava no acervo da loja. "Os preços são ótimos. Gostei de um moletom, que pretendia levar de presente, mas eles não têm mais o tamanho que eu quero. De resto, só vi blusas de malha, renda, com estampa e barriga de fora, modelos que eu não uso", conta. Depois de mais de cinco horas de espera, ambas saíram de mãos abanando.
Do outro lado da loja, Luana Dias, 37 anos, foi mais bem-sucedida na sua empreitada, ainda que não tenha encontrado tudo o que buscava. O acervo das categorias masculina e infantil é pequeno na loja de São Paulo —divide um mezanino, enquanto as roupas para mulheres ocupam o primeiro andar inteiro—, mas Luana estava ali para experimentar os looks.
Cliente da Shein há anos, Luana se limitava a comprar lingeries e produtos de decoração para casa na plataforma, porque tinha receio do caimento e da qualidade das peças. Seu marido e sua filha, no entanto, só compram roupas pelo site. A partir de agora, ela também diz que vai passar a consumir. "Vou pagar R$ 65 em um vestido infantil. Em outras lojas do shopping, essa peça não sai por menos de R$ 100. Este aqui [um modelo de vestido curto] não tem um tecido tão bom, mas só os paetês já compensam. Eu vi um modelo parecido outro dia por R$ 250, sendo que estou pagando R$ 118 aqui", fala, mostrando suas aquisições.
Com a limitação do tempo, Luana acabou saindo sem experimentar as roupas que havia selecionado e insatisfeita com o que chamou de "desorganização do evento". Demorou para que a Shein tomasse uma providência para lidar com as expectativas do grupo, cujo enfileiramento ocupou todos os corredores do primeiro andar do shopping. As senhas só começaram a ser distribuídas perto das 16h, e muitas pessoas que esperavam havia mais de oito horas ficaram fora da "linha de corte" do primeiro dia.
O fator marca
Contrário às expectativas de que a Shein tem apelo apenas para a geração Z, a fila preferencial dobrava o corredor do shopping. Na outra fila, mães e filhas, pessoas de todas as faixas etárias, aguardavam pelo seu momento de ir às compras. Mas dentro da loja, os mais contentes eram mesmo os mais jovens.
Depois de quase sete horas de espera, a fotógrafa Paloma Mallentini, 29 anos, tinha menos de um minuto para tomar uma decisão: escolher entre levar uma blusa rajada de azul e um body branco com textura. Cliente da Shein há anos, aproveitou a abertura da loja física para comprar uma calça jeans nova. Além da calça, saiu com mais seis peças. "Já conheço e gosto da experiência online, então hoje eu vim com um objetivo, mas, no fim, estou saindo com muito mais", diz. Ao encostar no balcão, sacou o celular para comprovar o post no Instagram com a hashtag que dava direito a 15% de desconto na compra.
No grupo seguinte, a modelo Julia Piccazzio, 19 anos, era uma das mais tranquilas dentro da loja. Enquanto os outros 19 clientes se debatiam para encontrar peças, ela posava para selfies com um vestido brilhante. Foi à abertura atrás de peças para sair à noite e blusas de verão para suas próximas viagens. Encontrou exatamente o que queria —e em pouquíssimo tempo.
De volta à fila, um dos grupos mais ansiosos era o de Agatha Christie, 25 anos. Para ela, que veste tamanho PP, é difícil encontrar roupas nas lojas brasileiras que sirvam bem. Sapatos para um pé 33, então, nem se fala. "Só encontro salto para mim na Shein", conta, enquanto mostra a última compra pelo aplicativo: uma sandália verde limão com salto geométrico.
Agatha e suas amigas compram na Shein toda semana, estimuladas pelas barganhas e pelo programa de pontos da marca. De acessórios a looks completos (com blusa cropped, saia e salto iguais aos da modelo na foto), o segredo, conta Agatha, é fazer pequenas compras com frequência, para garantir o selo de fidelidade e ainda ter a chance de receber a encomenda em até sete dias em casa. Ela e seu grupo ganharam as últimas senhas distribuídas no sábado e foram atendidos quando já passavam das 22h30. A espera de mais de 13 horas para entrar na loja se justifica, segundo ela, porque "não existe nada parecido com a Shein para a gente aqui no Brasil hoje".
Um desfecho menos feliz foi o de Natália Barros, 26 amps, e seus quatros amigos, que às 16h30 descobriram que não iriam conhecer a loja porque as 500 senhas estabelecidas para o dia acabaram exatamente na sua vez. Fã da Shein e compradora tão assídua quanto Agatha, Natália se disse extremamente decepcionada com a experiência. "Não compro mais na Shein. O que aconteceu hoje, depois de todo este tempo na fila, foi muito decepcionante. A compra no site é ótima, mas eu me senti desrespeitada aqui", desabafa.
O fator Shein
Poucas marcas podem se vangloriar de arrastar milhares de pessoas para comprar aquilo que elas poderiam ter em alguns cliques. A Shein é uma delas. Se ainda havia questionamentos sobre o fenômeno em que se transformou a plataforma chinesa no mercado brasileiro, a experiência da loja em São Paulo não deixa mais margem para dúvidas.
"Nós, que consumimos moda nas redes sociais e gostamos de um estilo mais urbano, não encontramos essas peças com facilidade em outras lojas aqui no Brasil, onde as coleções são sempre coloridas, com estampas floridas, nesse estilo mais tropical", conta Agatha. Mas, mesmo os maiores fãs, depois de tanto desgaste, podem desanimar.
A experiência física da marca precisa ser revista. Talvez a Shein não tenha dimensionado bem o seu apelo por aqui, mas, para seguir com os planos de levar lojas para outras capitais e, assim, cair nas graças do brasileiro, precisa corrigir a rota —seja com mais organização, seja com mais peças.
O dia seguinte
No final da tarde de sábado, a Shein anunciou que mudaria sua estratégia para os próximos dias de funcionamento da loja física em São Paulo. Neste domingo (13), o espaço foi aberto excepcionalmente às 10h —diferentemente do horário do comércio de shopping, que costuma abrir às 14h. Foram distribuídas 500 senhas para visitar a loja, respeitando a ordem de chegada. As senhas se esgotaram no início da tarde.
Outros 500 clientes que ficaram na fila ontem e não conseguiram vaga também ganharam senha para hoje. A fila estava mais organizada. Os grupos de entrada foram formados por 40 pessoas, o dobro do liberado no sábado, mas o tempo de permanência na loja para compras seguia limitado a 20 minutos e o limite de peças para a entrada no provador ficou em apenas quatro por cliente.
Na segunda-feira (14) e na quarta-feira (16) serão distribuídas 800 senhas. Na terça (15), que é feriado, serão distribuídas 500 novas senhas. A distribuição de senha, via de regra, será para o dia. Então, as pessoas precisam ir à loja na data para conseguir uma vaga.
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