Após anos na Ambev, cearense cria startup de vinho em lata: 'Mulheres amam'
A cearense Jaqueline Barsi, 36 anos, construiu uma carreira de sucesso no mundo corporativo. Durante 11 anos trabalhou na área de marketing da Ambev e recebeu prêmios como o de melhor modelo de negócios e case pela cerveja Magnífica no Festival Creative X, promovido pela Anheuser-Busch InBev (AB InBev), em Nova York. O destaque veio pela bebida valorizar as tradições maranhenses, com um modelo que desenvolve a cadeia produtiva da região e promove engajamento social.
Tudo ia bem e Jaqueline não tinha planos de sair da companhia. Até que, com a pandemia, ela passou a atuar em home office e decidiu mudar para o Rio Grande do Sul, onde o então namorado morava. "Afastada fisicamente do ambiente corporativo, comecei a olhar o trabalho de outra forma. Já havia conquistado muita coisa, comandava um time de 50 pessoas, mas tudo parecia vazio. A sensação que tive é de que tirei a cabeça de uma piscina e respirei", diz.
Foi aí que ela decidiu dar outro mergulho. "Eu amava pegar o carro e visitar as vinícolas da região. E comecei a pensar em fazer disso meu negócio, um recomeço. Ao refletir, percebi que o momento mais gratificante e feliz da minha carreira tinha sido o projeto da Magnífica, no qual muitas famílias de agricultores foram impactadas. Era isso que queria fazer com as vinícolas do sul", diz.
Começou a estudar o mercado e deu vida, em setembro de 2021, à Artse Vinhos, que comercializa a bebida em lata. O primeiro lote do vinho rosé precisou de reposição de estoque apenas três meses depois do lançamento e, após o primeiro trimestre de vendas, a empresa atingiu um faturamento mensal de R$ 40 mil.
A ideia é movimentar a cadeia de pequenos produtores e levar aos consumidores os mais variados vinhos brasileiros, que sejam leves e refrescantes. "Em nosso portfólio, cada vinho é elaborado em uma vinícola diferente e a ideia é termos novos lançamentos todo ano", conta Jaqueline. Apesar de não abrir o faturamento atual, o negócio cresce a cada mês e, hoje, os produtos podem ser encontrados em hotéis, restaurantes, eventos, lojas de conveniência e pequenos empórios, como o Quitanda, na região oeste de São Paulo.
Além disso, em dezembro, ela vai lançar o podcast "Fazer diferente faz diferença", uma parceria com a BP Money. "Toda semana, eu e minha sócia, Izabela Dolabela, vamos entrevistar uma empreendedora para dividir suas experiências em negócios", adianta.
'Não me reconhecia sem crachá'
O caminho até aqui não foi fácil. Isso porque, segundo ela, o trabalho era a parte mais importante de sua vida. "Estava em São Paulo, longe da minha família, e respirava trabalho e resultado. Era bitolada mesmo", conta. Além disso, muita coisa aconteceu ao mesmo tempo. "Terminei o namoro, pedi demissão e precisei me reinventar. Não sabia me reconhecer sem o crachá; minha agenda era toda preenchida pelo trabalho e era difícil me ver de outra forma. Tive de entender, a fundo, quem eu era", afirma.
Segundo Jaqueline, estar afastada fisicamente do trabalho ajudou muito nessa reflexão. Além disso, ela pode retomar alguns hobbies e se conectar com pessoas diferentes e que tinham outras experiências de vida, principalmente com amigos empreendedores. "Foi muito bom ouvir erros e acertos por meio das histórias de outras pessoas para começar a entender aquilo que seria a minha trajetória", diz.
Ao descobrir que gostaria de trabalhar com os pequenos produtores, ela reforçou as visitas e observou que muitos deles faziam um ótimo trabalho da porta para dentro, mas tinham dificuldade de levar os produtos ao mercado. Decidiu, então, fazer um curso de sommelier e buscou tendências fora do Brasil.
"Cheguei ao vinho em lata, que permite mais praticidade e menos desperdício", afirma. "As mulheres veem vantagem em não ter de consumir uma garrafa inteira de vinho de uma vez quando estão sozinhas, por exemplo, além de acharem mais fácil o fato de não ter rolha", diz.
O segundo passo foi ouvir o consumidor. "Antes de criar a Artse Vinhos, fiz um estudo minucioso com enólogos, sommeliers e consumidores para definir qual seria o conceito da empresa, o posicionamento e os vinhos. Tudo foi desenhado com base no perfil dos consumidores", diz.
Com as primeiras amostras desenvolvidas, ela selecionou 50 mulheres, público-alvo do negócio, para enviar os vinhos e colher feedbacks. "Enviava os produtos com um pequeno questionário e, após isso, marcava uma reunião com as pessoas", diz. Dessa forma, conseguiu entender o que estava bom e o que precisaria de ajuste. "No vinho rosé, por exemplo, precisamos mudar algumas coisas, pois estava muito seco", diz.
Mais cooperação, menos competição
Jaqueline destaca que o relacionamento foi um pilar essencial para a criação e o sucesso do empreendimento. "Bem diferente do mundo corporativo, quando você quer abrir um negócio, tem muita gente disposta a ajudar. Empreender é mais cooperação do que competição. E a troca de conhecimento foi crucial para o início da empresa", afirma.
Outro ponto foi usar tudo o que aprendeu na Ambev para estruturar a empresa. "Eu sabia fazer pesquisa de mercado, planejamento e todo o processo de desenvolvimento de um produto", diz.
Ressignificar o que é sucesso também entra nessa lista. "No mundo corporativo, a ideia é sempre ser o melhor, se destacar, competir. No empreendedorismo, falamos mais de colaboração e propósito. Ter sucesso não é, necessariamente, ter uma marca milionária, por exemplo. Para mim, é ver meu sonho se realizar, conseguir impactar a vida das pessoas —produtores e clientes— com a minha marca", diz.
É importante, também, estar disposta a aprender sempre e saber que o "não" faz parte do caminho. "Você tem que 'dar a cara a tapa' mesmo, cavar oportunidades e se relacionar com diferentes pessoas, mas tendo em mente que vai ser ignorada algumas vezes e isso faz parte do jogo", diz. Nesse sentido, a resiliência ajuda muito. "Você vai receber muitos 'nãos', mas precisa se manter motivada e afastar a Síndrome da Impostora que, muitas vezes, nos diz que não somos capazes", afirma.
Para as mulheres que pretendem empreender, mas têm medo, Jaqueline sugere começar ouvindo a si mesma: quais são as suas fortalezas e fragilidades? "Entenda o que você faz de melhor e comece por aí. Já para o que não faz tão bem, encontre um sócio com um perfil complementar, que possa te ajudar nessa caminhada", diz.
Outra dica da empreendedora é ouvir histórias de pessoas que fizeram uma trajetória que te inspire. "Eu ouvia muito podcast antes de criar a Artse Vinhos, principalmente aqueles relacionados a negócios e startups, e lia livros relacionados ao assunto", completa.
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