'Casei com meu inimigo da firma: onde há ranço, há amor'
"Sou economista e trabalho com gestão de risco e compliance. Em 2016, fui fazer uma entrevista de emprego e na saída já bati o olho naquele rostinho bonito. Acabei sendo contratada e comecei a trabalhar na mesma equipe que ele. Sentávamos na mesma mesa, um de frente para o outro, na diagonal.
A gente discutia muito, todos os dias. Os dois éramos muito teimosos, cada um queria fazer valer a sua palavra, sua opinião. Eu discordava das ideias dele e ele das minhas. Em pouco tempo viramos inimigos. Ficamos uns seis meses nesse bate-boca diário. Os colegas falavam: 'Vocês brigam muito, isso vai dar em amor'. E a gente falava: 'O que é isso? Vocês estão malucos'.
Uma amiga falou: 'Onde há ranço, há amor'. Chamei-a de maluca, neguei de todo jeito. Hoje penso que já existia um interesse, mas eu não queria enxergar.
Conforme o tempo foi passando, mesmo que a gente continuasse discutindo em relação ao trabalho, fomos nos aproximando, conversando sobre outros assuntos e nos conhecendo.
Um dia, ele perguntou alto no escritório se alguém queria uma carona para Laranjeiras, onde iria visitar a avó. Ele sabia que eu morava lá.
Eu aceitei a carona e uma outra colega aceitou também. Ele acabou levando nós duas, deixou ela primeiro em casa, e no caminho fomos conversando bastante.
Aos poucos, fui mudando minha opinião sobre ele. Começamos a conversar mais, os papos foram ficando mais amigáveis. Passamos a almoçar na mesma mesa, junto com todo mundo. Mas quando o assunto era trabalho, a rixa persistia.
'Passamos seis meses saindo escondidos'
Os dias foram passando e ele começou a visitar mais essa avó em Laranjeiras. Umas cinco caronas depois, teve um dia que a gente parou, se olhou, rolou um clima e a gente se beijou. E aí começamos a sair, mas não contamos para ninguém, ficamos uns seis meses saindo escondidos dos colegas de escritório.
Um dia ele falou: 'Eu sou solteiro, você é solteira, não estamos fazendo nada de errado'. Decidimos ir a um restaurante onde poderia ter gente do trabalho. Foi nossa primeira saída em público. A partir daquele dia, começamos a ficar juntos oficialmente. Quando assumimos na empresa, a reação dos colegas foi aquela: 'Eu já sabia'.
Nos apresentamos às famílias um do outro. Fizemos algumas viagens juntos. Eu sou a louca das passagens aéreas, nesse meio-tempo fui para a China sozinha. Depois fomos juntos para a Colômbia.
Eu já morava sozinha e ele foi deixando uma roupa num dia, outra coisa no outro dia, e em poucos meses decidimos procurar um apartamento maior para nós dois. Voltamos de viagem já para a casa nova. Isso foi no final de 2017. Em 2022, decidimos oficializar a relação.
Estamos juntos há seis anos e casados há um mês. A gente segue discordando, mas o legal da nossa história é que aprendemos a ter muito diálogo.
Somos duas pessoas de opinião firme. Cada um tem um pensamento, cada um quer fazer uma viagem, uma compra. Temos muitos embates, mas aprendemos a sentar e conversar.
Não é fácil sair da casa da sua mãe ou sair da casa em que você morava sozinho e ir dividir a vida com outra pessoa. Se relacionar é difícil. Dividir casa, rotina, planos. O que fortalece é olhar para o outro e pensar: minha vida está junta da dele, então vou fazer o meu melhor para ele estar feliz.
Também prezamos muito pela nossa individualidade. Cada um tem seus amigos, seus momentos sozinho. Se os dois não podem ir num mesmo evento, cada um vai no seu e tá tudo certo.
Ambos passamos por relacionamentos difíceis antes. Então a gente tenta fazer tudo pra deixar mais leve.
Hoje nem eu nem ele trabalhamos naquela mesma empresa, mas ainda compartilhamos a mesma profissão. Ele é gerente de compliance e eu sou coordenadora de riscos e compliance.
A gente troca muito, pedimos ajuda um para o outro nos temas que o outro entende melhor. Acho que temos um equilíbrio legal. O Felipe é mais cartesiano e eu sou muito do coração.
'Picuinha escondia admiração'
A vida traz surpresas que a gente não imagina. Dá para acreditar no amor. Não dá para acreditar que tudo são flores. Mas a gente pode, sim, construir um relacionamento equilibrado, com parceria, amor e conversa.
Ninguém vai pensar do mesmo jeito que o outro. Ninguém vai querer as mesmas cores para a parede da casa, ninguém vai decidir a mesma forma de trabalhar. Mas o diálogo faz toda a diferença.
Hoje a gente vê que aquela picuinha na verdade era cada um querendo mostrar sua opinião, seu conhecimento e também vendo que o outro era muito inteligente.
Querendo ou não, dávamos atenção um ao outro, mesmo que para discordar. Havia uma admiração mútua, um respeito em poder ter uma discussão com uma pessoa inteligente.
Acho que ele pegava no meu pé, mas enxergava uma mulher forte, determinada, com personalidade. E eu gostava dos nossos debates porque ele me colocava para pensar, abria meu leque, abria meu poder de conhecimento. Eu sempre vejo o copo meio cheio."
Jessyca Vargas, 32 anos, economista, do Rio de Janeiro.
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.