Homens devem ler romances pra entender mulheres, diz autora de best-seller
Em vez de carregar seus brinquedos, a escritora americana Lyssa Kay Adams gostava de levar livros, cadernos e canetas em passeios quando era criança. Passados os anos, ela se formou em jornalismo e trabalhou como repórter na redação de um jornal, mas seu grande sonho era escrever histórias de ficção. Conseguiu.
Best-seller mundial, a autora de "Clube do Livro dos Homens" (ed. Arqueiro), que vai virar série na Netflix, esteve no Brasil em novembro, quando participou da Bienal do Livro da Bahia, em Salvador, e conversou com Universa.
Mostrou por suas respostas que não apenas é uma escritora de romances, mas também uma entusiasta das histórias românticas, que vê como ferramentas para tornar o mundo melhor. Principalmente para as mulheres, caso os homens se abram para o gênero e deixem de taxá-lo como "coisa de mulherzinha". "Quando um homem lê um romance, vê o mundo por nossa perspectiva. Isso cria mais empatia e respeito nas relações."
UNIVERSA: Ao contrário de grande parte dos best-sellers românticos, suas protagonistas não são dóceis. Por quê?
Lyssa Kay Adams: Porque os romances, no geral, oferecem padrões fora da realidade sobre como os relacionamentos são. Quero mostrar para as mulheres o que elas devem querer em um relacionamento. E para os homens, como se livrar de alguns comportamentos tóxicos que eles aprenderam ao longo da vida. Um dos comentários mais importantes que recebo das leitoras é que o livro as inspirou a fazer mudanças. A vida é muito curta para ficar com alguém que não nos respeita.
As mulheres fortes dos seus livros também existem na sua vida?
Me inspiro na minha mãe, minha avó, minhas tias, amigas e colegas de trabalho. Elas conquistaram seus caminhos e exigiram o que merecem em um relacionamento: bondade, igualdade e respeito.
Histórias de amor mais leves, as famosas "água com açúcar", ainda são vistas como categoria inferior no mundo literário?
Isso sempre aconteceu. Quando comecei a ler o gênero, escondia o livro por causa desse preconceito.
Há uma tradição antiga no mundo de policiar o que as mulheres gostam e o que elas leem, para controlar. Infelizmente a sociedade julga que, como as mulheres gostam, os romances são algo frívolo e que não precisa ser levado a sério.
Isso acontece até com filmes. Chamam de "chickflix" [termo em inglês que se refere e um longa "de mulherzinha"], e os homens já pensam que não devem ver. Romances sofrem com isso: como são histórias para mulheres, não é literatura.
Os personagens masculinos dos seus livros são problemáticos e decidem ler romances para se tornarem melhores com as mulheres --daí o nome da série, pois criam um clube do livro. Já viveu algum relacionamento em que desejava que seu parceiro fizesse o mesmo?
Sou casada há 22 anos e nosso relacionamento evoluiu muito nesse tempo. Me inspiro muito em meu marido. Mas tenho um trabalho com ele para que se expresse e se mostre vulnerável. Muitas vezes, os homens sentem que não têm permissão para fazer isso, pois veem como fraqueza, e fraqueza é algo que não combina com ser "macho". Para mim, não tem nada mais sexy do que um homem inteligente emocionalmente. Quero mostrar isso para eles nas histórias. Quero que eles leiam e vejam como é começar uma conversa com sua esposa, que não é sinal de fraqueza chorar na frente dela e dos amigos.
Então os homens deveriam ler e assistir a mais histórias românticas?
Sim. Os romances são, geralmente, escritos por mulheres. Quando um homem os lê, vê o mundo pela nossa perspectiva. Acho importante que eles tenham esse olhar de como agimos diferente. E pode ser para coisas pequenas, como quando as mulheres andam nos estacionamentos de shopping com a chave do carro no meio dos dedos para usá-la como uma arma. Para as mulheres, isso é natural. Se eles pudessem ver o mundo pelos nossos olhos e ouvir os nossos pensamentos, acho que criariam mais empatia e respeito nas relações.
Muitos livros, séries e filmes romantizam relações doentias. O que acha disso?
Vejo isso de duas formas: a primeira é que tem muitos romances que mostram relacionamentos assim, que não vão nem nomear o que acontece, são sucesso de vendas e você pensa: "Nossa, esse cara parece um stalker, não um namorado". Mas muitos tocam em assuntos que são tabu e os deixam claros para as leitoras. A maioria dos livros de romances atuais mostram relações saudáveis, com uma boa imagem do sexo e do que as mulheres merecem.
Seu livro vai se tornar uma série na Netflix. Adaptações para as plataformas de streaming fazem as pessoas lerem mais?
Com certeza. A adaptação faz com que pessoas que nunca leriam essas histórias sejam impactadas por elas. Sei que a série "Bridgerton" foi vista por quem nunca tinha lido [obras da autora] Julia Quinn, mas que, depois da primeira temporada, comprou toda a série e se tornou fã. Fico feliz em ver os romances chegando às telas, seja no streaming ou no cinema. O mundo precisa de um pouco de romance. Acredito que essa é a razão pela qual "Bridgerton" fez tanto sucesso. As pessoas estão procurando bondade e paixão no mundo, e isso elas encontram nas histórias românticas.
Qual seu envolvimento com a produção? Sabe, por exemplo, que atriz fará a protagonista?
Meu envolvimento é limitado. Li o script para dar minhas impressões. Sei que ainda há trabalho sendo feito e mudanças que vão acontecer. Mas ainda não há elenco e nem data para começar a filmar.
Qual a sua impressão sobre os leitores brasileiros?
Os leitores aqui são incríveis. Digo isso em todos os lugares que eu vou, mas tem algo nos leitores brasileiros. Eles são queridos, entusiasmados, mergulham nas histórias e amam falar dos livros e dos personagens. Sei que há leitores assim em todos os lugares mas, no Brasil, eles são exuberantes.
Em um de seus livros, "Missão Romance" (ed. Arqueiro), a protagonista vive uma situação de assédio sexual no trabalho. Se inspirou no movimento Me Too?
Sim. É comum ouvir pessoas perguntando por que as mulheres não saem dessas situações de abuso. Por que ela se mantém naquele trabalho? Acho que é importante mostrar que, às vezes, até nós mesmas nos perguntamos isso. Achei que era importante mostrar que nem sempre é fácil para todas as pessoas tomar essa decisão. Não é simples pegar suas coisas e ir embora. Por outro lado, a história também mostra como é ter um homem disposto a derrubar "um dos seus" por causa do comportamento tóxico.
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