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Prostituição e cozinha: como mulheres são tratadas no garimpo

Pista de pouso clandestina para abastecer o garimpo em Paapiú, em território Yanomami - Charles Vincent/ISA
Pista de pouso clandestina para abastecer o garimpo em Paapiú, em território Yanomami Imagem: Charles Vincent/ISA

De Universa, em São Paulo

10/02/2023 04h00Atualizada em 10/02/2023 11h20

O avanço do garimpo ilegal, apontado como uma das principais causas da crise que enfrentam os yanomamis em Roraima, também exerce um impacto na vida das mulheres da região. A pesquisadora Francilene dos Santos Rodrigues, que estuda o tema desde a década de 1990, afirma que as mulheres sempre estiveram presentes na história do garimpo, mas há novas características que permeiam essa relação.

Posição delas no garimpo é predominantemente na cozinha e na prostituição. Além de uma maior inclusão na própria atividade de extração dos minérios, elas desempenham funções de cozinheiras e podem estar submetidas à exploração sexual.

O trabalho das mulheres pode ser muito mais limitado dependendo do acesso ao garimpo. Mas, hoje, algumas delas vão inclusive com o marido. Elas vão para cozinhar, mas também eles querem que elas façam o serviço sexual. Na cozinha, podem ganhar 10g a 15g de ouro, o que, dependendo da cotação do ouro, pode chegar a R$ 5 mil. Francilene dos Santos Rodrigues

Há uma maior presença de mulheres imigrantes, especialmente da Venezuela. Segundo a pesquisadora, com o advento da globalização e, consequentemente, o aumento da mobilidade humana, o garimpo acaba se tornando uma alternativa também para muitos migrantes de outros países.

Um exemplo se dá na relação dos venezuelanos com o garimpo brasileiro. Francilene afirma que, durante uma pesquisa em 2005, a presença destes migrantes era inexistente em garimpos brasileiros. No entanto, dez anos depois, a situação mudou, acompanhando o cenário socioeconômico do país. Por conta da discriminação e xenofobia, os migrantes não conseguem emprego no país e o que vira alternativa é o garimpo.

Às vezes, essas migrantes chegam por meio de uma rede de tráfico de pessoas, diz a pesquisadora.

Mulheres indígenas são extremamente vulneráveis. Denúncias apontam que garimpeiros abusam sexualmente de meninas e mulheres em comunidades indígenas, algo que tem se intensificado com o avanço do garimpo ilegal na região.

Aquela moça que você levou consigo é sua irmã? Se você fizer ela deitar comigo, sendo que você é o irmão mais velho dela, eu vou pagar 5 gramas de ouro. Depoimento de um yanomami sobre o aliciamento de um garimpeiro.

No ano passado, uma indígena de 12 anos morreu após ser estuprada por garimpeiros na região do Waikás, em Roraima.

Os garimpeiros invadiram a comunidade do Arakaça, onde vivem mais ou menos 30 yanomamis. Tinha uma mulher mais velha com a adolescente e uma criança. Os garimpeiros invadiram e raptaram eles. A adolescente foi violentada até a morte. A tia tentou proteger ela e a criança, mas os garimpeiros jogaram a criança no rio. líder indígena Júnior Hekurari Yanomami.

A violência pode ter impacto direto na saúde dos indígenas. Segundo Franciele, houve um aumento de IST (Infecções Sexualmente Transmissíveis) na população, pode ser um reflexo do avanço do garimpo ilegal.

Na medida em que esse garimpo se aproxima dessas terras, meninas adolescentes acabam se tornando mais vulneráveis. O número de ISTs nos indígenas, por exemplo, aumentou. Francilene dos Santos Rodrigues.