Vice-governadoras rejeitam função decorativa e focam na área social
Dos 27 vice-governadores eleitos em 2022, seis são mulheres. À exceção de Pernambuco - cuja chapa vencedora em 2022 foi 100% feminina -, os outros cinco estados elegeram homens para o governo. Se, no geral, paira sobre os vices a desconfiança de que são figuras decorativas, essa suspeita tende a ser mais forte se o cargo é ocupado por mulheres - um reflexo do machismo.
A exemplo do que costuma se observar na atuação das primeiras-damas, mulheres em cargos de vice tendem a atuar em áreas consideradas femininas, ligadas aos cuidados: combate à violência sexual, além de saúde e assistência social. Homens vice-governadores, no geral, trabalham em setores tidos como estratégicos, a exemplo de economia e segurança.
Embora a presença feminina na política seja crítica, já foi pior. Desde 1997, partidos e coligações são obrigados, por lei, a preencher 30% das candidaturas com mulheres nas eleições proporcionais (deputados e vereadores).
Compensação financeira
A lei também determina que 30% dos recursos do fundo eleitoral sejam destinados às candidaturas delas. Até recentemente, esta regra só valia para as eleições proporcionais. Mas, em 2018, o Tribunal Superior Eleitoral determinou que as candidaturas majoritárias (para presidente, governador, prefeito e senador) também contam no fundo eleitoral.
Assim, a presença das mulheres passou a compensar financeiramente. Como resultado, naquele ano, o Brasil elegeu mais mulheres para o cargo de vice do que em qualquer outro momento da história: sete.
"Quando há uma mulher como vice, partidos e coligações podem gastar esse dinheiro na candidatura majoritária. Esse fenômeno começou em 2018 e se repetiu em 2022", explica Eneida Desiree, professora de Direito Constitucional e de Direito Eleitoral da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e idealizadora da ONG Política Por/De/Para Mulheres.
A legislação cria maiores oportunidades para as candidatas na política, mas ainda não é o bastante, de acordo com Thânsia Cruz, diretora de projetos da ONG Elas no Poder, que atua para levar mais mulheres aos espaços de decisão. Uma pesquisa feita em 2020 pela ONG em parceria com o projeto "Me farei ouvir" mostrou que 54% das mulheres ouvidas não tinham intenção de se candidatar a um cargo público.
A seguir, conheça as seis vice-governadoras eleitas em 2022.
Mailza Assis (PP), Acre: "Minha área é a social"
A vice-governadora de Gladson Cameli (PP) já foi, também, senadora pelo Acre no período de 2015 a 2022 — eleita suplente, assumiu a vaga quando Cameli venceu a disputa para governador pela primeira vez. Tem 47 anos e é formada em Direito. Comandou as secretarias de Administração, Assistência Social e Cidadania na Prefeitura de Senador Guiomard. "Levo o trabalho de vice a sério, como os demais cargos que ocupei. Pessoas depositaram confiança em mim, não tenho um cargo sem função", afirma. "Procuro estar presente em todas as áreas. Mas a que atuo naturalmente é a social".
Jade Romero (MDB), Ceará: "Cargo não é secundário"
Formada em gestão pública, tem 37 anos e é vice de Elmano de Freitas (PT). Também comanda a Secretaria das Mulheres. Iniciou trajetória na política nos movimentos estudantis. "Não vejo o cargo de vice como secundário, mas sim uma posição de muita responsabilidade", afirma.
Antes de Jade, outra mulher foi vice no estado - Izolda Cela, que virou governadora quando o titular, Camilo Santana, se afastou para disputar o Senado. Izolda queria concorrer à reeleição, mas foi preterida na disputa com outros candidatos, todos homens. "Em toda a história do estado do Ceará, todos os homens que foram governadores tiveram direito à reeleição", critica a vice-governadora. O episódio envolvendo Izolda fez com que mais atenções se voltassem para Jade. Ela está atenta a isso. Pelas redes sociais, engaja-se na prevenção contra a violência de gênero - incluindo a política.
Celina Leão (PP), Distrito Federal: "A exposição é uma dificuldade"
Governando interinamente o Distrito Federal após o afastamento de Ibaneis Rocha (MDB), ingressou na política após coordenar a campanha de outra mulher, a ex-deputada federal Jaqueline Roriz. Foi deputada federal e coordenadora-geral da bancada feminina na Câmara dos Deputados. É administradora de empresas e tem 46 anos.
"Convencer mulheres a participarem da política é um desafio. Os partidos precisam fazer isso. É tanta exposição, são tantas dificuldades que muitas não querem se candidatar", diz. Para Celina, elas precisam ocupar o posto principal nas chapas. "Geralmente ocupam o lugar de vice. Nossa participação ainda é tímida", afirma.
Hana Tuma (MDB), Pará: incentivo nas áreas técnicas
A vice do governador Helder Barbalho (MDB) tem 55 anos e foi secretária de planejamento do estado. "Precisamos de mais mulheres na política. Não significa que os homens não compreendam ou não sejam sensíveis aos direitos das mulheres, mas é mais fácil defender as prioridades femininas quando se é mulher", afirma.
Formada em ciências contábeis, Hana Tuma atua em áreas em que a presença feminina ainda é mais tímida do que a masculina. Uma de suas metas na vice-governadoria é incentivar outras mulheres a desbravarem espaço em setores mais técnicos "Tenho a oportunidade de inspirar outras técnicas a ter maior participação no poder", afirma.
Priscila Krause (Cidadania), Pernambuco: única vice de outra mulher
Jornalista de formação e vice de Raquel Lyra (PSDB), Priscila Krause tem 45 anos e foi vereadora de Recife durante três mandatos, deputada estadual e candidata à prefeita da capital pernambucana. Tem forte atuação no combate à violência contra a mulher e um motivo de orgulho: Pernambuco é o estado brasileiro com mais mulheres no primeiro escalão: 52% dos cargos.
Marilisa Bohem (PL), Santa Catarina: "É um mundo dos homens"
Antes de ser vice-governadora de Santa Catarina na chapa encabeçada por Jorginho Melo (PL), foi delegada da Polícia Civil durante 30 anos, candidata a vereadora e candidata à vice-prefeita de Joinville. Tem 58 anos. Quando era delegada, costumava ter sugestões ignoradas pelas lideranças políticas. "Não era ouvida. Então decidi entrar na política", conta. De 2012 — quando disputou a primeira eleição —, até hoje, o cenário melhorou para as mulheres, ela avalia. "Na eleição para vereadora, tive dificuldade para conquistar o voto das mulheres. Agora, isso não acontece".
A experiência na polícia fez com que se sentisse confiante em postos de liderança, mas afirma que a política ainda é agressiva para elas. Muitas não se candidatam por medo, diz. "É um mundo dos homens". Como vice, uma de suas principais bandeiras é o combate à violência de gênero.
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