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'Até a verificada do Instagram': coaches ensinam a fisgar crushes nas redes

Coaches relacionamento - web - Arte UOL
Coaches relacionamento - web
Imagem: Arte UOL

De Universa, em São Paulo

09/03/2023 04h00

Sentada na extremidade de um sofá de tecido cinza, Letícia Felisberto, 25, sorri para a câmera. Tem as pernas cruzadas, veste camiseta branca, calça jeans com rasgões nos joelhos e meias beges, sem sapatos. Dependendo da posição em que é filmada, vê-se uma parte diferente da casa, localizada em Florianópolis (SC): ora uma parte externa, com piscina e palmeiras; ora uma cozinha em estilo americano, desfocada.

A bela casa é a locação do "Papo Infalível", um dos cursos oferecidos pela Universidade dos Homens, plataforma virtual fundada por Letícia em 2020 com a missão de ensinar métodos supostamente infalíveis para conquistar mulheres — qualquer uma, "até a verificada do Instagram". "É como se fosse uma faculdade: o que o cara não aprendeu na vida, em casa ou na escola, ele aprende comigo", afirma a empresária, única professora da plataforma. Dividido em oito módulos de aproximadamente 25 minutos cada, o "Papo infalível" oferece técnicas para conversas por mensagens de texto — uma vertente de cursos que cresceu desde o período de isolamento social da pandemia de covid-19.

A especialista em relacionamentos e autointitulada "melhor amiga dos homens" — ela evita se apresentar como coach, pela má fama que o termo angariou nos últimos tempos — tem mais de 273 mil seguidores no Instagram e afirma ter ajudado, desde 2020, cerca de 20 mil homens a conquistarem a mulher desejada. O público-alvo dos cursos são homens solteiros, heterossexuais, com idade entre 25 e 40 anos - embora, segundo Letícia, não sejam raros os casos de senhores com mais de 60 anos pagando pelas aulas. O acesso à plataforma custa R$ 247.

A criadora de conteúdo Letícia Felisberto se autointitula "a melhor amiga dos homens" - Marcelo Pereira Martins - Marcelo Pereira Martins
A criadora de conteúdo Letícia Felisberto se autointitula "a melhor amiga dos homens"
Imagem: Marcelo Pereira Martins

Sem palavrões e obviedades

Logo após o Carnaval, o estudante de medicina Rafael Reis, 24, de Petrolina (PE), participou do curso a convite de Universa. Divertiu-se com as dicas sobre como iniciar uma conversa com uma garota. Mas teve receio de que, ao agir ao modo ensinado por Letícia, soasse artificial. "No geral, acho que essas questões de flerte são muito individuais. Cada pessoa reage de maneira diferente a uma mesma abordagem", avalia Rafael.

A principal recomendação de Letícia para os alunos é que buscam se diferenciar. Devem evitar abordagens diretas, como "olá, gostosa, você tem namorado" ou burocráticas, a exemplo de "oi, tudo bem?". Para evitar esses erros, devem seguir um método criado por ela e batizado de OCA, sigla para "observar, criar contexto e abordar".

Em linhas gerais, o método sugere ao homem stalkear a moça pretendida, descobrir seus interesses e, com base nessas informações, partir para o ataque - que deve ser sutil. "Pegue o que observou e crie um contexto que permita o efeito 'ninguém nunca'. A gata vai dizer: 'Eita, porra, ninguém nunca me abordou assim'". Letícia aconselha os alunos a evitarem gírias, palavrões e obviedades. Não se deve, por exemplo, dizer a uma garota que ela é deusa, linda ou princesa. "Cara, ela sabe que é bonita e recebe esse tipo de elogio todos os dias". "A mágica é o contexto", afirma Letícia, em entrevista ao Universa.

Preconceito com aplicativos de relacionamentos

Cursos similares direcionados a mulheres também têm feito sucesso na internet. A esteticista e cosmetóloga Ana Lúcia de Jesus Gomes, 37, de São Bernardo do Campo (SP), procurou um treinamento em técnicas de flerte por texto após assistir a um vídeo sobre o assunto no Instagram. Cansada de permanecer solteira, desembolsou 297 reais e inscreveu-se no curso "Sedução Online", criado pela "especialista em conquista" Luíza Vono, 40, de Londrina (PR). Ana Lúcia considera que o investimento valeu a pena. "Aprendi a criar conexões. Entendi que preciso ter uma vida interessante e leve", diz. Ela ainda está solteira.

"Percebi que muitas mulheres têm preconceito com aplicativos de relacionamento. Sentem medo de ficar com a imagem ruim, caso façam uso da ferramenta", afirma Luíza Vono, a criadora do "Sedução Online". "No curso, mostro que estes aplicativos são ótimos para conhecer homens", diz. Ela tem 892 mil seguidores no Instagram e seis funcionários para trabalhar na logística do "Sedução", que já atendeu, segundo afirma, mais de 12 mil alunas em 40 países.

Luiza Vono trabalha com produção de conteúdo desde 2015, quando largou a carreira na área das ciências atuariais - Divulgação - Divulgação
Luiza Vono trabalha com produção de conteúdo desde 2015, quando largou a carreira na área das ciências atuariais
Imagem: Divulgação

Durante as aulas do curso, Luíza ensina como parecer interessante nos perfis das redes sociais e dos aplicativos. Pela seleção das fotos e descrição do perfil, já é possível afastar 90% dos homens interessados em uma única noite de sexo, afirma. "Dos 10% que sobram, consegue-se fazer um novo filtro nas primeiras conversas", diz.

"A base das minhas aulas é o autoconhecimento. Dou ferramentas para a aluna se conhecer e se amar profundamente. Só depois disso, quando ela está segura, ensino a técnica de flerte e sedução por meio de mensagem de texto", conta. O perfil de seus clientes, diz Luiza, são mulheres com mais de 30 anos, "que têm a sensação de que o tempo está passando".

Uma coleção de relacionamentos frustrados

A psicóloga Jaroslava Varella, professora do Departamento de Psicologia Experimental da Universidade de São Paulo (USP), vê com preocupação a oferta de cursos com promessa de solução imediatista. "A ciência não funciona assim. Trabalho na área de pesquisa sobre relacionamentos e sexualidade há 20 anos. Mesmo com todo conhecimento sobre tendências populacionais, não dá para ensinar uma receita infalível de conquista", pondera.

Letícia Felisberto e Luíza Vono não têm formação específica para atuar como especialistas em relacionamento. Nas aulas, colocam em prática o que aprenderam em uma coleção de cursos livres e, como gostam de frisar, na "vida". Luiza é formada em ciências atuariais e trabalhou por 15 anos na área. Em 2015, com a explosão das plataformas de ensino a distância, viu uma oportunidade de entrar no mercado de cursos online.

"Comecei a estudar e pensar o que poderia vender na internet. Eu tinha uma coleção de relacionamentos frustrados. Aos 32 anos, isso era uma questão, porque casar era o sonho da minha vida. Então fiz da dor uma oportunidade", explica.

Decidiu, então, estudar técnicas de marketing digital e dicas de relacionamento. Juntou as melhores recomendações sobre como conquistar um homem e escrever mensagens eficientes de texto e aplicou-as na própria vida. Aparentemente, deu certo: casou-se. Em setembro de 2015, fez as primeiras experiências com aulas na rede e, em janeiro de 2017, lançou a primeira turma de um curso online sobre relacionamento para mulheres solteiras.

"Faculdade seria tempo mal investido"

Letícia Felisberto largou a faculdade de nutrição para dedicar-se a cursos livres, como um de hipnoterapia, e à produção de conteúdo na internet. Diz que seu método tem evidências na neurociência e que uma graduação não faz falta. "Seria um tempo mal investido. O que busco não existe na faculdade. Tanto é que atendo psicólogos", diz.

Letícia afirma ter compromisso com resultados. "Já atendi homens que, em três anos com psicólogo, não conseguiram resolver o que, comigo, resolveram em dois meses". Para elaborar os cursos e mentorias, usa as próprias experiências e as de outras mulheres. Coleta informações a partir de enquetes na caixa de perguntas do Instagram.