Alunos fazem fila para selfie na volta de Janaína Paschoal à USP: 'Kinga'
A ex-deputada estadual Janaína Paschoal ganhou tratamento de celebridade ao retornar à sala de aula nesta terça-feira (21), na Faculdade de Direito da USP. Ela é professora substituta da disciplina "Teoria Geral do Direito Penal I", do terceiro semestre. Dez minutos antes do início da aula, estudantes disputavam as carteiras mais bem posicionadas da sala. "Vou ficar aqui na frente. Quero ficar perto da Kinga", disse um deles, provocando risos.
Janaína entrou na sala pontualmente às 9h15. Estava lotada, com cerca de 70 alunos, alguns deles sentados no chão. Trajava um vestido preto, de regata, e sapato de salto médio da mesma cor. "Que turma cheia! Senta aqui", disse, cedendo a própria cadeira para uma estudante. Descontraída, começou a aula com uma piada.
"Turma do Carrossel', vocês estavam esperando a professora Helena e ganharam uma substituta rabugenta. Para quem não me conhece, Janaína Paschoal", brincou. Na novela "Carrossel", exibida pelo SBT até 2013, Helena era uma professora amável e adorada pelos alunos. Este também é o nome da titular da disciplina ministrada por Pascoal — Helena Lobo, que atuou como assessora jurídica da CPI da Covid.
Embora ninguém tenha rido da piada, Janaína Paschoal parecia à vontade — um desafio, pois havia o temor de que fosse hostilizada no retorno à sala de aula, após licença de quatro anos para atuar na bancada do PSL na Assembleia Legislativa de São Paulo. Candidata a deputada estadual mais votada da história do Brasil em 2018, ela alcançou menos de 5% de votos ao concorrer ao Senado pelo PRTB.
No início de fevereiro, alunos do Centro Acadêmico XI de Agosto fizeram circular um abaixo-assinado para que ela não voltasse a dar aulas na USP. Segundo os signatários, a professora abandonou os "valores democráticos" que devem permear as aulas da instituição. Em um documento de 31 páginas, acusaram a docente de espalhar informações falsas sobre a pandemia e defender tratamentos para a doença sem comprovação científica. Também exigiram o comprovante de vacinação contra a covid-19.
"Ter uma professora como a Janaína Paschoal, sem sabermos se está vacinada, sabendo que foi uma das articuladoras do impeachment de Dilma, é contra o que os alunos desejam", afirma o estudante Erick Araujo, 23, diretor do XI de Agosto.
Temas polêmicos
"A professora Helena me pediu para não entrar em polêmicas", provocou Janaína Paschoal. "Disse que é fácil: só tenho que apresentar a parte geral do Código Penal. Vou tentar."
E tentou. Ao tratar de um princípio do Direito Penal —da fragmentariedade—, usou o aborto como exemplo e, antes que alguma discussão se acirrasse, avisou: "Não vou entrar na polêmica se tem que ser legalizado ou não". "O Código Penal protege a vida intrauterina, mas não em todas as situações. Se uma mulher engravidou de um estupro, está autorizado o aborto em lei. Isso é em decorrência da fragmentariedade do direito penal", explicou.
Mas, depois, esqueceu de tentar. Disse que tem opiniões "radicais" sobre determinados assuntos. Criticou, por exemplo, a mudança do Código Penal de 2009, que abrangeu o conceito de estupro — antes, o crime só era caracterizado quando havia penetração vaginal. "Isso é péssimo para a vítima de um crime grave, colocada no mesmo bolo de outros casos; e também para o acusado, que deverá lidar com as consequências de ser tachado como estuprador", disse.
"Uma jornalista me perguntou como saber se está sendo abusada no ônibus. Se você precisa explicar para a pessoa, talvez ela não esteja se sentindo abusada", afirmou. "A vítima deve ter voz. Infantilizamos a mulher quando tutelamos demais."
Comentou o caso de assédio sexual no BBB 23. Disse ter se assustado com declarações de policiais afirmando que a investigação seguiria sem ouvir a vítima, a influencer mexicana Dania Mendez.
Criticou a criação de novos tipos penais como feminicídio e transfobia. "Não importa se a pessoa é branca, trans, hétero. Todo homicídio deve ser esclarecido", disse. "Daqui a pouco vão dizer que gordofobia é crime. E olha que fui vítima disso a vida inteira."
Por fim, deu um conselho aos alunos. "Vocês serão convidados a se alinhar aos extremos. Fujam de extremos, seja do punitivismo ou da criminologia crítica."
Fila para fotos
No intervalo, alunos fizeram fila para tirar selfies com a ex-deputada. Uma aluna comentou que, apesar de achar a advogada uma boa professora, ela não merece o tratamento de 'popstar'. "Não precisa disso tudo. Tem outros professores bons e ninguém fica dando essa moral, tirando fotos", comentou com as amigas.
Um aluno que conversou com Universa disse que a aula foi boa, interessante e didática. "Ela se preocupou em fazer a gente entender o assunto. Apesar de ter entrado em assuntos delicados, mas que fazem parte do direito penal, deixou claro que tinha uma posição radical em comparação aos demais professores ou juristas."
Já a estudante Ana Karolina Ribeiro Virgulino, 21, se sentiu desconfortável, apesar da "excelente didática", com as opiniões da professora sobre temas como aborto, violência sexual e transfobia. "Todos estavam ansiosos para saber como seria a aula dela. Percebi que o pessoal não gostou das opiniões controversas sobre alguns temas", disse.
Outra aluna afirmou que a condução da discussão de temas polêmicos foi desastrosa. "Entendo que a faculdade não possa expulsar uma professora pelo posicionamento político dela, de extrema-direita. Mas trazer esses pensamentos para a aula é uma atitude infeliz", afirmou. Segundo a universitária, alunos mantiveram-se calados porque não se sentiram à vontade para manifestar opinião contrária à da professora.
O abaixo-assinado dos alunos protocolado em fevereiro vai ser analisado pela Congregação da Faculdade, a instância deliberativa máxima do curso de Direito. A próxima reunião será no dia 31 de março.
Professora não descarta volta à política
Em entrevista a Universa logo após a aula, Janaína disse ter se surpreendido com a calmaria e os pedidos de fotos, pois estava preparada para protestos. "Se Deus me deu esse presente, só posso agradecer."
A professora afirma que vai aproveitar a experiência como deputada em sala de aula para ensinar sobre a atuação do profissional do direito no Legislativo. "Talvez até abrir uma disciplina. Pode ser um nicho de trabalho. Seja a pessoa se candidatando ou trabalhando nas assessorias", explicou.
Ela não afasta a possibilidade de voltar para a política. "Saí mais madura. Você apanha o dia inteiro, 24 horas por dia. Mas cria casca. Vários partidos perguntaram se sairia para prefeita, mas não concorreria neste momento."
Sobre a comprovação da vacinação, exigência dos estudantes que assinaram o abaixo-assinado contra ela, a ex-deputada classifica como "um dado sensível", protegido por lei. "Quem está vacinado e confia na vacina não precisa temer."
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