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Mulher vítima de laqueadura forçada será indenizada em R$ 100 mil por SP

Santa Casa de Mogi Guaçu, onde mulher foi submetida a laqueadura compulsória, diz Defensoria Pública de SP - Reprodução
Santa Casa de Mogi Guaçu, onde mulher foi submetida a laqueadura compulsória, diz Defensoria Pública de SP Imagem: Reprodução

De Universa, em São Paulo

28/04/2023 14h44Atualizada em 28/04/2023 15h42

O Estado de São Paulo foi condenado a pagar uma indenização de R$ 100 mil a uma mulher que foi submetida a uma laqueadura forçada após uma decisão da Justiça. O caso ocorreu em Mococa, interior paulista, em 2017.

O que aconteceu?

A indenização por danos morais foi concedida pelo fato de ter existido uma determinação judicial para a realização de laqueadura, o que os desembargadores da 8ª Câmara de Direito Público declararam irregular e inconstitucional.

A Procuradoria-Geral do Estado de São Paulo informou que ainda não foi intimada da decisão. A decisão foi reafirmada na 2ª instância na última quarta-feira (26), já que o Estado havia recorrido da primeira sentença.

A indenização será direcionada a quatro filhos da vítima, pois ela morreu em fevereiro de 2023, vítima de feminicídio. Outros quatro filhos biológicos da mulher foram adotados. O principal suspeito do crime está preso e aguarda julgamento.

Relembre o caso

Em maio de 2017, a 2ª Vara do Foro de Mococa determinou que a mulher fizesse uma laqueadura após o parto, o que é irregular.

À época, a mulher tinha dado à luz ao oitavo filho e estava em situação de vulnerabilidade. Ela cumpria pena por tráfico de drogas e, entre as justificativas apresentadas pelo juiz Djalma Moreira Gomes Júnior, que acatou o pedido do Ministério Público para determinar a esterilização, estava a alegação de que ela não tinha condições econômicas de manter outras crianças. A decisão obrigou a prefeitura de Mococa a realizar a laqueadura.

No processo, o Estado se defendeu apontando que a vítima tinha manifestado desejo de realizar o procedimento. A mulher teria dado seu "consentimento pleno" de diversas formas, alegaram, aos órgãos sociais que a atenderam, incluindo a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil).

A Defensoria Pública, que defendeu a vítima no processo, nega que exista alguma formalização do consentimento da mulher sobre a esterilização.

Os desembargadores criticaram duramente a opção pela determinação judicial, questionando as condições que a mulher estava ao "consentir":

"A esterilização pedida nos autos não é a de natalidade, pois não tem caráter geral e impessoal, mas considera as qualidades subjetivas da paciente de aspectos financeiros, social, educacional, e eventuais vícios, equiparando-se à castração dos anormais e criminosos, situação que não tem a permissão constitucional brasileira."

"Em suma, trata-se de inadmissível preconceito social contra os menos favorecidos, uma vez que existem alternativas jurídicas disponíveis de assistência social e de orientação de planejamento familiar".

Defensoria: caso é emblemático

Para a defensora pública Rita Gandolpho, do Núcleo Especializado de Proteção e Defesa dos Direitos das Mulheres, o caso é emblemático por cruzar como "a pobreza, a vulnerabilidade social, a situação de cárcere e o número de filhos foram fatores que justificaram o impedimento do exercício dos direitos sexuais e reprodutivos daquela mulher."

A separação de famílias negras é prática colonial que tem se atualizado com o desenvolvimento de novas formas de racismo. A esterilização forçada de mulheres negras é uma forma pela qual o racismo impede que a maternidade destas mulheres possa ser legitimamente exercida."