Guilherme Terreri sobre se afastar de parentes: 'Família é uma mentira'
Guilherme Terreri, a Rita von Hunty, participou do "Desculpa Alguma Coisa", videocast de Universa com Tati Bernardi, e falou, entre outros assuntos, a respeito de sua família.
Ele diz que, depois que a mãe morreu, perdeu contato com todo mundo. "Desgarrei. Família é uma mentira. Os laços que construí que não são sanguíneos são muito fortes", disse.
O professor disse ainda não acreditar que Rita tem influência de sua mãe. "Acho que ela tem mais algo da minha vó", comentou.
Ele contou não falar com o pai e o irmão mais velho —e que também não saberia o que conversar com ambos.
Todo mundo deveria, uma vez na vida, puxar uma alavanca do f*da-se Guilherme Terreri
'Não é para gostarem da Rita von Hunty. É para provocar'
Terreri contou a Tati sobre o início do trabalho como drag queen.
"Faço a Rita há dez anos, comecei no Carnaval. Não tinha ideia de nada", contou. "Na época, a gente estava num país em que o tecido social estava sendo rasgado, e eu tinha 20 centavos pra colaborar. Mas eu sou só mais um professorzinho e eu tenho um teto. Preciso entender minhas limitações", diz, revelando que já começou a pensar em parar. "Fico meio assim, mas pode ser só um tempo", diz.
Ele conta que a ideia inicial da montação era criar uma imagem contraditória. "Então, se a minha drag é marxista de difusão da teoria que organiza a luta anticapitalista, qual a imagem que ela vai ter que ter? Da Margaret Thatcher", explica, referindo-se à primeira-ministra britânica entre 1979 e 1990, conhecida por um posicionamento conservador.
Em momento nenhum é para gostar da Rita. Era para provocar. A Rita explora mão de obra e é de extrema esquerda Guilherme Terreri
"Como artista, a gente tem esse poder do botão do volume, e aí vou ajustando esse volume a depender de para onde vou indo", finalizou.
Terreri diz se questionou ser trans quando virou drag queen
Terreri contou a Tati que não escolhe quando se apresenta como ele próprio ou como Rita nos convites que recebe.
"É o que se impõe. Estou vindo de umas palestras, tive dois dias sem passar lâmina na pele, então começo a me montar amanhã de novo, sem parar. Foi uma folga para a pele. Tem isso de fazer maquiagem de circo, de palco, então a pele precisa desse tempo."
O professor pontuou que, mais importante do que a maquiagem é o processo de tirá-la da pele. "Não é quanto tempo leva pra se maquiar, é se demaquilar, é o que salva a pele."
Ele comentou se passou a refletir sobre sua identidade de gênero depois de criar Rita von Hunty.
Não é questão de querer [ser trans], uma mulher trans, um homem trans, eles descobrem que são Guilherme Terreri
Ele ainda citou teorias recentes que apontam que gênero é algo fluido.
"A brincadeira é que gênero é o seguinte: 'Eu estou uma mulher, se voltar daqui uma semana pode ser que não encontre mais uma mulher aqui'", pontuou.
Terreri aponta ainda que essas questões têm sido mais discutidas e bem recebidas hoje. "O jovem já vem com isso, já está mais bem resolvido. Acho que tem uma geração que está possivelmente mais avançada nisso. Mas é disputa. O fascismo avança a plenos pulmões, o deputado mais votado sobe de peruca para falar", disse, referindo-se à atitude transfóbica do deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG) no dia 8 de março.
Feminilidade se compra
Segundo ele, a imagem da drag queen causa uma dúvida nas certezas já estabelecidas sobre gêneros, pois mostra que "o feminino não é um atributo da mulher, e masculino não é um atributo do homem". "A gente vai, de tempos em tempos, inventando", disse. E comprando também
Acho que a drag apresenta essa ideia de que a feminilidade é uma coisa que você compra, literalmente, da unha ao cabelo, da prótese de silicone ao espartilho. O ideal de feminilidade está à venda Guilherme Terreri
O professor apontou ainda a semelhança entre drag queens e outras profissões que também se "montam". "Todo mundo é drag. Advogado, médico. O médico, aliás, é o exemplo que mais gosto: usa jaleco, estetoscópio."
Sobre ataques a drags e trans: 'Acham que é desistir de ser homem'
Na conversa, ele falou falou sobre a relação entre masculinidade e crimes de ódio, que levam a ataques a drag queens e à violência contra travestis, que se estendem a outros membros da comunidade LGBT.
"Por que que a gente conhece mais homens que matam travestis do que mulheres que matam travestis? Porque quando eles olham para a gente, alguns veem um desertor, um homem que desistiu de ser homem, que desertou a masculinidade e o clube de privilégios e poderes", disse.
Ele ainda criticou a visão de que homofobia vem dos enrustidos. "Quando a culpa da homofobia é do viado enrustido, o hétero abre mão dessa culpa", opinou.
'Rita é uma senhora de respeito'
Terreri diz que não consegue separar a posição política da pessoa na hora de se envolver. Questionado por Tati se beijaria um bolsonarista, contou uma história para responder à dúvida.
"Estava num lugar e fui abordado por um rapagote bonito. Trocamos uma longa ideia. Ali pelas três e pouco da manhã, bebendo, rolou de a gente se beijar, muito bom o papo. Até falei: 'Que bacana esse encontro'", relembrou.
"Daí o papo entrou em política, e ele falou assim: 'Acho que o primeiro turno está produzindo aberrações políticas'. Fiui só ouvindo, sem concordar, para ver onde ele ia chegar. Ele disse: 'No primeiro turno, não vou votar nem no Lula nem no Bolsonaro'", afirmou.
Ele conta que, ao ouvir do crush que votaria no candidato do Partido Novo, se assustou e não conseguiu disfarçar, a ponto do rapaz perceber. "Fui lavar a boca com água sanitária", contou, aos risos.
O professor contou também o que não suporta em um relacionamento: "A pessoa que quer garantir o dela. Aquela história de a farinha é pouca, meu pirão vem primeiro", disse.
Ainda que fale sobre relacionamentos abertamente, Terreri disse que, quando o assunto é sexualidade, prefere não se abrir muito. "É um dos lugares que, pra mim, é inacessível pro público. É pra resguardar alguma coisa. A sexualidade é minha", afirmou.
Ele acrescentou, contudo, entender que isso [a curiosidade sobre a sexualidade do outro] "faz parte da nossa cultura, foi ensinado".
Questionado sobre ser bissexual ou gay, disse que está curiando, expressão que se refere a espiar, observar.
Por fim, contou se já foi abordado como Rita von Hunty e brincou: "Montada não posso ser abordada, sou uma senhora de respeito".
Bowie, Prince, Madonna: quem inspirou Rita von Hunty
Terreri contou quais foram suas inspirações para criar a personagem da professora que é sucesso nas redes sociais.
"Era fissurado em Madonna, Prince, David Bowie. E eles eram todos bonecas, todos fazendo drag. Sempre que se montavam era outra pessoa, e eu ficava muito fascinado", disse.
Contou ainda que dois desses lhe chamavam mais atenção.
"Prince e Bowe explodiram mais minha cabeça porque sempre eram uma coisa diferente. Já a Madonna é mais consistente, ela fazia a mesma drag o CD inteiro", pontuou.
Guilherme Terreri fala da relação com melhor amiga, o que não atura em ficantes e diz se Rita namora
Veja a entrevista na íntegra:
O programa Desculpa Alguma Coisa vai ao ar às quartas, às 20h, no Canal UOL, no YouTube de Universa e em plataformas de áudio.
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