'Não consigo manter relação baseada em sexo casual. Me falta esse chip?'
No novo episódio do "Sexoterapia", podcast de Universa, a jornalista Bárbara dos Anjos Lima e a sexóloga Ana Canosa receberam a atriz, humorista e roteirista Nathalia Cruz. Além de conversarem sobre heteropessimismo, elas analisaram casos enviados por ouvintes.
O primeiro é uma história enviada por uma mulher que diz viver muito bem solteira, mas se incomoda por não conseguir manter uma relação contínua de sexo casual.
No outro caso, uma mulher que diz ter dedo podre se questiona se pode cobrar algo mais sério de um ficante que sempre deixou claro não querer compromisso.
Dificuldade em relações casuais
Sou solteira faz alguns anos e isso não me incomoda. Adoro morar sozinha com meus cachorros, curtir viagens com meus amigos, sou feliz no meu trabalho e na vida social. O que me incomoda é a parte de relacionamentos: usar aplicativos de pegação, ter que conhecer a pessoa, ir a dates furados, ou ter aquela conversinha fiada de bar só porque estou a fim de transar. Já sei que o cara não quer nada sério pela primeira conversa que ele puxa após o match. Mas, quando bate aqueles dias de carência afetiva ou sexual, entro nessa dança dos apps de date e sexo casual, já sabendo que não vai dar em nada. Até que queria ter um ou outro P.A (pau amigo), mas nunca consegui manter uma relação assim. Meus amigos gays resolvem isso com muita praticidade e já tentei, mas não avancei. Será que nós, mulheres, não temos esse chip?
Ana Canosa: "Sempre me pergunto o quanto isso tem de indivíduo e o quanto tem da construção de gênero. Porque se homens foram educados a dissociar sexo de afeto, privilegiar o prazer sexual, é muito mais fácil eles fazerem sexo casual do que uma mulher que foi educada a recusar, fazer um jogo".
De fato, há um forte componente social. Mas o quanto ele é mais ou menos importante na capacidade de engajar em relações sexuais, isso não dá pra dizer. Ana Canosa
A sexóloga destacou que o modo masculino de enxergar os relacionamentos acaba interferindo negativamente.
As mulheres se ressentem porque esse jeito de funcionar, no sexo pelo sexo, ainda é no modo masculino, e os apps são isso, eles funcionam nesse modo masculino de olhar pro sexo e prazer. Elas pensam, que se quiserem sexo por prazer, vão ter que entrar nesse modo, porque o feminino está lido na necessidade do compromisso. Ana Canosa
Bárbara pontuou que outro ponto a ser considerado é a possibilidade de uma das partes acabar se envolvendo dentro desse tipo de relacionamento.
Dedo podre
Minhas amigas dizem que tenho dedo podre, mas a verdade é que não gosto dos caras bonzinhos. Se já vem cheio de promessas e apego, desconfio e não me interesso. Acabo me envolvendo com os bad boys, e esses me fazem sofrer. O mais recente é um que fico desde setembro. Ficamos juntos um tempo, ele sumiu, mas não tinha o que cobrar porque ele sempre deixou claro que não queria nada sério, e eu topei porque gostei da sinceridade dele. Gosto do fato de que, quando nos vemos, o sexo é bom, o papo é leve, sem cobranças.
Em alguns ficamos juntos, outros não. No Réveillon, não fiquei com mais ninguém, me senti meio presa a ele. No Carnaval, fiquei com outros caras pra provocá-lo. De lá pra cá, ensaiei ter umas conversas mais sérias, mas sempre travava. Não consigo achar um caminho pra esse dialogo porque ele deixou claro que não queria nada sério. Quem sou eu pra cobrar algo?
Ana Canosa: "O que ela está colocando é um perfil masculino, mas será que não é ela que não quer um relacionamento? Talvez ela não goste de se relacionar ou tem medo. Pode ser essa questão, de uma pessoa que não quer ser escolhida porque tem autoestima baixa, viveu uma rejeição ou tem algum rolo familiar".
A gente aponta muito para o outro. Ela diz que não gosta dos bonzinhos. Mas você nota que ela não está olhando pra ela? Será que não sou eu que não quero compromisso? Por que eu estou escolhendo essas pessoas? Agora, por que eu não quero é outra história. Ana Canosa
Nathalia pontuou: "A diferença do bonzinho que te dá muita coisa e do bad boy é só que você não gosta dele [do bonzinho]. Será que quando ele [o bad boy] começar a te dar tudo, não desencanta? São perguntas pra pensar".
Ana Canosa trouxe uma reflexão: "É inegável que vivemos tempos em que a relação heterossexual vem acompanhada de sentimento negativo prévio, que a narrativa de mulheres fortes acaba nos afastando das ambivalências e sentimentos. Mas dúvidas, retrocessos e mudanças de opinião precisam se legitimadas".
'Mulher tem que se perdoar por continuar com parceiro que erra'
Ana Canosa brincou dizendo que já foi a mulher que se questionou por que tem que lidar com homem. "O clássico do heteropessimismo. Mas hoje em dia estou em reabilitação".
Nathalia Cruz seguiu o pensamento da sexóloga: "Fico pensando se a heteropessimista e realista não são quase a mesma categoria. Mas sigo aqui em uma vida conjugal, então não posso dizer que não tenho esperança, sou uma hétero esperançosa".
Bárbara apontou que o foco na desconfiança das mulheres e no fracasso de relacionamentos héteros está ligada "àquele clichê de falar que os homens não prestam".
Ana Canosa: "Esse tema é novo. Tem toda uma descrença não só nas relações com os homens, mas nas heterossexuais de uma forma geral. A questão é menos dos homens, é mais do masculino social, da construção do homem no mundo. Eles vão performando essas coisas".
'Colocava meu parceiro no lugar do macho opressor'
As três conversaram sobre os dilemas que as mulheres que estão numa relação também enfrentam. "O que tem acontecido é que se o parceiro comete o deslize, ela é impelida socialmente a se afastar, porque ela também já incorporou o arquétipo da mulher empoderada que não deixa passar nada. Ela se vê fazendo uma recusa, porque a cabeça dela diz que tem que fugir, mas o coração diz que tem que ficar".
Ana aponta que, para as mulheres, é preciso "fazer uma gestão e se perdoar por querer continuar com esse parceiro".
Bárbara dos Anjos: "Óbvio que tudo que a gente construiu com a luta feminista é verdade, mas até onde a gente consegue e quer ir nessas relações? Tem o macro e tem o dia a dia".
Ana ainda disse que, ao apontarem apenas os defeitos dos homens, as mulheres estão, "no fundo, falando sobre ego".
"Por que qual o contraponto do homem ser tudo isso? A mulher", reflete.
Nathalia falou sobre como isso aparece em seu relacionamento. "Nas brigas, no começo do relacionamento, eu já colocava ele nesse lugar do macho opressor. É importante olhar pra isso."
Bárbara seguiu a atriz, contando também já ter se encontrado em situações parecidas dentro do casamento.
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.